Economia

Ladislau Dowbor comenta a desigualdade global apontada pela Oxfam

O economista e professor Ladislau Dowbor comenta, com exclusividade para a Envolverde, em entrevista à jornalista Katherine Rivas, os impactos da extrema concentração de riquezas no planeta mostrada pelo relatórios da Oxfam (https://goo.gl/pE5TPs) lançado neste 16 de janeiro, onde o dado impressionante é que oito pessoas detém um patrimônio igual ao da metade mais pobre da humanidade.

Professor e economista Ladislau Dowbor

Doutor em Ciências Econômicas pela Escola Central de Planejamento e Estatística de Varsóvia, consultor das Nações Unidas e professor da PUC São Paulo, Ladislau Dowbor afirma que o problema da concentração de riqueza mundial radica em uma economia financeira de aplicação e não de produção. Confira a entrevista:

Envolverde: O relatório da Oxfam fala da extrema concentração de riqueza na mão de poucas pessoas. Qual o horizonte do mundo nesse cenário?

Ladislau Dowbor –  Primeiro precisamos entender que o patrimônio domiciliar liquido, a riqueza acumulada tudo é muito diferente do fluxo de renda. Um fator interessante é que o estudo faz um levantamento das pessoas ricas para apresentação no Fórum Econômico de Davos, uma evolução importante que antes só se debatia no Fórum Social Mundial, o que demostra que o capitalismo hoje também está preocupado com esta situação.

Existe um efeito multiplicador da riqueza. Uma pessoa não tem 80 bilhões de dólares em casa e sim em ativos em bancos. Aplicações financeiras são completamente diferentes. Se você faz muitas aplicações você tem direito de comprar produtos, mas você não produziu nada. Então se um bilionário aplica seu dinheiro rendendo 5% ao ano, ganhará 137 mil dólares por dia. Quando você é rico se torna mais rico rapidamente, um efeito radical e acumulativo.

Do outro lado, o pobre recebe sua renda mensal e a transforma em alimento, moradia, porém sem aplicação financeira, quem faz isso são os ricos que ao pagar suas despesas de luxo ainda investem seu dinheiro.

Enquanto os pobres vivem de renda os ricos multiplicam sua riqueza abruptamente pelas aplicações e tudo isso começou desde que o modelo tecnológico se tornou digital, um fenômeno mundial onde o dinheiro deixa de ser investido em desenvolvimento e passa a ser parte de aplicações financeiras.

Se você avalia os 5 mais ricos do relatório você não vê produtores e sim intermediários, eles se tornam ricos pela produção dos outros

Envolverde: É possível um desenvolvimento humano justo com isso?

Ladislau Dowbor – Não é viável porque a economia está sendo drenada por não produtores. Você tem intermediários financeiros que se apropriam de recursos e não geram emprego nem produtos.

Estes recursos devem ser utilizados para remunerar o desenvolvimento mais limpo e inclusivo, reduzindo a miséria e não para extorquir produtores. Precisamos responder aos desafios ambientais, estamos destruindo o planeta com aquecimento global, desmatamento generalizado e contaminação das aguas doces.

Deveríamos pegar os 20 trilhões ou 30 trilhões de dólares dos paraísos fiscais e reorientar as necessidades tecnológicas do planeta, uma inclusão produtiva

Envolverde: Como reverter isso?

Ladislau Dowbor – Enquanto as aplicações render os ricos vão continuar colocando dinheiro em produtos financeiros ao invés de melhorar a situação social. Precisamos taxar o capital improdutivo de forma a reduzir a tributação apenas se o rico inventar um produto de transformação social.

É inadmissível, no Brasil por exemplo como uma pessoa pobre pode pagar 27% de imposto na sua renda enquanto um sistema bancário paga 15% sendo que vive do dinheiro dos outros, esta é a reforma tributária que precisamos.

Temos um sistema de finanças globais onde caso discordar você pode pular para outro pais enquanto os governos permanecem locais.

O sistema deve ser articulado devolvendo o lucro para o local onde se paga impostos, uma zona financeira planetária. Hoje nosso sistema é fragmentado, o Banco Mundial não faz nada nem o Fundo Monetário Internacional, estamos frente ao caos financeiro mundial.

Envolverde: Esse quadro está se consolidando no Brasil também?

Ladislau Dowbor – O Brasil teve uma experiência de sucesso durante dez anos de redistribuição, onde não se fez caridade e se gerou oportunidades.

O ataque contra esse modelo veio dos grandes grupos financeiros e pendurou o oportunismo político, quando a Dilma tentou reduzir a taxa Selic e muitas pessoas migraram para o Banco do Brasil e Caixa a procura de menos juros. O sistema financeiro é poderoso em termos políticos, nosso Congresso foi eleito por um sistema de financiamento de campanhas inconstitucional.

No Brasil o cenário é dramaticamente abrupto, somos um dos países mais desiguais no planeta. Eu não vejo nenhuma perspectiva positiva para nós no atual governo onde tudo mundo está vendo quem agarra o pedaço de quem. Estão tentando prejudicar até o SUS, isso porque rende muito e é um sistema financeiro. Da mesma forma, temos uma falsa informação da redução da taxa Selic em relação a inflação, no rendimento dos bancos tudo aumento e não abaixou. (#Envolverde)