TERRAMÉRICA - O filão do baixo carbono

Aproximadamente 80% das florestas da Guiana permanecem intactas. Foto: Desmond Brow/IPS

O modelo da Guiana de criar uma economia baixa em carbono já apresenta resultados positivos.

Roseau, Dominica, 7 de janeiro de 2013 (Terramérica).- Imagine a Guiana sem florestas nem rios, ou Antiga, Barbados e Santa Lúcia sem praias. Atherton Martin, um conservacionista que foi ministro da Agricultura da ilha de Dominica, diz que a mudança climática deveria obrigar os países caribenhos a reverem seriamente a maneira como manejam seus recursos naturais, do contrário desaparecerão. “Os princípios da mudança climática nos dizem, em essência, que, quando nossos sistemas de recursos naturais enfraquecerem ou forem destruídos pelo aquecimento global, nossa economia se destruirá”, disse ao Terramérica.

No entanto, nem tudo é negativo. Martin acredita que a mudança climática tem potencial para beneficiar as nações caribenhas em dois aspectos. Em primeiro lugar, obrigando a mudar a mentalidade de reação diante dos fatos por outra de atuar e levar a transformações. Em segundo, permitindo que os governos construam economias mais sólidas mediante o acesso a milhões de dólares em financiamento climático. Por exemplo, a decisão da Guiana de se converter em uma economia baixa em dióxido de carbono (CO2) já atraiu mais de US$ 70 milhões em créditos desse gás-estufa para proteger 10% de seus sistemas florestais.

“Eles esperam atrair mais de US$ 250 milhões durante este ano. E este é apenas um acordo de créditos de carbono e de valorização do sequestro desse gás, realizado com um único país, a Noruega”, enfatizou Martin. Em julho de 2009, a Guiana lançou sua estratégia de baixo carbono para promover o desenvolvimento econômico combatendo, ao mesmo tempo, a mudança climática. Na época, o presidente Bharrat Jagdeo propôs a criação de uma plataforma na qual as nações em desenvolvimento como seu país não fossem vistas como simples receptoras de ajuda, mas como sócias na busca por soluções climáticas.

Uma economia baixa em carbono é aquela em que as atividades produtivas são concebidas de modo a reduzir a quantidade de dióxido de carbono, que de outro modo iria para a atmosfera, e na qual todas as ações e os estilos de vida buscam minimizar os efeitos da mudança climática. Aproximadamente 80% das florestas da Guiana, equivalentes a cerca de 15 milhões de hectares, ainda estão intactos. Um estudo científico encomendado pelo governo estimou que este país poderia obter US$ 580 milhões por ano se voltando para atividades que podem destruir essas florestas, enquanto o valor econômico que tem para o mundo mantê-las em pé equivaleria a US$ 40 bilhões.

Jagdeo defendeu que as florestas da Guiana são um bem mundial, lar de pelo menos oito mil espécies vegetais e animais que as tornam uma das zonas mais biodiversas do planeta. Estas florestas também atuam como sumidouros que absorvem CO2, o principal gás dentre os que contribuem para o aquecimento global. Mediante incentivos econômicos apropriados para manter baixo o desmatamento, a Guiana poderia evitar emissões globais de dióxido de carbono equivalentes a 1,5 gigatonelada por ano.

O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) aprovou em 2012 um projeto para fortalecer a estratégia de baixo carbono da Guiana, por um valor próximo dos US$ 6 milhões para sua implantação, que se somam a mais de US$ 1 milhão entregues a esse país pela Noruega para os trabalhos preparatórios. O fundo de investimentos da Guiana para a Redução de Emissões Causadas por Desmatamento e Degradação das Florestas (REDD+) foi estabelecido em outubro de 2010 para financiar projetos desta estratégia de baixo carbono.

O projeto vai fortalecer a capacidade técnica e administrativa das instituições responsáveis por implantar a estratégia, e também desenvolverá um sistema de monitoramento, relatórios e verificação em nível nacional. A sociedade REDD+ entre Noruega e Guiana é a segunda maior do mundo, segundo o governo guianense. Martin informou que há negociações com o Banco Mundial, a Organização dos Estados Americanos, outras instituições financeiras e a Organização das Nações Unidas (ONU) que podem permitir que os países caribenhos obtenham financiamento por suas atividades para alcançar a resiliência climática.

Estes países “poderiam valorizar seus recursos naturais a partir do sequestro de carbono, e depois converter a propriedade desse sequestro em dinheiro, como está fazendo a Guiana, ou convertê-la em um espaço maior para negociar redução de dívidas e mais empréstimos brandos”, argumentou Martin. O advogado Bernard Wiltshire, presidente e fundador da Waitukubuli Ecological Foundation, com sede em Dominica, também acredita que é necessária uma nova mentalidade. Os países do Caribe devem criar indústrias apropriadas” e praticar o “tipo de turismo adequado”, afirmou ao Terramérica.

“Dominica poderia ter um setor turístico superando, de longe, o de Antiga. Esta tem sol, areia e mar, mas Dominica tem tudo isso e muito mais”, opinou Wiltshire. “Todo o mundo diz que é necessário sol, areia e mar, mas ignoram o turismo de natureza, de aventuras, o patrimonial e o de bem-estar”, acrescentou. “Estes setores estão crescendo. Descansar e beber rum debaixo de uma palmeira está saindo de moda. O negócio turístico caribenho está decaindo porque competimos com países maiores. Os turistas estão indo para muito mais longe, querem mais aventuras”, destacou.

As novas atrações são o sudeste asiático e as selvas da Birmânia. Contudo, “Dominica tem sua própria selva caribenha aqui mesmo”, que poderia atrair milhares de pessoas em busca de aventuras na selva, pontuou Wiltshire. Martin lamentou que uma região como esta, com tantas oportunidades extraordinárias, tenha economias empobrecidas. “São países com orçamentos nacionais de US$ 600 milhões anuais. Se conseguirem atrair em um ano ou dois a metade dessa quantia, ou mesmo mais, convertendo o trabalho silencioso de nossos sistemas naturais em dólares da comunidade financeira internacional, estará fora de perigo”, ressaltou.

O especialista disse que o Caribe pode transformar a si mesmo muito rapidamente, apenas adotando o enfoque de resiliência climática de seus sistemas naturais, como resultado do entendimento do quanto é vulnerável e, portanto, do quanto é vital reorganizar a forma como maneja seus recursos. “Está disponível o conhecimento para fazer os cálculos que permitam que o resto do mundo comece a nos recompensar por conservarmos nossas florestas, nossos arrecifes, sistemas hídricos, etc.”, indicou Martin. “Esta é a simples resposta à pergunta óbvia que nos faz a mudança climática. Nos diz: senhores, vocês têm opções. E sabem do que mais? Pela primeira vez a opção é uma vantagem para pequenas ilhas como as nossas”, concluiu. Envolverde/Terramérica

* O autor é correspondente da IPS.

 

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Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação apoiado pelo Banco Mundial Latin America and Caribbean, realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.