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Terceira intifada palestina é vislumbrada no horizonte

Um familiar expressa seu descontentamento diante da casa do adolescente assassinado Mohamad Slaymi. Uma nota na porta diz que ali viveu um mártir. Foto: Mel Frykberg/IPS

 

Hebron, Palestina, 21/12/2012 – Batalhões da União Nacional, um novo grupo que reúne partidários de todo o espectro político palestino, convocou uma terceira intifada (levante popular) contra a ocupação, ao mesmo tempo em que a inteligência israelense alerta que estão dadas as condições para isso na Cisjordânia. Os dois pronunciamentos ocorrem após uma série de protestos e enfrentamentos entre soldados de Israel e jovens palestinos em diferentes localidades da Cisjordânia no final de semana passado, após a morte de Mohammad Salayma, de 17 anos, nas mãos de um guarda fronteiriço em Hebron.

Seguidores do Hamás (Movimento de Resistência Islâmica), Fatah, Jihad Islâmica e da Frente Popular de Libertação da Palestina anunciaram a criação dos Batalhões da União Nacional (BUN), por intermédio de um vídeo distribuído no mesmo final de semana.

O novo grupo se propõe consolidar a luta contra Israel. Embora tenha apoiado o reconhecimento pela Organização das Nações Unidas (ONU) da Palestina como membro observador, declarou que lutará para “recuperar toda a Palestina, do Mar Mediterrâneo ao Rio Jordão”. Segundo o vídeo, “este é o começo da terceira intifada palestina, que começa no coração de Hebron e se propagará por toda a Palestina”. As duas revoltas populares anteriores aconteceram entre 1987 e 1993 e de 2000 a 2005.

Os membros dos BUN ameaçaram sequestrar soldados de Israel caso as forças militares desse país não suspendam a detenção de cidadãos palestinos. Também disseram que se o Estado judeu continuar matando civis com impunidade pagará pela mesma moeda.

As demandas do grupo incluem a eliminação dos postos de controle na Cisjordânia, a libertação de todos os presos palestinos das prisões de Israel, a retirada deste país dos territórios que ocupa e a transferência à Autoridade Nacional Palestina (ANP) da arrecadação de impostos, confiscada pelo Estado judeu desde que melhorou seu status na ONU. Também reclamam a abertura de todas as passagens fronteiriças e o fornecimento de água e eletricidade à assediada Faixa de Gaza.

A declaração foi difundida no dia 14, um dia após a morte de Salayma, sobre a qual soldados israelenses alegaram que foram ameaçados com uma arma de plástico. Contudo, a família do jovem deu à IPS uma outra versão para o caso. “Duvido que Mohammad tivesse uma arma de plástico. Creio que os israelenses a colocaram depois do disparo”, denunciou à IPS o tio do rapaz, um policial da ANP. Ele acrescentou que “era o aniversário de Salayma, que saiu para comprar um bolo para comemorar. Para ir à loja tinha que passar por um posto de controle militar, na ida e na volta. Se tivesse a réplica de uma arma, a máquina de raio X a teria detectado”.

Nasim Salayma, de 22 anos, primo da vítima, afirmou que “era um estudante feliz e inteligente, e representou a equipe Palestina de luta na França. Voltava para casa com o bolo e somos obrigados a acreditar, de repente, que tentou impor-se a um grupo de soldados treinados e fortemente armados? Ele não era estúpido”.

Organizações internacionais defensoras dos direitos humanos, bem como palestinas e israelenses, registraram ao longo dos anos numerosos casos de palestinos assassinados por soldados israelenses em circunstâncias extremamente controvertidas. Do que não resta dúvida é que este último assassinato gerou um profundo mal-estar. Centenas de jovens saíram às ruas de Hebron no dia 13 para expressar seu descontentamento contra soldados israelenses, atirando pedras e queimando pneus.

Dezenas deles ficaram feridos, alguns gravemente, atingidos por munições reais e gás lacrimogêneo. Os protestos se espalharam a outros povoados e outras cidades da Cisjordânia. A IPS testemunhou enfrentamentos em Hebron no dia seguinte, durante uma manifestação de partidários do Hamás que comemoravam o 25º aniverário da criação desse movimento.

Foi a primeira vez em anos que a ANP permitiu ao Hamás organizar uma manifestação na Cisjordânia, no contexto de uma aproximação entre essa organização e o Fatah, principais partidos palestinos arquirrivais. Os pequenos passos para a unidade foram dados após o fortalecimento político do Hamás, depois do último ataque israelense contra Gaza, de 14 a 21 de novembro, que uniu os palestinos de todas as facções. As forças de segurança dos dois partidos também reduziram drasticamente o número de detenções mútuas.

Essa situação fez com que a imagem do Hamás crescesse na Cisjordânia, somada à próxima transferência por Israel de vários presos dessa organização de Gaza para a Cisjordânia, e pode consolidar mais a sua presença neste território palestino. Outro elemento que pode contribuir para nova insurreição popular é o possível colapso ou a dissolução da ANP pelo fato de o Estado judeu confiscar mais de US$ 1 milhão de impostos dos palestinos.

A ANP é a fonte de renda de várias centenas de famílias palestinas, o que faz numerosos especialistas preverem que um desemprego em massa se seguirá à dissolução desta entidade e deixará os palestinos em uma situação desesperadora. A indignação dos palestinos aumentou com o recrudescimento de ataques de colonos israelenses e a contínua expropriação de suas terras. Além disso, depois do reconhecimento internacional que significou a melhora de status dentro ONU, cresceu o sonho de um Estado próprio.

Enquanto isso, a Shin Bet, a agência de inteligência interna, observou que o malestar generalizado nos territórios ocupados pode fomentar o desenvolvimento de um tipo de infraestrutura capaz de incentivar uma terceira intifada, segundo a imprensa israelense. Envolverde/IPS