As eleições na Espanha, desde os Estados Unidos

Miami, junho/2011 – O desastre do Partido Socialista nas eleições autônomas e municipais na Espanha ocupou apenas uma limitada parte da atenção da mídia dos Estados Unidos. Deverá passar um tempo prudente para que algum centro de reflexão e especialistas acadêmicos dedique seus esforços a explicar o ocorrido. Dependendo muito de como evoluir a economia, a evidência mostrará que o resultado é mais uma derrota do Partido Socialista (PSOE) do que uma vitória plena do Partido Popular (PP).

No momento, convém destacar algumas dimensões no contexto dos Estados Unidos. Primeiro, o que na Espanha foi uma mudança dramática não mudará radicalmente a percepção norte-americana do país, por duas razões. Uma é a moderada importância dada à Espanha nos Estados Unidos, a não ser que as circunstâncias midiáticas tornem obrigatório olhar com lupa para Madri. A outra é que os Estados Unidos e seus dirigentes estão extremamente ocupados por outros cenários que tocam mais sensivelmente a segurança e os interesses nacionais.

A crise do Oriente Médio e Norte da África, o novo capítulo da liquidação de Bin Laden, os problemas econômicos internos e a pressão da imigração são alguns dos temas. A viagem de Obama a Irlanda, Londres, Paris e Polônia reforça os pontos de interesse para os Estados Unidos. A Espanha não será um deles, e menos as eleições. A única maneira de Washington perder o sonho pelas ações do governo espanhol (do atual e do próximo) será colidirem com os interesses vitais dos Estados Unidos, como pareceu ter ocorrido com a chegada do PSOE ao poder em 2004 e com o desaparecimento de José María Aznar, o fiel aliado de Bush. O praticamente cheque em branco que Zapatero deu a Obama será potencializado pelo seguro apoio que Mariano Rajoy lhe dará ao entrar em La Moncloa em 2012 (ou antes), mesmo ano da mais que provável reeleição do presidente norte-americano.

Para a perspectiva norte-americana, a derrota do PSOE é vista como ajustada à evolução da crise europeia e ao impacto nos partidos de esquerda. A estes se atribui a culpa de todo descalabro financeiro. Certeiramente, são apontados pela carência de mecanismos de reação para defender precisamente as conquistas sociais que foram sua marca desde o fim da Segunda Guerra Mundial. O estado de bem-estar, marca da social-democracia, está sofrendo erosão. Os setores mais fracos agora pagam o custo da privatização, das bolhas imobiliárias e da corrupção. A fuga de votos da esquerda para o PP é vista como a vingança de uma parte dos “indignados”, dos quais não se entende seu protesto não partidário.

Quem nos Estados Unidos se beneficia ou se alegra com o resultado das eleições espanholas? Em primeiro lugar, o núcleo duro do Partido Republicano, que sempre viu o PSOE como contrário aos seus interesses, políticos e econômicos. Embora em alguns países seletivos da Europa (Alemanha) os social-democratas sejam vistos como aliados necessários, na maioria dos casos são considerados herdeiros do socialismo tradicional. Naturalmente, os continuadores da ideologia de George W. Bush se sentem agora vincados no que consideraram falta de lealdade em 2004 com a retirada da Espanha do Iraque.

Outros setores, que reclamam como sua a vitória do PP, incluem diversos ramos de ação coagulados no Tea Party. Convém esclarecer que somente têm em comum com os acampados da Puerta del Sol e da Plaza de Cataluña a desconfiança diante do sistema. Na realidade, esses coletivos norte-americanos sentem nostalgia por um país mitificado, que lhes escapa das mãos.

Finalmente, uma dimensão que foge à compreensão dos observadores norte-americanos, pouco acostumados com o complexo sistema partidário espanhol, é o contraste entre os resultados no País Basco e na Catalunha, no que diz respeito ao nacionalismo e ao independentismo. Enquanto os bascos independentistas de Bildu conquistaram notáveis cadeiras e municipalidades, os independentistas catalães de Esquerra foram sitiados pelos nacionalistas moderados e conservadores da Convergència i Unió, que acrescentaram à Prefeitura de Barcelona o controle do governo autônomo. Os mesmos setores que se sentem insatisfeitos pelo desastre do PSOE agora respiram aliviados pelo resultado catalão. Envolverde/IPS

* Joaquín Roy é catedrático Jean Monnet e diretor do Centro da União Europeia da Universidade de Miami ([email protected]).