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Ajuda humanitária: é preciso mais esforço

Genebra, Suíça, 9/3/2012 – O número de pessoas em todo o mundo que necessita de assistência humanitária direta está aumentando, mas a tarefa dos doadores internacionais não parece ser efetiva. Um informe publicado pela Fundação Dara Internacional sobre a efetividade da ajuda destaca alguns dos obstáculos que esta enfrenta para poder chegar aos destinatários, como a insuficiente consideração das necessidades das mulheres, a politização dos programas e a falta de projeção no longo prazo.

“Se os doadores querem garantir que o dinheiro chegue às pessoas, devem analisar as diferentes necessidades dos homens e das mulheres”, disse à IPS o coordenador do Índice de Resposta Humanitária 2011 da Dara, Philip Tamminga. Por exemplo, depois das inundações de 2010 no Paquistão, as agências humanitárias distribuíram kits de higiene inadequados para as mulheres e não levaram em consideração as normas culturais locais. Além disso, grande parte da violência de gênero registrada nas barracas instaladas em Porto Príncipe depois do terremoto que atingiu o Haiti em 12 de janeiro de 2010, poderia ter sido evitada se fosse considerada a segurança das mulheres na hora de construir as instalações de higiene e de saneamento.

Tamminga acredita que grande parte da ineficiência está diretamente vinculada com a falta de preparo para enfrentar desastres naturais e conflitos armados. “Em anos anteriores, quatro furacões atingiram o Haiti. Se os doadores tivessem na época se concentrado na prevenção, as autoridades haitianas teriam respondido melhor ao terremoto de 2010, e os doadores teriam aplicado as lições aprendidas ali nos posteriores terremotos de Paquistão, Irã e Turquia”, opinou. “Os doadores devem garantir que a fase de recuperação considere soluções de longo prazo”, acrescentou.

Na maioria dos grandes desastres, os doadores e as organizações humanitárias trabalham juntos para dar abrigo de emergência, como transição para uma moradia permanente. Contudo, no Haiti não houve nenhuma estratégia de moradia de longo prazo depois do terremoto. Assim, quando o último furacão chegou, dezenas de pessoas ainda estavam em abrigos temporários extremamente vulneráveis ao vento.

Outro exemplo de graves consequências da insuficiente preparação é a atual crise alimentar no Chifre da África. Embora toda a comunidade internacional soubesse que uma severa fome se aproximava na região, os governos doadores não aumentaram seu financiamento, o que derivou em uma tragédia de mais de cem mil mortes que poderiam ter sido evitadas. “Não há evidência de que os governos doadores estejam mudando sua atitude na transição da ajuda de emergência e na preparação de redução de riscos. A emergência e o desenvolvimento no longo prazo ainda são considerados programas separados”, explicou Tamminga.

E a situação se agrava com uma crescente politização da ajuda. “Quando os doadores ou os governos começam a aplicar considerações políticas sobre que, como e quando é distribuída a ajuda, a situação fica muito precária. Vimos isto em casos como Palestina, Somália, Sudão ou Colômbia”, afirmou o coordenador do Índice. O exemplo mais recente é a Síria, onde o regime não reconhece a crise humanitária em seu território e se nega a agir de acordo com as Convenções de Genebra, que claramente estabelecem que as populações sitiadas em qualquer parte de um conflito têm direito à ajuda humanitária.

“Nos preocupa quando os governos doadores começam a impor sua agenda e dizem às organizações humanitárias onde pode trabalhar”, afirmou Tamminga. “Na Somália há sérias restrições. O grupo islâmico Al Shabaab tem uma grave responsabilidade por isso”, acrescentou, lembrando que países como Estados Unidos, Canadá e alguns da Europa, atados a legislações antiterroristas, também têm sua cota de responsabilidade. “Proíbem as organizações humanitárias de trabalhar ou ter contato com os qualificados como terroristas. No entanto, os grupos humanitários são neutros, imparciais e independentes, e seu trabalho deve ser permitido em todas as partes”, esclareceu Tamminga.

Em 2011, foi entregue apenas 62% do pedido de ajuda da Organização das Nações Unidas (ONU) no valor de US$ 8,9 bilhões para assistir 50 milhões de pessoas em crise, o que causou profundas brechas na resposta humanitária. O Índice estudou 19 dos maiores doadores e qualificou Noruega, Dinamarca, Suécia, Irlanda e Holanda como os “melhores”. Os Estados Unidos ficaram em 17º lugar e a Itália em último. Enquanto os doadores tradicionais ainda aportavam 85% da ajuda global, 40% dos fundos canalizados a tarefas de resgate no Haiti tinham com procedência fontes privadas e novos governos doadores, como Brasil, Cuba e Venezuela.

“Queremos estimular boas práticas com estes novos doadores”, contou Tamminga à IPS. Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Catar e Iêmen, por exemplo, “se tornam mais conscientes dos padrões internacionais”. O coordenador do Índice destacou a importância de novos e velhos atores trabalharem juntos e aprendendo mutuamente sobre as normas culturais e as necessidades de populações específicas.

O setor privado também tem muito a oferecer em termos de inovação, respostas rápidas e uso da infraestrutura e das redes existentes. No Haiti, por exemplo, os telefones celulares foram uma ferramenta útil para divulgar mensagens sobre prevenção do cólera quando surgiu um foco após o terremoto. “Se o setor privado entende os princípios humanitários e as boas práticas, como os padrões para a doação de medicamentos, que proíbem enviar remédios com prazo de validade perto de expirar, então pode contribuir para usar a ajuda de forma apropriada e efetiva”, ressaltou Tamminga. Envolverde/IPS