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Turismo na África oriental muito perto da guerra no Congo

O presidente do Quênia, Uhuru Kanyatta, disse o visto único permitirá promover a riqueza natural da região. Foto: Hjalmar Gislason/CC By 2.0
O presidente do Quênia, Uhuru Kanyatta, disse o visto único permitirá promover a riqueza natural da região. Foto: Hjalmar Gislason/CC By 2.0

 

Goma, República Democrática do Congo, 6/11/2013 – A maioria dos países da Comunidade Africana Oriental (CAO) se comprometeu em adotar um visto comum para promover o turismo na região. Contudo, a Tanzânia é dúvida, por causa do conflito na República Democrática do Congo (RDC). A CAO está formada por Burundi, Quênia, Ruanda, Tanzânia e Uganda. No dia 2 de agosto, Quênia, Ruanda e Uganda assinaram um acordo para adotar o visto turístico único a partir de janeiro próximo.

“O visto custará US$ 100 e terá validade de 90 dias. O país de entrada cobrará a tarifa”, disse à IPS Peter Okota, oficial de imigração de Kampala, capital ugandesa. Cada país receberá US$ 30 e os US$ 10 restantes serão destinados a cobrir os custos operacionais. Atualmente, o turista que deseja visitar qualquer dos cinco países da CAO precisa pagar entre US$ 250 e US$ 300, e somente o Quênia reconhece um visto emitido por outro membro do bloco.

No entanto, os esforços de integração são travados pelos complexos conflitos bélicos regionais. Suspeita-se que Ruanda e Uganda apoiam os rebeldes do Movimento 23 de Março (M23), que operam no leste congolense, enquanto a Tanzânia fornece soldados para a nova brigada de intervenção da Missão de Estabilização das Nações Unidas na RDC (Monusco), com capacidade para usar a força. “A participação da Tanzânia na nova brigada contra o M23 tem uma razão”, disse Godefroid Ka-Mana, presidente do Instituto do Polo dos Grandes Lagos, com sede em Goma, no leste da RDC.

Os soldados tanzanianos, que ajudaram em agosto o exército do Congo a expulsar o M23 de seu reduto estratégico 15 quilômetros ao norte de Goma, perderam dois homens nos combates. Um terceiro soldado morreu no dia 26 de outubro em confrontos entre forças da RDC, a brigada especial da Monusco e o M23. Os combates começaram no dia anterior nos distritos congolenses de Kibumba, Kiwanja, Rutshuru e Rumangabo, todos reclamados pelos rebeldes.

Thomas d’Aquin Mwiti, presidente da Organização da Sociedade Civil de Kivu do Norte, disse à IPS que a morte de soldados da Tanzânia inevitavelmente afetará as relações desse país com as nações acusadas de apoiarem o M23. Diogène Musoni, professor de economia na Escola Universitária de Turismo de Ruanda, acredita que a Tanzânia está mais comprometida com a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) do que com a CAO, e que vacila sobre o rumo de integração econômica que este último bloco está tomando.

O visto único permitirá aumentar em 50% a renda turística da CAO nos primeiros cinco anos de sua implantação, previu Musoni à IPS. “Esse visto facilitará as coisas para quem deseja visitar atrações turísticas da África oriental”, ressaltou. O porta-voz do Ministério do Turismo da Tanzânia se negou a comentar por telefone “as opiniões de intelectuais ruandeses”, mas garantiu que a CAO continua sendo tão importante quanto a SADC para seu governo.

Em setembro, o ministro tanzaniano para a CAO, Samuel Sitta, disse aos jornalistas que seu país não se deixaria pressionar para acelerar um processo de integração que não fosse sustentável. Sitta afirmou suspeitar que os três países participantes do plano do visto único queriam isolar a Tanzânia. “As áreas de cooperação nas quais trabalham os três países não são diferentes das que discutimos coletivamente durante a administração de Mwai Kibaki (presidente do Quênia entre 2009 e 2013). Se decidiram nos isolar, tudo o que podemos fazer é deixá-los sozinhos e lhes desejar sorte”, acrescentou.

Em uma declaração publicada em setembro, o governo de Burundi disse que o acordo entre os três países para o visto comum enchia de dúvidas os demais membros do grupo. Embora admitindo que a carta da CAO permite este tipo de acordo rápido, insistiu que as decisões devem ser tomadas por consenso entre todos os membros. Entretanto, no mesmo dia da assinatura do acordo, 2 de agosto, a ministra ruandesa para a CAO, Jacqueline Muhongayire, afirmou que “queremos deixar claro que os outros dois países (Burundi e Tanzânia) não foram deixados de lado. Podem optar por esse acordo quando o considerarem uma prioridade”.

Okota afirmou que a adoção do visto comum vem demorando desde 2006 por problemas de segurança e infraestrutura, e que ainda há divergências sobre as tarifas e a distribuição da renda entre os países. “Ainda há pequenos problemas com os preços e a distribuição do dinheiro”, afirmou à IPS a diretora interina do Escritório Nacional de Turismo de Burundi, Denise Nijimbere.

O presidente queniano afirmou que o visto comum é a única forma de a CAO atrair grande quantidade de turistas. “O objetivo é promover os gorilas de Ruanda, de Uganda e Burundi e a fauna do Quênia e da Tanzânia como um só pacote”, destacou Kenyatta em um fórum de turismo no mês passado em seu país. E acrescentou que espera que o visto comum seja implantado por todos os membros da CAO antes do final de 2014. Envolverde/IPS