Para entender o xadrez da economia

A economia assemelha-se a um jogo de xadrez. Há inúmeras peças no tabuleiro, com as posições de cada uma influenciando-se mutuamente. E vários objetivos simultâneos, que podem ser conflitantes entre si. O desafio do jogo é atender a todos os objetivos sem comprometer o equilíbrio geral.

É objetivo finalístico o atendimento do bem estar da população do país, garantindo emprego, renda e serviços públicos de qualidade.

Esse objetivo precisa ser alcançado criando-se um mercado interno robusto, com estabilidade de preços e equilíbrio nas contas externas.

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Em uma economia aberta, a produção interna disputa dois mercados – o interno e o externo – com os concorrentes internacionais.

O processo virtuoso de crescimento completa-se assim: cria-se um mercado interno robusto; que absorve uma produção interna robusta e competitiva; que gera mais emprego e mais renda, que ajuda a aumentar o mercado interno; que produz ganhos de escala permitindo alcançar outros mercados.

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A roda começa a pegar quando a produção interna não é competitiva em relação à externa – o que ocorre agora.

Aí, o processo degenera.

Primeiro, a queda da competitividade interna provoca a perda de mercados externos. Depois, a batalha é internalizada, e as empresas nacionais passam a lutar com as estrangeiras pelo próprio mercado interno de consumo.

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Para atender ao aumento da demanda, recorre-se cada vez mais aos importados.

Quanto mais importação, mais déficit externo e mais vulneráveis ficam as contas externas.

Quando se entra nessa dinâmica de déficits crescentes – quadro atual – há duas maneiras de resolver o pepino. A maneira usual é através do Senhor Crise.

Quando os investidores percebem que a situação está ficando insustentável, saem correndo. Há um estouro da boiada que desvaloriza o câmbio até mais do que o necessário e reequilibra a balança comercial.

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O segundo governo FHC praticamente acabou no primeiro mês, com a desvalorização cambial – fruto da política de empurrar com a barriga o déficit externo.

Em 2008, o segundo governo Lula caminhava para desastre semelhante. Foi salvo pela grande crise internacional, que desvalorizou o câmbio e obrigou a um conjunto de ações de emergência da Fazenda.

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Agora, já se entrou novamente nessa dinâmica. A acumulação de reservas cambiais por parte do Banco Central, que permitirá financiar os déficits por algum tempo. A cada semana o governo anuncia pacotes de subsídios, desonerações, incentivos financeiros para melhorar a competitividade da produção interna.

Todas essas ferramentas são gambiarras, e visam adiar a solução de um problema básico, que não foi enfrentado por nenhum governo desde os anos 80: o desequilíbrio do câmbio, que tornam os preços internos muito superiores aos internacionais.

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A maneira não traumática de resolver a questão é proceder a uma desvalorização cambial controlada do real; e, depois, ter sangue frio para atravessar um período de turbulências inflacionárias até a economia se estabilizar em outro patamar.

Não será nem neste ano, nem no próximo, devido ao fator eleições.

Provavelmente será no primeiro ou segundo ano do próximo governo.

* Luis Nassif é jornalista econômico e editor do site http://www.advivo.com.br/luisnassif[email protected].

** Publicado originalmente no site Carta Capital.