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Uma centelha de esperança para as degradadas florestas do Haiti

Árvores de Cassia siameia (usada para se obter carvão) plantadas no Haiti. Foto: Desmond Brown/IPS
Árvores de Cassia siameia (usada para se obter carvão) plantadas no Haiti. Foto: Desmond Brown/IPS

 

Varsóvia, Polônia, 25/3/2014 – Os pequenos agricultores podem ter um papel importante em fazer com que o Haiti volte a ser verde, quando apenas 2% das árvores do país continuam em pé. Com dez milhões de habitantes e produto interno bruto de US$ 7,8 bilhões, o Haiti, país mais pobre da América, ficou ferido pela degradação ambiental por vários anos. Entretanto, há uma centelha de esperança para este país e para seu vizinho, a República Dominicana, com a qual divide a ilha antilhana de La Espanhola.

A organização World Vision Australia completou uma missão exploratória aos dois países para examinar o potencial para a regeneração natural de florestas, inspirada pelo êxito de seu projeto florestal em Humbo, um distrito da Etiópia, no contexto do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) do Protocolo de Kyoto. O plano é consegui-lo mediante a iniciativa “Regeneração Natural Administrada por Agricultores” (FMNR).

“As vidas saudáveis para as crianças e suas famílias devem estar apoiadas por um ambiente igualmente saudável”, disse à IPS o gerente da unidade empresarial, de segurança alimentar e mudança climática da World Vision, Timothy Morris. Por isso, “cada vez mais vemos como podemos ajudar as comunidades a construírem ambientes sustentáveis, e particularmente em vista da mudança climática está se tornando cada vez mais importante”, acrescentou.

O MDL permite que esses projetos de reflorestamento obtenham créditos de carbono, ou reduções certificadas de emissões contaminantes, para cada tonelada de dióxido de carbono “sequestrado” ou absorvido pela floresta. No caso do projeto Humbo, continua-se gerando ganhos para as comunidades que manejam os bens florestais por meio de sete cooperativas, que representam quase 50 mil pessoas.

“Entendemos que o Haiti é uma área profundamente degradada pelo desmatamento, por uma elevada população e pela necessidade de combustíveis”, disse Morris. As devastadoras inundações e os deslizamentos de terra também desnudaram muitas áreas que antes estavam cobertas por florestas, destacou.

O encarregado de reflorestamento na World Vision, Tony Rinaudo, visitou o Haiti e a República Dominicana para examinar a paisagem degradada da área. “Já há uma base firme sobre a qual construir em algumas áreas onde foram implantados projetos atuais e passados de reflorestamento e agroreflorestamento”, afirmou à IPS. “Conheci pessoas que valorizam as árvores e cuidam com sucesso delas, para obter frutas, madeira ou carvão”, acrescentou.

Segundo Rinaudo, o FMNR não é um conceito novo, pois ele viu casos desse tipo “em algumas fronteiras de propriedades agrícolas, em alguns casos dentro das terras cultivadas”. Mas disse que esta compreensão pode ser criada, para melhorar as técnicas e intensificar as atividades, e gerar maior consciência a respeito. “O FMNR tem um enorme potencial, por exemplo, com a espécie Prosopis, que é muito agressiva e espinhosa. Com um manejo sistemático se poderia estabelecer uma indústria sustentável de carvão, madeira, mel, forragem”, detalhou à IPS.

Indi McLymont-Lafayette, coordenadora regional da Panos Caribe, que trabalha para dar voz às comunidades pobres e marginalizadas, disse à IPS que algumas organizações da sociedade civil no Haiti já participavam ativamente nesse assunto. “Nos últimos dois anos e meio trabalhamos na implantação de um projeto para reabilitação posterior ao terremoto”, que devastou o país no dia 12 de janeiro de 2010, afirmou. “Incluímos temas de mudança climática e biodiversidade com a elaboração de políticas”, acrescentou.

Em parte, “isso significa trabalhar com áreas que têm iniciativas de reflorestamento, e uma das organizações no Haiti, a Fondation Seguin, é muito crucial para a elaboração, porque já realiza um tremendo trabalho em matéria de reflorestamento, por isso penso que a World Vision pode agregar valor ao que já se faz”, afirmou McLymont-Lafayette.

A World Vision teve grande resultado com um projeto florestal administrado pelas comunidades em Humbo, no sudeste etíope. Estima-se que mais de 880 mil toneladas de dióxido de carbono equivalente serão eliminados da atmosfera ao longo de 30 anos, contribuindo de modo significativo com a mitigação da mudança climática. Antes do projeto, o terreno montanhoso de Humbo estava altamente degradado e sofria uma propensão crônica para secas. A pobreza, a fome e a crescente demanda por terras agrícolas haviam levado as comunidades locais a explorarem em excesso os recursos florestais.

Haiti e República Dominicana, dois países açoitados por furacões, estão entre os mais prejudicados pela mudança climática. Segundo um estudo do Banco Mundial divulgado em novembro do ano passado, se o nível do mar continuar subindo no ritmo atual, em 2050 Santo Domingo, capital da República Dominicana, será uma das cinco cidades mais afetadas no mundo pela mudança climática.

Um informe apresentado na 19ª Conferência das Partes (COP 19) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática, realizada em novembro de 2013, em Varsóvia, mostrou que em 2012 o Haiti liderou a lista dos três países mais afetados por catástrofes relacionadas com a meteorologia. Uma população urbana em crescimento contínuo e a maior demanda por carvão e lenha contribuíram para esgotar o ambiente do Haiti. Entretanto, Morris disse que as duas nações caribenhas colherão muitos benefícios a partir de um projeto de regeneração florestal.

“Quando fazemos este tipo de tarefa ela nos dá múltiplos benefícios, particularmente no entorno costeiro e nos entornos expostos à atividade de tempestades”, acrescentou Morris. Segundo ele, “ao regenerar e plantar árvores gostaríamos de potencializar a integridade do solo, impedir a erosão, criar integridade das terras costeiras para que sejam resilientes a ondas altas e inundações costeiras, e restabelecer a base de bens naturais da área para um uso mais sustentável no longo prazo”.

Morris também afirmou que pode haver benefícios derivados de uma maior produção alimentar. “Frequentemente vemos que ao incursionar nesta técnica, particularmente em torno de áreas de captação de água e encostas empinadas, pode-se melhorar a integridade do solo” para fins agrícolas, ressaltou. Envolverde/IPS