Opinião

Seriam as empresas o nosso Frankstein?

Por Liliane Rocha* 

Vendo alguns estudos da OIT é impossível não notar o quanto a violência no mundo do trabalho por vezes parece aumentar, principalmente em tempos pautados pelo discurso da “crise econômica” são ocorrências de assédio moral, demissões em massa sem justificativas econômicas plausíveis e uma linha cada vez mais invisível entre vida profissional e pessoal.

Não é raro hoje, aliás, é regra, que ao chegarmos em uma empresa de grande porte, encontremos diversas câmeras instaladas que nos lembram Foucault em “Vigiar e Punir”, pois percebemos a existência de mecanismos de controle e vigilância por toda parte. Ou seja, todos precisam estar constantemente, sendo vigiados como se fosse pressuposto que alguém em algum momento fará algo de errado e precisará ser punido.

Fatores como estes demonstram que muitas das empresas não tem cumprido seu papel social, nem mesmo da porta para dentro, com seus próprios colaboradores. Esta conclusão só é válida quando o ponto central da nossa reflexão são as condições de bem estar e qualidade de vida do ser humano. Está evidente que se o ponto central nesta linha de raciocínio fosse o crescimento econômico, as corporações poderiam ser consideradas muito saudáveis, afinal têm demonstrado, cada dia mais, mesmo com a suposta crise, bom desempenho financeiro e rendimento.

Contudo, se pensarmos que as organizações, assim como todas as estruturas sociais, foram feitas pelo homem, e deveriam, portanto, suprir as suas necessidades, chegamos à conclusão de que estamos criando um “monstro”. Cabe aqui uma analogia com o Frankstein, a criatura que destrói seu próprio criador.

Foto: Shutterstock

 

Quando ampliamos esta análise para as relações externas, expressas no relacionamento das empresas com seus diversos stakeholders, o quadro se torna ainda mais preocupante, pois ainda hoje não podemos dizer que foi firmado um consenso sobre ser ou não obrigação das empresas desempenhar um papel ético, moral e social junto à comunidade nas quais estão inseridas, ao meio ambiente, do qual estão extraindo suas matérias primas, e junto à sociedade em geral.

Tudo que foi citado até este ponto foi para reforçar como em muitos casos o social ainda está apartado do econômico. O mais intrigante em tudo isso é que as organizações não são organismos vivos, mas sim instituições criadas e compostas por seres humanos, um coletivo de indivíduos que juntos compõe e formam as empresas. E, portanto concluir que as organizações não servem aos seres humanos, mas sim a um sistema é algo que deve causar muito estranhamento.

Certamente a integração do social e do econômico, com o ser humano no centro da estratégia de negócio, não só é possível como também é necessária. E hoje o anseio por essas transformações tem se refletido no mundo com o nome de sustentabilidade. Cada vez mais pessoas e organizações compreendem que em um mundo de profissionais insatisfeitos, de comunidades miseráveis e de escassez ambiental nenhum crescimento econômico será suficiente para assegurar a continuidade da espécie humana.

Conciliar fatores econômicos e sociais, não somente é possível, como também necessário. Já começamos a trilhar esse caminho colocando em prática estratégias de sustentabilidade, contudo há necessidade ainda de aprofundar, consolidar. Cabe a todos nós a função de olhar para as empresas, recriá-las, transformá-las e, de alguma forma, fazer com que cumpram seu papel fundamental que é servir bem as necessidades e anseios da humanidade. (#Envolverde)

* Liliane Rocha é diretora Executiva da empresa Gestão Kairós (www.gestaokairos.com.br), mestranda em Políticas Públicas pela Fundação Getúlio Vargas, MBA Executivo em Gestão da Sustentabilidade na FGV, Extensão de Gestão Responsável para Sustentabilidade pela Fundação Dom Cabral, graduada em Relações Públicas na Cásper Líbero. Gestora com 11 anos de experiência na área de Responsabilidade Social tendo trabalhado em empresas de grande porte – tais como Philips, Banco Real-Santander, Walmart e Grupo Votorantim. Escreve mensalmente para a Envolverde sobre Diversidade.