Opinião

No futebol ou nas empresas o eterno “apequenamento” das mulheres

Treino da seleção feminina de futebol em Itu-SP
Treino da seleção feminina de futebol em Itu-SP. Foto: Ricardo Stuckert/ CBF

Por Liliane Rocha*

As Olimpíadas 2016, como muitos colegas da área já disseram, têm sido um espetáculo à parte na promoção da Valorização da Diversidade.  Negros, asiáticos, homossexuais e mulheres brilhando em suas respectivas categorias, mostrando que talento, empenho e êxito não são limitados pelas ideias pré-concebidas da nossa sociedade. Quando falamos em talento, basta uma oportunidade para que todos tenham a chance de brilhar.

Neste artigo, no entanto, a luz será lançada sobre a forma como por vezes a cultura do brasileiro, relega o talento feminino ao segundo plano, bem como processos de adaptações e mudanças requerem esforço coletivo e individual. Mudança de padrão mental.

A seleção feminina brasileira realizou ao longo dessas Olímpiadas uma bela campanha, se tornando ainda mais reconhecida pelos brasileiros e brasileiras que prestigiaram, torceram e afirmaram o talento das esportistas. Inclusive em comparação ao time masculino, acostumado a ser o centro das atenções na mídia e nos ganhos financeiros.

Contudo, assistindo ao jogo “Brasil e Suécia” em 16 de agosto, foi impossível não notar deslizes dos narradores ao se referir às esportistas como “o cara” ou “ele” em momentos rápidos e sutis para alguém desconectado das discussões de equidade de gênero. Contudo, mais ainda, enquanto os jogadores brasileiros são comumente chamados durante os jogos de “os guerreiros”, “os heróis”, “os titãs”o time feminino é referendado com o termo “as meninas”.

Muitos defenderiam que é somente um tratamento carinhoso. No entanto, o quanto ele esconde atrás de si um certo “apequenamento” do talento das jogadoras. Por que não Heroínas? Guerreiras? Titãs?

No mundo corporativo esta questão é ainda mais evidente. Em uma reunião composta homens e mulheres, aos profissionais do sexo masculino, utiliza-se como base de nominação geralmente o cargo, sendo assim “os gerentes”, “os analistas”, no máximo (a depender da idade) os rapazes, mas nunca, jamais“os meninos”. Com mulheres, no entanto, independente de terem 20 ou 50 anos de idade, mesmo em reuniões com profissionais em nível gerencial é comum o uso do termo “a meninas”. “Parabéns meninas”, dizem as lideranças.

Soa como uma forma de eterna infantilização das profissionais. Afinal qual o arquétipo e estereótipo que vem em nossas mentes quando ouvimos essas palavras? Pessoas doces, suaves, cordiais, amáveis. Características fundamentais. Entretanto, sabemos muito bem que nas empresas, assim como nos campos de futebol, para se destacar como um talento são necessárias também características como fibra, assertividade, garra, empenho, seriedade, maturidade. Presentes tanto em homens como em mulheres.

Como isto é algo introjetado na sociedade as próprias mulheres também se comunicam desta forma. E nesse sentido, muitos e muitas, podem vir a contrapor as ideias aqui apresentadas. Sigo firme e lanço o desafio, já vi CEOs agradecendo a equipes compostas por Diretoras e Gerentes (mulheres) como “as meninas”. Alguém em algum momento já viu uma equipe de Diretores e Gerentes (homens), sendo chamadas de os meninos? Seria inimaginável.

Construir uma sociedade mais diversa, infelizmente, não é um processo naturalmente fluido e espontâneo. Se fosse, certamente já não existiriam mais preconceitos e discriminações. Por isso, precisamos estar atentos, aos nossos comportamentos, interpretações, visões de mundo. E principalmente a forma como tudo isso se expressa por meio das palavras, conversas, interações.

E parabéns as talentosas mulheres da nossa seleção brasileira. E a todos e todas as demais atletas e profissionais que tem representado o Brasil com tanto brilhantismo em seus respectivos campos de atuação. (#Envolverde)

* Liliane Rocha é diretora Executiva da empresa Gestão Kairós (www.gestaokairos.com.br), mestranda em Políticas Públicas pela Fundação Getúlio Vargas, MBA Executivo em Gestão da Sustentabilidade na FGV, Extensão de Gestão Responsável para Sustentabilidade pela Fundação Dom Cabral, graduada em Relações Públicas na Cásper Líbero. Gestora com 11 anos de experiência na área de Responsabilidade Social tendo trabalhado em empresas de grande porte – tais como Philips, Banco Real-Santander, Walmart e Grupo Votorantim. Escreve mensalmente para a Envolverde sobre Diversidade.