Como comunicar a probabilidade de um desastre sem semear o pânico?

Meses antes do terremoto, L'Aquila sofreu uma série de abalos menores. Foto: Reprodução

A linha tênue entre precaver e aterrorizar habitantes em áreas de risco.

A condenação por homicídio culposo de seis sismólogos italianos e um funcionário do governo na cidade de L’ Aquila, região central da Itália, decorrente do suposto fracasso dos cientistas em alertar a população antes do terremoto que devastou a cidade em 2009, indignou muitos cientistas. Milhares assinaram petições protestando as condenações como algo retrógrado e anti-ciência.

Mas o julgamento também chamou atenção para um problema grave em regiões propensas a terremotos ao redor do mundo: como comunicar eficazmente o risco de um potencial desastre? Independentemente do mérito do julgamento em L’Aquila, cientistas e funcionários do governo têm dificuldade de transmitir o que sabem sobre o risco de terremotos de modo que ajudem a preparar o público, sem semear o pânico.

“As pessoas estão esperando muito mais informação, em particular, informação quantitativa”, disse Thomas Jordan, um professor da Universidade do Sul da Califórnia e diretor do Centro para Terremotos, em entrevista ao New York Times. “Tornar pública a informação disponível está se tornando uma exigência.”

Mas terremotos diferem de outros tipos de desastres naturais. Os meteorologistas podem acompanhar um furacão com precisão, mas os sismólogos não podem prever exatamente quando e onde um terremoto vai ocorrer. Cientistas criticaram a condenação italiana por essa razão, dizendo que os réus foram julgados por não fazer algo que é impossível.

O que sismólogos são cada vez mais capazes de fazer, no entanto, é prever a probabilidade de um sismo ocorrer em uma determinada área ao longo de um determinado período de tempo. A análise estatística mostra, por exemplo, que alguma atividade sísmica – um terremoto de pequenas proporções ou uma série de minúsculos tremores – aumenta a probabilidade de um grande terremoto ocorrer na mesma região.

Mas as probabilidades ainda são muito pequenas, e tornam-se ainda menores ao longo do tempo. Dada uma previsão de baixa probabilidade que pode gerar consequências de larga escala, o problema torna-se o que fazer com esse tipo de informação?

Essa foi a pergunta que os sismólogos italianos enfrentaram. Nos meses antes do terremoto de magnitude 6,3, a região havia passado por um enxame de pequenos tremores. Esses tremores provavelmente aumentaram a probabilidade de um grande terremoto no futuro próximo por um fator de cem ou mil, mas a probabilidade permaneceu muito baixa – talvez uma em mil.

A Cassandra de L’Aquila

E havia outro agravante em L’ Aquila que complicou a situação. Como os tremores continuaram na cidade durante vários meses, um homem local, que não é cientista, muito menos sismólogo, emitiu várias previsões alarmantes de um grande terremoto – especificando data e local – com base em medições de radão, um gás radioativo que é liberado de fraturas nas rochas.

As previsões, nenhuma das quais se provaram precisas, aumentaram a ansiedade dos habitantes da cidade – tanto que o governo italiano convocou uma reunião de uma comissão nacional de previsão de riscos em L’Aquila, que incluía os sismólogos e o funcionário do governo julgados.

Na reunião, os sismólogos afirmaram que era possível, embora improvável, que a atividade sísmica poderia sinalizar a iminência de um terremoto maior. Eles também observaram que há sempre algum risco em L’Aquila, que tem um histórico de terremotos. Mas em uma entrevista coletiva depois da reunião, a mensagem para o público foi truncada, e a impressão que ficou foi que o governo estava assegurando a população de que não havia perigo.

Em geral, os cientistas deveriam ter passado dados disponíveis sobre a probabilidade de um terremoto aos gestores de emergência da cidade, e em seguida, os gestores deveriam ser os responsáveis por tomar a decisão de esvaziar a cidade, fazer preparações mais simples ou não fazer nada. Neste caso, o que parece ter ocorrido é que os papéis de cientistas e autoridades municipais e federais se confundiram.

* Publicado originalmente no jornal The New York Times e retirado do site Opinião e Notícia.