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Imigrantes no centro da campanha eleitoral

Cartazes de campanha rasgados em Paris. Foto: A. D. McKenzie/IPS.

Paris, França, 20/4/2012 – Candidatos à Presidência da França colocaram os estrangeiros ilegais, para sua desgraça, em um lugar de destaque em seus discursos. “Joguem sobre os imigrantes e tudo estará bem. Essa é a mensagem atraente e decepcionante de alguns deles”, afirmou a professora de ciências políticas Nonna Mayer. Dez candidatos disputarão o primeiro turno este mês. Mas quais são os imigrantes que têm um lugar central na campanha para as eleições do próximo dia 22 e, se houver segundo turno, do dia 6 de maio?

Para alguns franceses são “qualquer um que seja considerado diferente”, explicou Mayer, especializada em racismo e antissemitismo. As pessoas consideradas “estrangeiras” estão hierarquizadas na França. As mais rejeitadas são as de origem no Magreb, e as menos são as judias, disse à IPS. As pessoas originarias da África subsaariana costumam ser vistas de maneira favorável, enquanto as da Ásia “estão entre os judeus e os africanos subsaarianos”, acrescentou Mayer com ironia.

A legislação francesa proíbe a classificação étnica da população, mas vários estudos indicam que os residentes de origem estrangeira superam os 10% dos 63 milhões de habitantes deste país. Um em cada três procedem da União Europeia, mas os políticos não mostram isso.

Em uma conferência universitária sobre “Eleições francesas: desigualdade e giro populista”, Mayer e outros cientistas sociais disseram que o termo “imigrante” se tornou sinônimo de muçulmano. A retórica contra os estrangeiros, especialmente da ultradireitista Frente Nacional, é, de fato, uma rejeição do Islã na França, afirmaram.

A líder da Frente Nacional, Marine Le Pen, colocou no centro de sua campanha o ritual de matar animais, com o praticado para produzir carne pelo método halal, e tentou causar impacto no eleitorado dizendo que milhões de franceses a comiam sem saber. também criticou os muçulmanos que rezam na rua, e rotulou essa prática de “invasão”. Em setembro de 2011 foi proibido rezar na rua, embora muitos dos cinco milhões de muçulmanos residentes na França não tenham onde fazê-lo. A medida seguiu a proibição da burca e de outros acessórios que cobrem o rosto.

Le Pen se esforça para fazer distinção entre muçulmanos franceses que “amam a França” e os radicais e fundamentalistas islâmicos, mas muitos analistas afirmam que seus partidários não compreendem a diferença. A líder da Frente Nacional está em terceiro lugar nas pesquisas de intenção de voto, junto com o candidato da Frente de Esquerda, Jean-Luc Mélenchon. Ambos têm poucas chances de chegar à Presidência.

Entretanto, o discurso de Le Pen foi retomado pelo presidente Nicolas Sarkozy, candidato à reeleição pela União para um Movimento Popular (UMP), que nas pesquisas de opinião está à frente junto com o socialista François Hollande. “Sarkozy também colocou a imigração no centro de sua campanha para obter votos da extrema direita. Costumava ser equilibrado sobre este assunto e o Islã. Mas já não é”, disse Mayer.

Sarkozy mostrou a mudança em um discurso que fez em Grenoble em julho de 2010, após os distúrbios ocorridos nessa cidade do sudeste da França. Afirmou que o governo revogaria a cidadania francesa aos imigrantes que colocassem em perigo oficiais da polícia ou outras autoridades públicas. O discurso seguiu à ordem de expulsar os roma (ciganos) sem documentos da França, o que valeu a este país uma reprimenda da União Europeia.

Desde entoa, algumas das expressões mais duras de Sarkozy parece se esforçar para superar Le Pen. Em março afirmou que a França é um país com “muitos estrangeiros’ e disse que se for reeleito restringirá a imigração. Dirigentes de outros partidos políticos rechaçaram o tema da imigração. Jean-Luc Mélenchon rotulou Le Pen de “semi-demente” e “hipócrita” e afirmou que seu partido “é racista”.

Por seu lado, Hollande manteve um to mais neutro, e afirmou que o dever da França é integrar os imigrantes. Nos últimos meses se reuniu com diferentes organizações religiosas para explicar sua posição e obter seu apoio. Optou por se concentrar nas pessoas mais ricas e prometeu aumentar o imposto para elas.

Segundo o analista Alan Riding, Hollande não apela para o medo da população, “mas tampouco gera esperança”. No entanto, muitas das pessoas de origem estrangeira ouvidas nas pesquisas disseram que votariam no Partido Socialista. Uma contadora de 30 anos de origem africana, que chegou a Paris com seus pais quanto tinha 13, disse à IPS que ela e seus amigos votarão em Hollande e em mais ninguém. “Não se pode votar em alguém que te faz sentir sobrando”, afirmou.

A organizações religiosas também se fizeram ouvir. Claude Baty, presidente da Federação Protestante da França, afirmou que quando o “medo do outro incide no comportamento” se torna um assunto urgente, e é preciso adotar medidas para ver as pessoas reais e não os estereótipos. Representando cerca de 800 mil protestantes franceses, que historicamente são discriminados, Baty disse estar decepcionado com a campanha eleitoral porque os políticos agem como “crianças no recreio”.

Baty, entre muitos outros, afirmou que o foco posto sobre a imigração é uma forma de distrair a atenção dos eleitores de outros assuntos mais importantes como a economia e os problemas da educação. Mayer disse esperar que a tolerância regresse depois das eleições, porque a França tem tradição de receber quem solicita asilo.

Um estudo do Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) indica que a França recebeu 51.910 pedidos de asilo em 2011, 8% mais do que no ano anterior. Está em segundo lugar, atrás dos Estados Unidos, nessa área. A maioria chegou do Afeganistão, onde soldados franceses participam das operações militares. É a terceira vez seguida que aumentam as solicitações de asilo, segundo o Acnur.

Isso alimentou a sensação de certos setores da população sobre a “excessiva” chegada de estrangeiros à França, disse Mayer. Mas, acrescentou que partidos como a UMP de Sarkozy se meteram em “um jogo perigoso” ao fazerem eco à extrema direita e mirar nos imigrantes. “Essas políticas legitimam estes partidos de extrema direita. A história nos mostra os perigos que isso encerra”, afirmou à IPS. Envolverde/IPS