TERRAMÉRICA - Keystone XL: Um oleoduto até a Europa?

O planejado oleoduto binacional Keystone XL pode ser chave para exportar petróleo pesado canadense para a Europa.

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As manifestações contra o oleoduto Keystone XL se intensificam nos Estados Unidos.
Uxbridge, Canadá, 22 de agosto de 2011 (Terramérica).- Os defensores do oleoduto Keystone XL dizem que permitirá aos norte-americanos dependerem menos do petróleo importado de países hostis. Porém, diante do reduzido consumo de petróleo nos Estados Unidos, é possível que o oleoduto acabe simplesmente permitindo que o petróleo das areias de alcatrão mediterrâneas de Alberta, Canadá, seja exportado refinado para a Europa, segundo ambientalistas dos dois países.

Se for concretizado, o oleoduto transportará o petróleo do norte do Canadá até a costa norte-americana do Golfo do México. No entanto, a demanda por petróleo nos Estados Unidos diminuiu. O oleoduto proposto pela empresa petrolífera canadense TransCanada também poderia ser usado para bombear água do aquífero norte-americano de Ogallala, um dos maiores do mundo, para os Estados do árido sudoeste, por exemplo para o Texas, que hoje sofre a pior seca de sua história.

Os executivos do petróleo costumam dizer que oleodutos como o Keystone podem ser usados facilmente para levar água, disse ao Terramérica Maude Barlow, presidente do ambientalista Council of Canadians. Assim, “o Keystone XL representa uma dupla ameaça para Ogallala”, pela contaminação que possa causar um vazamento no oleoduto e pela extração de água cuja capacidade já está superestimada, disse Barlow.

Os vazamentos em oleodutos não são raros. Barlow recordou que há apenas um ano outra empresa canadense deixou vazar 3,2 milhões de litros de petróleo extrapesado retirado de areias betuminosas em um Rio de Michigan, recordou. Apesar dos enormes esforços para limpá-lo, funcionários da Agência de Proteção Ambiental (EPA) dos Estados Unidos afirmaram que podem passar anos antes de terminarem os trabalhos na bacia do Rio Kalamazoo, porque este petróleo betuminoso é muito mais pesado do que a água e contém mais metais pesados.

O Keystone I, um oleoduto menor que também pertence à TransCanada, empresa avaliada em US$ 40 bilhões, sofreu 12 vazamentos em seu primeiro ano de funcionamento, segundo a organização Amigos da Terra. O último, de aproximadamente 80 mil litros, aconteceu em maio no Estado de Dakota do Norte. Agora a TransCanada quer investir US$ 7 bilhões para construir o Keystone XL, com 2.753 quilômetros de extensão, segundo o Departamento de Estado norte-americano.

O traçado parte do norte de Alberta, no Canadá, cruza a fronteira e atravessa os Estados Unidos passando pelo aquífero de Ogallala, no Estado de Nebraska (centro do país), para dirigir-se às refinarias de Oklahoma e Texas, no sul. O oleoduto transportará entre 700 mil e 800 mil barris (de 159 litros) de petróleo cru por dia. Estima-se que nas areias de alcatrão haja aproximadamente 300 bilhões de barris de petróleo recuperável.

A extração é muito contaminante e exige uso intensivo de energia. Se for somada o posterior refino, é uma das atividades petrolíferas mais prejudiciais do mundo para o meio ambiente, afirmam os críticos. “Na realidade, o Keystone XL é para exportar para a Europa diesel refinado do petróleo betuminoso”, disse Brant Olson, ativista da Rainforest Action Network em São Francisco.

Embora a demanda por petróleo esteja em queda nos Estados Unidos, as refinarias localizadas na costa do Golfo, que se especializam em processar petróleo pesado, estão ampliando sua capacidade, explicou Olson ao Terramérica. A Valero Energy Corporation, importante refinadora, disse que necessita do petróleo das areias betuminosas porque as importações de petróleo da Venezuela e do México estão diminuindo, segundo Olson.

De acordo com a Administração de Informação de Energia dos Estados Unidos, esse país tem excedente de oleodutos, afirmou Ryan Salmon, conselheiro para políticas energéticas da Federação Nacional de Vida Silvestre. Acabaram de ficar prontos os oleodutos Keystone 1 e Alberta Clipper, e as estatísticas indicam que a produção petroleira de areias de alcatrão não bastarão para alimentar esses e outros dutos por mais dez anos, disse Salmon ao Terramérica.

“O Keystone XL segue em linha reta até a costa do Golfo. Vai receber o atual fornecimento do meio-oeste para destiná-lo a exportações de ultramar”, alertou Salmon. Em uma agressiva campanha midiática, a TransCanada repete que o Keystone ampliará a segurança energética dos Estados Unidos, evitando que o país “continue importando petróleo instável, a preços mais altos, do Oriente Médio e da Venezuela”. A empresa não respondeu à pergunta do Terramérica sobre o potencial exportador do oleoduto.

Tudo leva às exportações, afirmou Olson, embora “os norte-americanos ainda não o saibam”. A Europa é o principal mercado de diesel para seu parque de automóveis e caminhões que utilizam esse combustível. Mas, diante da falta de oleodutos que cheguem à costa atlântica do Canadá, no momento recebem pouco ou nenhum petróleo pesado desse país.

Uma proposta europeia de rotular e penalizar como “sujo” o diesel refinado de areias betuminosas, por sua alta concentração de gases-estufa, provocou em 2010 um enorme protesto do governo e da indústria petrolífera do Canadá. Quase todas as grandes companhias de petróleo do mundo têm interesses nas areias de alcatrão, entre elas a britânica British Petroleum, a norueguesa Statoil, a francesa Total, e a anglo-holandesa Shell.

Na Europa e nos Estados Unidos desenvolve-se uma enorme campanha de lobby para promover esta fonte de energia com participação de altos funcionários do governo canadense, informou Olson. O ministro de Recursos Naturais do Canadá, Joe Oliver, visitou em julho a Casa Branca para manifestar ao governo de Barack Obama que o Keystone XL pode abastecer os Estados Unidos com 30 milhões de barris de petróleo por mês, quase a mesma quantia que necessita para suprir o fornecimento suspenso pela guerra civil na Líbia.

“O petróleo é um produto básico globalizado. A única maneira de melhorar a segurança energética dos Estados Unidos é consumir menos energia e reduzir as importações, venham de onde vierem”, advertiu Olson. Por sua natureza binacional, a aprovação do projeto nos Estados Unidos requer autorização presidencial emitida pelo Departamento de Estado e uma avaliação de impacto ambiental. Espera-se que o resultado desse estudo seja divulgado no final deste mês.

Isto também é motivo de controvérsia. O cliente mais importante da consultoria encarregada do estudo ambiental pelo Departamento de Estado é a TransCanada, afirmou Salmon. Além disso, o principal lobista da TransCanada em Washington foi o segundo homem da campanha à presidência da atual secretária de Estado, Hillary Clinton.

Em setembro haverá a segunda rodada de audiências públicas, e se prevê que a decisão final será tomada antes do final do ano. Para aquecer os motores, no dia 20 foi lançada uma ação de desobediência civil contra o oleoduto, que inclui manifestações diante da Casa Branca. O Departamento de Estado está em uma situação incômoda, afirmou Salmon. Por um lado, trabalha com afinco para negociar um novo tratado mundial para deter a mudança climática e, por outro, pode acabar aprovando um oleoduto que, sem dúvidas, agravará a contaminação responsável pelo aquecimento global, ressaltou.

* O autor é correspondente da IPS.

LINKS

Mineração de areias negras custa caro

O petróleo é pago com muita água, em espanhol

Petroleiros canadenses pressionam Obama, em espanhol

Keystone XL segundo o Departamento de Estado, em inglês

The Council of Canadians, em inglês e francês

Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos, em espanhol e inglês

TransCanada, em inglês


Amigos da Terra Internacional, em espanhol

Rainforest Action Network, em inglês

Valero Energy Corporation, em inglês

Administração de Informação de Energia dos Estados Unidos, em inglês

Federação Nacional de Vida Silvestre, em inglês

Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.