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O que Private Equity e Venture Capital tem a ver com sustentabilidade

Roberto Gonzalez, especial para a Envolverde – 

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Roberto Gonzalez

Acreditamos que na volta da estabilidade econômica internacional e político institucional interna o Brasil será uma janela de oportunidades. É o que tem as melhores condições estruturantes dos BRICS, e que podemos atestar é que ainda tem muito o que se fazer neste país e com isso provavelmente teremos uma forte safra de novas aberturas de capital na Bolsa, os conhecidos IPOs, é importante refletir sobre instrumentos utilizados por algumas companhias, antes da abertura de capital: o Private Equity – investimentos em empresas emergentes -, e o Venture Capital – investimentos iniciais em companhias na fase embrionária.

De uns tempos para cá, ao ouvir os termos “capital de risco” e “sustentabilidade”, a maioria dos interlocutores imediatamente os associa a projetos que utilizam a energia considerada “correta”, como a eólica; ou ao reaproveitamento do material já existente; ou ainda a sistemas que utilizam pouca água. Como a água e muitos insumos não são infinitos e cada vez mais preciosos, a aplicação de medidas de ecoeficiência faz com que se tenha uma visão dessas empresas, como “empreendimentos sustentáveis”.

Existe no Brasil, atualmente, uma gama de empreendimentos que se encontram na New Ventures. É lógico que todos são relevantes, principalmente se desejamos que os nossos descendentes tenham um planeta para viver; mas será que um investimento de risco com o conceito da responsabilidade sustentável é apostar, no bom sentido da palavra, somente em empresas desta natureza?

As chances de o investimento ser eficiente começam no nascimento. O empreendimento já deve nascer com conceitos sustentáveis, isto é, desde o plano de negócio devem ser consideradas as questões sustentáveis socioeconômicas, pois nestas duas se encontram as questões ambientais, independentemente da atividade econômica. E isto vale tanto para o Private Equity quanto para o Venture Capital, independentemente de os investimentos desta natureza ainda não serem os desejáveis para uma economia de mercado.

Para exemplificar: imaginemos que quando a AIG Capital Partners desembolsou US$ 26 milhões por 12,5% da Gol Linhas Aéreas, em fevereiro de 2003, os analistas tivessem utilizado toda e qualquer avaliação socioeconômica, para estruturar este Private Equity. No meu entender, a utilização de critérios de sustentabilidade ampliará as margens de ganho para os investidores de Fundos de Capital de Risco.

A AbvCap – Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital – deveria aprofundar os estudos sobre o impacto da questão da Sustentabilidade das empresas investidas ou ainda a estruturação de mecanismos que possibilitem a implantação de conceitos sustentáveis nas empresas, principalmente no caso do Venture Capital. O objetivo não é ser ”bonzinho” para com a sociedade, isto pode ser consequência. A intenção, na verdade, é pura e genuinamente capitalista, ou seja, oferecer o maior retorno para os investidores no momento da retirada do empreendimento. Até por que no cenário do retorno a estabilidade econômica a prática sustentável amplia sua relevância, visto que o próprio capitalismo enfrenta um processo de reciclagem, comum em momento de crises extremas e desta vez provavelmente a prática permanente da sustentabilidade se tornará uma realidade de sobrevivência no mercado.

Legislações

As questões socioeconomicamente responsáveis que levam a um empreendimento sustentável em todos os sentidos deveriam fazer parte das legislações para o empreendedor e o capital de risco, como a instrução CVM 209 e suas atualizações, que poderia apresentar conceitos de sustentabilidade para constituição e funcionamento dos fundos mútuos de investimento em Empresas Emergentes; ou ainda a Lei no 9841/99 complementada pelas leis 123/2006 e 139/2011, que dispõe de tratamento jurídico diferenciado e favorecido para microempresas e empresas de pequeno porte, o que poderia indicar contrapartidas de práticas sustentáveis, como governança corporativa mais ampliada, e assim por diante.

Filosoficamente, pode-se pensar: OK, é tudo muito bonito, mas como afinal deve proceder uma empresa sustentável que receberá os aportes para que um investidor de capital de risco possa ter rentabilidade superior? O que vem sendo aplicado, com bom êxito, em companhias abertas pode ser utilizado nos Fundos de Private Equity e Venture Capital, como a própria Governança Corporativa.

E isto independe de ser, por exemplo, uma editora de controle familiar ou uma empresa de transporte aéreo. Todos os princípios podem ser colocados em prática e isto é, atuar com sustentabilidade. Vamos a alguns exemplos; independe o tamanho para a empresa praticar um tratamento de respeito aos seres humanos que nela trabalham. E já que a empresa respeita os seus profissionais, a prática do respeito à comunidade do entorno ou da região é consequência. E o mesmo se aplica ao meio ambiente, independentemente a atividade-fim do empreendimento, afinal todos vivem em um ambiente do qual o meio faz parte e a interação é inerente.

A empresa pode organizar, desde o início das operações, as informações relacionadas com a região onde tudo começou e desenvolver uma interface entre a evolução dos negócios com os lugares em que se instalou. Essa ação mostra um respeito pela cultura, o ambiente e as pessoas que direta ou indiretamente se relacionaram com o empreendimento. No momento de um IPO ou até a venda para um investidor estratégico, a empresa estará madura tanto economicamente como socialmente, ou seja sustentavelmente.

Amadurecimento

Muitos podem pensar que esta questão pode ser deixada em uma geladeira e ser retirada dali somente depois que sair do investimento, afinal sustentabilidade não é uma condição que pode se implantada e desenvolvida do dia para noite ou ao estalar de dedos. Realmente é provável que para a empresa atingi-la demore mais do que meramente um amadurecimento financeiro, mas neste caso é bom lembrar que o ganho irá para um outro investidor, ora então por que não planejar o investimento de capital de risco levando em consideração a sustentabilidade e assim correr menos risco de perder este rendimento.

Existe uma máxima no capital de risco que dá conta de dizer que “de cada dez empreendimentos um dá resultado e, além de pagar todo o investimento, dá ótimo retorno”. Ouso dizer que esta se altera com a utilização dos conceitos de sustentabilidade para algo como “de cada dez empreendimentos, cinco ou seis ou sete… dão resultados muito além do esperado”.

E por que isto não é forte no Brasil? Talvez por existirem confusões conceituais, em que o investimento em negócios sustentáveis seja apenas de empresas com projetos e resultados ecoeficientes e não que negócio sustentável é um conceito que pode ser utilizado para todo e qualquer empreendimento. Também pode ser pois o primeiro, ou talvez um dos primeiros fundos desta natureza, administrado pela A2R, utilizou o primeiro conceito de negócio sustentável e malogrou.

É certo que temos de tirar muitas lições desta experiência, mas também não podemos jogar a cesta de maçãs fora somente por que uma delas não está boa. O certo é verificar por que essa fruta apodreceu e se desfazer dela e não da cesta.

Para terminar, faço novamente um chamado para que a AbvCap desenvolva com, a Finep – Financiadora de Estudos e Projetos-, BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social-, o GVces – Centro de Estudos em Sustentabilidade da FGV-, a GRI – Global Reporting Initiative, o IIRC – International Integrated Reporting Council- o PRI – Principles for Responsible Investment- e outras entidades que trabalham esta temática, como também com as congêneres estrangeiras como a APCRI (Associação Portuguesa de Capital de Risco e de Desenvolvimento) e também entidades na África, o continente do futuro, como por exemplo o próprio Governo de Moçambique, que estrutura uma política de investimento de capital de risco com critérios de sustentabilidade. E também: investidores de Capital de Risco, por favor, incorporem em suas análises de longo prazo a sustentabilidade. É inevitável e livre de arrependimentos. (#Envolverde)

(*) ROBERTO GONZALEZ é diretor da Bússola Governança – Treinamento & Consultoria, membro do Conselho do Fundo Ethical do Santander Asset Management, professor de Governança Corporativa e Sustentabilidade em cursos de pós-graduação em instituições como Fecap, Fipecafi, SENAC. Autor do livro Governança Corporativa – O poder de transformação das empresas ([email protected])