Internacional

Tratado contra terrorismo nuclear

Míssil Trident lançado do Cabo Canaveral, nos Estados Unidos, em janeiro de 1977. Foto: Domínio Público
Míssil Trident lançado do Cabo Canaveral, nos Estados Unidos, em janeiro de 1977. Foto: Domínio Público

Por Thalif Deen, da IPS –

Nações Unidas, 5/10/2015 – Os Estados Unidos se converteram no centésimo país a ratificar o Convênio Internacional para a Repressão dos Atos de Terrorismo Nuclear, que foi adotado pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2005 e entrou em vigor em 2007. O filme O Pacificador (1977), com Nicole Kidman  e George Clooney, conta a história de um terrorista iugoslavo que adquire uma bomba nuclear, perdida após um acidente de trem na Rússia, e a leva para Nova York para detoná-la do lado de fora da sede da ONU.

Diante da possibilidade de um grupo terrorista real adquirir armas nucleares, a ONU adotou o Convênio, que tem 115 Estados signatários atualmente. Com sua ratificação, no dia 30 de setembro, os Estados Unidos se somaram aos 99 Estados parte que ratificaram o tratado, incluídas as potências nucleares China, França, Grã-Bretanha, Índia e Rússia.

“Esta é uma boa notícia, como a ratificação de qualquer tratado ou convênio que limite o uso de armas nucleares por parte de um Estado possuidor de armamento nuclear”, ressaltou Janyantha Dhanapala, ex-secretário-geral da ONU para Assuntos de Desarmamento. Em conversa com a IPS, Dhanapala recordou que a Rússia iniciou o presente Convênio em 2005.

“O terrorismo nuclear é muito temido, especialmente depois dos atentados nos Estados Unidos de 11 de setembro de 2001, e é bem sabido que atores não estatais, com a Al Qaeda e agora o Estado Islâmico, buscam materiais nucleares para fazer uma arma” desse tipo, afirmou Dhanapala, que é membro do conselho diretor do Instituto Internacional de Estocolmo para a Pesquisa da Paz.

“E, no entanto, não devemos nos enganar sobre a importância dessa medida, quando tratados mais urgentes, como o Tratado de Proibição Completa dos Testes Nucleares, esperam a ratificação dos Estados Unidos e de mais sete Estados para garantir sua entrada em vigor”, destacou Dhanapala.

Jayantha Dhanapala, ex-secretário-geral da ONU para Assuntos de Desarmamento. Foto: IPS
Jayantha Dhanapala, ex-secretário-geral da ONU para Assuntos de Desarmamento. Foto: IPS

“Enquanto nove países possuem 15.850 ogivas nucleares (93% em poder de Estados Unidos e Rússia), seu emprego em uma guerra com intenção política deliberada, ou por acidente, e por Estados nacionais ou atores não estatais, continua sendo uma realidade aterradora, com espantosas consequências humanitárias e efeitos ecológicos e genéticos irreversíveis”, alertou o especialista.

O Convênio estipula quais são os crimes relacionados com a posse e o uso ilegais e intencionais de materiais ou dispositivos radioativos, e o uso ou o dano de instalações nucleares. O tratado também está concebido para promover a cooperação entre os países mediante o intercâmbio de informação e a prestação de assistência para investigações e extradições.

“O que é terrorismo nuclear?”, perguntou M. V. Ramana, físico e professor da Universidade de Princeton, nos Estados Unidos. O dicionário define terrorismo como “uso sistemático do terror, especialmente como meio de coação”, explicou. As armas nucleares causam a morte e a destruição em massa, e toda população que enfrenta essa possibilidade vive aterrorizada, acrescentou.

“Pense nas pessoas nos países do Oriente Médio às quais o presidente dos Estados Unidos diz que ‘todas as opções estão sobre a mesa’, o que implica, naturalmente, o uso de armas nucleares”, pontuou Ramana. Portanto, acrescentou, qualquer pessoa que utilize uma arma nuclear para ameaçar outra população seria terrorista. Isso inclui aqueles que as empregam apenas “como dissuasão”, ressaltou.

“Creio que o desafio para aqueles que buscam a paz é deslocar o discurso do ‘terrorismo nuclear por parte de atores não estatais’ e voltar a atenção aos Estados que possuem armas nucleares, que baseiam suas políticas na ameaça da morte e da destruição nuclear, e na urgência para que se desarmem”, enfatizou Ramana.

Rose Gottemoeller, subsecretária de Controle de Armas e Segurança Internacional dos Estados Unidos, garantiu que, com relação ao terrorismo nuclear, “estamos mais seguros agora do que estávamos há cinco anos, mas ainda há muito a se fazer. E os Estados Unidos continuarão trabalhando com seus sócios internacionais para garantir que os materiais nucleares perigosos sejam contabilizados e estejam seguros em todo o mundo”.

Gottemoeller destacou que “é necessária uma vigilância incessante e temos que garantir que os grupos terroristas que buscam adquirir esses materiais não sejam capazes de fazê-lo”. Os Estados Unidos são o maior contribuinte nacional do Fundo de Segurança Nuclear da Agência Internacional de Energia Atômica, ao qual entregou mais de US$ 70 milhões desde 2010, acrescentou. Esse dinheiro se destina a apoiar especialistas, missões e visitas técnicas aos Estados membros, à elaboração de guias e melhores práticas em matéria de segurança nuclear, e à base de dados de incidentes e tráfico, explicou Gottemoeler.

A subsecretária indicou que o Programa Contra o Contrabando Nuclear, do Departamento de Estado norte-americano, também colabora com sócios internacionais para reforçar a capacidade de investigação das redes de contrabando nuclear, garantir a segurança dos materiais em circulação ilegal e processar os criminosos envolvidos.

Gottemoeller elogiou Geórgia e Moldávia por terem detido recentemente delinquentes que tentavam vender urânio altamente enriquecido, e assegurou que houve avanços consideráveis nesse sentido. Lamentavelmente, a constante apreensão de material nuclear apto para as armas indica que os mesmos continuam disponíveis no mercado negro, reconheceu.

Algumas disposições fundamentais da Convenção são penalização do planejamento, ameaça ou realização de atos de terrorismo nuclear, e a obrigação dos Estados de punir esses delitos com a legislação nacional e fixar sanções de acordo com a gravidade dos mesmos. Além disso, existe a obrigação de os Estados fazerem todo o possível para adotar as medidas adequadas para garantir a proteção dos materiais radioativos.

O Convênio não cobre as atividades das forças armadas durante um conflito armado ou exercício militar e não aborda a “legalidade do uso ou a ameaça do emprego de armas nucleares pelos Estados”. Envolverde/IPS