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Sociedade centro-americana pede proteção para sua agricultura na COP 20

Agricultor da localidade hondurenha de Alauca planta milho em seu terreno. A agricultura representa 20% do PIB em alguns países e a mudança climática pode ter efeitos nocivos sobre ela. Foto: Neil Palmer/Ciat
Agricultor da localidade hondurenha de Alauca planta milho em seu terreno. A agricultura representa 20% do PIB em alguns países e a mudança climática pode ter efeitos nocivos sobre ela. Foto: Neil Palmer/Ciat

 

 

São José, Costa Rica, 25/11/2014 – Preocupadas pelo efeito negativo da mudança climática na agricultura, na água e na segurança das comunidades, as organizações sociais da América Central exigem que seus governos deem prioridade a esses temas nas negociações climáticas da 20ª Conferência das Partes (COP 20) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática.

Durante os meses prévios à COP 20, a sociedade civil centro-americana se reuniu mais de uma vez para chegar a um consenso sobre sua posição em adaptação e perdas e danos. Esses são, junto com a mitigação, os pilares das negociações que acontecerão em Lima nos 12 primeiros dias de dezembro, e de onde deve sair o rascunho de um novo tratado sobre mudança climática, que deve ser assinado um ano mais tarde, na COP 21 que acontecerá em Paris.

“As organizações centro-americanas que trabalham sobre justiça climática, segurança alimentar e desenvolvimento sustentável procuram compartilhar informação e estabelecer uma posição comum”, disse à IPS a oficial de mudança climática do Centro Humboldt da Nicarágua, Tania Guillén. Esse consenso, em uma das regiões do mundo mais vulneráveis ao aquecimento global, servirá “para pedir aos governos que seus posicionamentos sejam semelhantes aos da sociedade civil”, explicou a representante da organização que é líder na área de pesquisa e do ativismo no tema.

Esse esforço para obter um diálogo centro-americano, afirmou Guillén, “garantirá que a adaptação seja um pilar do novo acordo e haja um bom ambiente para isso”. A ativista enfatizou que o outro pilar que interessa demais à região é o de perdas e danos, com o qual se busca atender e remediar os efeitos negativos da mudança climática que já são sofridos por países centro-americanos.

“Há estudos indicando que investimos 10% do PIB para nos recuperarmos do Mitch, que foi quase o ponto de partida da gestão de risco na região”, apontou Guillén, se referindo ao furacão que açoitou a América Central em 1998.

Esses dois grandes eixos temáticos dominam as agências das redes centro-americanas que buscam soluções para a mudança climática, como a Aliança Centro-Americana pela Resiliência, a Concertação Regional para a Gestão do Risco e o Fórum Centro-Americano Vulnerável. Essas organizações assinaram, no dia 14, a declaração do II Encontro Centro-Americano sobre Perdas e Danos pela Mudança Climática, quando ativistas de toda a região se focaram no estresse hídrico, na segurança alimentar e nos riscos que a população enfrenta.

O agricultor costarriquenho José Alberto Chacón cultiva feijão em área em forma de degraus, para controlar as correntes de água que causam a erosão do solo de sua pequena propriedade em Pacayas, nas ladeiras do vulcão de Irazú. É uma fórmula para adaptar-se à mudança climática. Foto: Diego Arguedas Ortiz/IPS
O agricultor costarriquenho José Alberto Chacón cultiva feijão em área em forma de degraus, para controlar as correntes de água que causam a erosão do solo de sua pequena propriedade em Pacayas, nas ladeiras do vulcão de Irazú. É uma fórmula para adaptar-se à mudança climática. Foto: Diego Arguedas Ortiz/IPS

 

Uma de suas demandas é que os sete governos da região consigam, durante a COP 20, “promover a declaração da América Central como uma região altamente vulnerável diante dos efeitos da mudança climática”. A mesma exigência partiu do V Encontro Regional América Central Vulnerável, Unida pela Vida, realizado em setembro. Uma nova reunião prévia à COP 20 acontecerá amanhã em Honduras.

As demandas da sociedade civil têm como apoio diversos estudos sobre a fragilidade climática do istmo centro-americano, situado entre dois oceanos. No informe A Economia da Mudança Climática na América Central, publicado em 2012 pela Comissão Econômica para a América Latina (Cepal) afirma que a região perderá ao menos 11% de suas precipitações até 2100.

Este ano, um informe do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre a Mudança Climática (IPCC) confirmou a previsão. Os possíveis efeitos da mudança climática sobre a agricultura centro-americana também são devastadores. A Cepal estima que, continuando o aquecimento global no ritmo atual, o istmo centro-americano sofrerá impactos negativos em sua produção agropecuária, que provocariam uma perda de quase 19% do PIB da área. Assim, as organizações da sociedade civil exigem dos governos e do Sistema de Integração Centro-Americano (Sica) uma posição mais firme em adaptação à mudança climática.

Porém, são desenvolvidos projetos para diminuir os efeitos negativos do aquecimento global na região. Na Costa Rica, o Centro Agronômico Tropical e de Pesquisa e Ensino (Catie) trabalha junto com as autoridades locais para desenvolver um plano de manejo de bacias. Uma delas é a do rio Barranca, que desemboca no Oceano Pacífico após banhar uma zona agrícola de grande importância.

“Estamos desenvolvendo um plano-piloto para a bacia e damos importância especial aos cenários de variabilidade e mudança climática que podemos prever para o futuro”, pontuou à IPS a coordenadora do programa para o Catie, Laura Benegas. O mesmo centro de pesquisa desenvolve um ambicioso programa de proteção e melhoria de sementes, para garantir a segurança alimentar do país durante o século 21.

A contraparte governamental das organizações sociais regionais, o Sica, é presidido atualmente por Belize, cujo governo garantiu que a mudança climática estará entre suas prioridades de gestão. Entretanto, as organizações têm dúvidas sobre como conseguirão traduzir suas posições nas estratégias de cada delegação governamental.

“Tampouco há incidência da sociedade civil no posicionamento oficial que se leva porque não existem mecanismos e porque muitos setores da sociedade civil ainda demoram em dar o passo”, apontou à IPS a costarriquenha Alejandra Granados, presidente da organização CO2.cr.

A América Central conta com a vantagem, com vistas à COP de Lima, de a Costa Rica presidir atualmente a Aliança Independente da América Latina e do Caribe, integrada por países de renda média que defendem uma iniciativa sobre adaptação dentro da Convenção. Guatemala e Panamá também estão no grupo, junto com Colômbia, Chile e o anfitrião Peru.

Durante a Cúpula sobre o Clima, realizada dia 23 de setembro na sede das Nações Unidas em Nova York, os países centro-americanos se comprometeram a tornar ainda mais verdes suas economias. A Costa Rica confirmou seu compromisso de ser carbono neutro até 2021, a Nicarágua prometeu continuar seu investimento em energias renováveis e a Guatemala se propõe a reflorestar 3,9 milhões de hectares entre 2016 e 2020.

Entretanto, a região tem pouca responsabilidade pelo aquecimento global. Enquanto China e Estados Unidos respondem por cerca de 20% cada um pelas emissões globais de gases-estufa, os seis países centro-americanos são responsáveis por apenas 0,8% dessa liberação.

Por contraste, segundo o índice de risco global da organização GermanWatch, três nações da região estão entre as dez mais afetadas pela mudança climática entre 1993 e 2012. Honduras ocupa o primeiro lugar entre os mais afetados, Nicarágua o quarto e Guatemala o décimo. Além disso, El Salvador está na 13ª posição, Belize na 22ª, Costa Rica na 66ª e Panamá na 103ª. Envolverde/IPS