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Duelo de gigantes no campo petrolífero

Rio de Janeiro, Brasil, 22/5/2012 – Diante da voraz demanda interna por energia, a China adicionou o Brasil entre seus principais sócios petroleiros, provocando uma expansão vertiginosa de suas empresas neste país, o que é visto por uns como fator de dinamismo e por outros como um risco para o autoabastecimento futuro.

A China foi a grande investidora petrolífera dos últimos três ano no Brasil através das companhias China Petrochemical Corporation (Sinopec) e Sinochem Corporation (Sinochem), disse à IPS o especialista Adriano Pires. Nesse período, Pequim investiu US$ 15 bilhões, especialmente na compra de ativos de empresas que já operam no Brasil em áreas de exploração e produção de petróleo no subsolo marinho, onde está a maior parte das reservas do país.

“É uma estratégia da China para contar com reservas que garantam seu abastecimento”, explicou Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE). O mesmo está fazendo em outros países latino-americanos, como Argentina e Venezuela, e em outras regiões, como a África, acrescentou. A Agência Brasileira de Promoção de Exportações informou que a China tem a intenção de aumentar em 60% suas reservas estratégicas de petróleo não importando o lugar do mundo em que se estejam.

No Brasil, a aposta nessa área começou em 2010 com a compra pela Sinochem de 40% das ações da empresa norueguesa Statoil no campo oceânico Peregrino, em Santos, segundo o CBIE. A operação ficou em US$ 3,1 bilhões. No mesmo ano, a Sinpoec investiu US$ 7,1 bilhões para obter 40% da filial brasileira do consórcio transnacional de origem espanhola Repsol.

Em março passado, a China adquiriu por US$ 4,8 bilhões 30% do capital acionário da Petrogal Brasil, o capítulo brasileiro dessa empresa portuguesa, responsável pelas atividades de exploração e produção de petróleo da Galp Energia. Capitais chineses associaram-se também à Petrobras, nos Estados do Pará e Maranhão, e ao consórcio anglo-francês Perezco, na bacia de Estado do Espírito Santo.

Pires acrescentou que as companhias chinesas também têm interesse em comprar ações da OGX, companhia petroleira do milionário Eike Batista, que já tem negócios importantes com elas em mineração e siderurgia.

“O Brasil é uma fonte desse recurso estratégico para que a China tenha um crescimento sustentável, mas o mercado brasileiro também nos interessa muito”, resumiu em declarações à imprensa local o diretor da Câmara Brasil-China de Desenvolvimento Econômico, Tang Wei.

Um interesse, que segundo Pires, tem a ver com a necessidade cada vez maior da China de cobrir o aumento de seu consumo de combustível, entre outros motivos para abastecer os automóveis de sua crescente classe média. Também recordou que a China, com 13 milhões de barris diários, é o segundo consumidor mundial de petróleo, depois dos Estados Unidos, que utiliza entre 18 e 10 milhões de barris por dia. Calcula-se que em poucos anos essa relação se inverterá.

Paralelamente aos seus negócios no Brasil, também cresceram as suas compras de petróleo. Dados do CBIE indicam que a China é o segundo maior importador de petróleo brasileiro, depois dos Estados Unidos, mas a tendência faz prever também aqui uma troca de posições. A Secretária de Comércio Exterior do Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio informa que as exportações de petróleo para a China cresceram de 1,6 milhão de barris em 2001 para 50,6 milhões no ano passado.

Entretanto, a China vai além, e suas expectativas estão voltadas para as recentes descobertas de petróleo na camada pré-sal no oceano Atlântico, a mais de sete mil quilômetros de profundidade, perto da costa brasileira. Os 55 bilhões de barris que se calcula existirem nessa área colocariam o Brasil no seleto grupo de grandes exportadores de petróleo. “A China não tem experiência em operar plataformas marítimas, por isso deixaria a tarefa nas mãos da Petrobras ou da Repsol”, com maior conhecimento nesse tipo de extração, afirmou Pires.

A estratégia de Pequim ficou evidente em 2009, quando o China Development Bank acordou com o governo do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva um empréstimo de US$ 10 bilhões para a Petrobras, em troca de garantir exportações de petróleo para a Sinopec, inicialmente de 150 mil barris diários e depois passando para 200 mil barris/dia. Os empresários brasileiros veem o protagonismo chinês como positivo, porque movimenta o mercado.

A China também associou-se a empresas brasileiras nos setores de refino de combustível e distribuição e produção de equipamentos para exploração e extração de petróleo. “Não há risco. Ao Brasil interessa porque traz dinheiro. É um bom negócio”, disse Pires. Por outro lado, o presidente da Associação de Engenheiros da Petrobras (Aepet), Silvio Sinedino, teme que a insaciável necessidade chinesa por hidrocarbonos leve a um esgotamento mais rápido desse recurso fóssil e, portanto, finito.

A Aepet, que defende o regresso ao perdido monopólio da Petrobras, hoje aberta ao capital externo, considera que o Brasil não deve ser um exportador de petróleo, devendo primeiramente garantir seu autoabastecimento, e que a exportação “deve ser marginal”. Segundo Sinedino, “países como China e Estados Unidos têm muita necessidade de petróleo. Com uma demanda crescente como essa, nossas reservas do pré-sal se esgotariam em 15 ou 20 anos, quando poderiam durar, pelo menos, 30”.

“Não podemos nos transformar em um Oriente Médio exportador de hidrocarbonos”. Temos que usar o que precisamos e vender dentro do possível, defendendo nosso patrimônio nacional”, acrescentou Sinedino, ao recordar as campanhas que deram origem à Petrobras há mais de meio século com o lema “O petróleo é nosso”. O petróleo “não é uma mercadoria qualquer. Tem um valor geopolítico muito importante”, ressaltou. Nesse sentido, afirmou que a Aepet vê “com simpatia” a expropriação pelo governo argentino de ações da Repsol para assumir o controle da YPF.

O interesse da China no Brasil se manifesta ainda em outros setores-chaves para garantir sua voracidade por matérias-primas, como soja e minério de ferro. Atualmente, esse país é o primeiro sócio comercial do Brasil. Envolverde/IPS