Internacional

Potencial para mais infraestrutura verde

Um dos 31 parques eólicos em operação no México. Até 2020, a capacidade instalada dessa energia renovável será de 15 mil megawatts no país. Foto: Cortesia de Dforcesolar
Um dos 31 parques eólicos em operação no México. Até 2020, a capacidade instalada dessa energia renovável será de 15 mil megawatts no país. Foto: Cortesia de Dforcesolar

Por Diego Arguedas Ortiz, da IPS – 

São José, Costa Rica, 11/8/2015 – Diante do desafio de ajustar sua infraestrutura energética para conseguir duplicar a oferta elétrica até 2050 e ao mesmo tempo reduzir suas emissões de gases-estufa (GEE), a América Latina tem apenas uma saída: a geração elétrica verde. Diversos estudos sugerem que essa meta dupla está ao alcance dos países latino-americanos, pois suas fontes renováveis ainda têm um enorme potencial não aproveitado.

Junto ao transporte e à mudança de uso do solo, a produção de eletricidade é um dos desafios regionais não resolvidos na luta contra a mudança climática. Atualmente, a geração elétrica latino-americana é a mais verde entre as regiões do planeta, um marco impulsionado por sua histórica aposta na hidroeletricidade. Mas o grande desafio é manter esse ritmo diante da demanda interna crescente.

“Quando se olha o conjunto, a infraestrutura regional continua fazendo como no século 20, tendo requerimentos e cenários para o século 21 totalmente diferentes”, disse à IPS o mexicano Joseluis Samaniego, diretor da Divisão de Desenvolvimento Sustentável e Assentamentos Humanos da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal). A eletricidade é fundamental no projeto das contribuições previstas e determinadas em nível nacional (INDC), a série de compromissos que cada nação se autoimporá para reduzir suas emissões de dióxido de carbono e outros GEE.

O estudo Repensemos Nosso Futuro Energético, elaborado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), afirma que a região vai precisar duplicar a capacidade de geração elétrica até 2050. Mas utilizar combustíveis fósseis como petróleo, carvão ou gás natural, gera gases-estufa que causam o aquecimento global. Isso leva á pergunta sobre que tipo de infraestrutura a América Latina incluirá em seu futuro energético.

Segundo o estudo do BID, a capacidade de geração renovável latino-americana (eólica, solar, hidrelétrica, geotérmica, biomassa) é tão extensa que só precisaria de 4% do potencial técnico total disponível para atender as necessidades até 2050. Entretanto, durante os últimos anos, a região investiu em geração mais suja. Embora por décadas a hidrelétrica tenha liderado a matriz energética da região, os dados mais recentes mostram que perdeu protagonismo.

Segundo a Organização Latino-Americana de Energia (Olade) representava apenas 38% em 2013, deslocada pelo gás natural, que agora representa 40%. Os países latino-americanos deverão reverter esse processo se querem propor metas ambiciosas e realistas em seus INDC. Apenas uma política energética forte permitirá propor compromissos adequados, afirmam especialistas. Até o momento, somente o México apresentou formalmente os seus, enquanto Chile, Colômbia e Peru mostraram progressos.

Todos os países deverão apresentar seus compromissos nacionais antes de 1º de outubro, para serem incorporados ao novo tratado universal e vinculante que será aprovado em dezembro, na cúpula sobre a mudança climática que acontecerá em Paris, na França.

Parte da barreira de concreto da represa da hidrelétrica binacional de Itaipu, compartilhada por Brasil e Paraguai. É a segunda central do mundo em potência instalada, atrás da de Três Gargantas, na China. Foto: Mario Osava/IPS
Parte da barreira de concreto da represa da hidrelétrica binacional de Itaipu, compartilhada por Brasil e Paraguai. É a segunda central do mundo em potência instalada, atrás da de Três Gargantas, na China. Foto: Mario Osava/IPS

“A América Latina, bem como o resto do mundo, deve se focar em desenvolver infraestrutura elétrica com fontes renováveis e com o menor impacto ambiental possível, procurando depender cada vez menos dos combustíveis fósseis”, apontou à IPS o engenheiro colombiano Santiago Ortega, especializado em fontes renováveis.

Ortega, também professor da colombiana Escola de Engenharia de Antioquia, acrescentou que a geração renovável deve fazer um balanço entre projetos locais que sejam menos invasivos e megaprojetos como as represas que permitem o armazenamento de energia, o que os torna confiáveis. “Os recursos financeiros sempre serão escassos, e é necessário investi-los da forma mais inteligente possível”, acrescentou.

De outro modo, o futuro energético mundial será caro. Se a economia mantiver seu alto consumo de carbono, o investimento necessário durante os próximos 15 anos “deverá estar em cerca de US$ 90 trilhões, ou uma média de US$ 6 trilhões por ano”, segundo o documento Melhor Economia, Melhor Clima, do projeto da Nova Economia da China.

Porém, o informe também ressalta que, ao incluir fontes renováveis e fazer cidades mais compactas, “a necessidade de investimento em infraestrutura de baixo consumo de carbono aumentará em apenas cerca de US$ 270 bilhões ao ano” em nível mundial. Por isso, especialistas como a economista costarriquenha Mónica Araya afirmam que “o giro em gestação no mundo, e nós não seremos a exceção, é para a diversificação (limpa) e a descentralização energética”.

Entretanto, a matriz elétrica compõe apenas uma parte da grande matriz energética da região, onde os combustíveis fósseis ainda reinam soberanos. Dados de 2013 da Olade indicam que o petróleo representará 49% como fonte de energia primária na estrutura regional, o gás natural 26% e o carvão 7%. Apenas 6% do total da energia primária é de hidrelétrica. A biomassa, a nuclear e outras fontes renováveis minoritárias completam o panorama.

O que a América Latina faz com esses 80% de combustíveis fósseis se tem uma eletricidade relativamente verde? Segundo o argentino Pablo Bertinat, diretor do Observatório de Energia e Sustentabilidade, da Universidade Tecnológica Nacional, quase metade dessa energia vai para o setor de transporte. “Em transporte é chave a infraestrutura”, afirmou Bertinat à IPS. “Grande parte do dinheiro público da região está colocada nas obras de infraestrutura que em grande medida buscam consolidar modos de transportes intensivos em energia”, acrescentou.

Bertinat apontou, como exemplo, que, enquanto a Argentina transporta 75% de sua carga por caminhões, países como França ou Estados Unidos só movimentou por esse meio 20%, priorizando vias fluviais e férreas.

As cidades também precisam mudar seus modelos e a costarriquenha Araya aposta em um transporte público coletivo que seja ao mesmo tempo moderno e limpo, eletrificando as frotas privadas, como táxis e veículos de carga. “Nos falta imaginação. Nem a classe política nem a empresarial despertaram para a necessidade de se investir em transporte público e de carga que seja limpo, moderno e digno”, ressaltou à IPS essa especialista que lidera a organização não governamental Nivela.

Todos esses esforços no setor energético também exigirão propostas em outros campos. A principal fonte regional de gases-estufa é o uso da terra e a silvicultura (47%), seguida da energia (22%), agricultura (20%), e dos resíduos (3%).

Potencial limpo não aproveitado

A América Latina só utiliza 22% de seu potencial disponível de hidroenergia. No futuro, os países da região precisarão incluir mais o potencial dos rios e de outras fontes limpas para tornar sustentável e diversificada sua matriz energética, afirmam especialistas. Um estudo publicado em 2008 pela REN21, uma rede mundial de políticas públicas sobre energias renováveis, afirma que essa riqueza hidroenergética poderia ser ofuscada por outras fontes na região, como a solar e a eólica.

Em conjunto, seus países têm um potencial hidrelétrico de 2,8 PWh (petawatts por hora, ou 1015 watts), superado pela geotérmica (quase 3 PWh), eólica terrestre (11 PWh) e solar fotovoltaica (cerca de 31 PWh). Esse potencial resulta gigantesco se comparado com a demanda regional. Em 2014, os países latino-americanos consumiram no total 1,3 PWh de eletricidade e os especialistas esperam que a demanda não supere os 3,5 PWh até 2050. Envolverde/IPS