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Respeitar o solo dá mais frutos na Tanzânia

Dois filhos de Peter Mcharo trabalham no campo de seu pai na aldeia de Kibaigwa, na região de Morogoro. Foto:Orton Kiishweko/IPS

 

Morogoro, Tanzânia, 7/5/2013 – O pequeno agricultor Peter Mcharo, da região tanzaniana de Morogoro, tem motivos para estar alegre. Suas terras estão sãs e cheias de milho, embora passe menos tempo trabalhando nelas. Considerada uma possível solução para a insegurança alimentar e um mecanismo de adaptação à mudança climática na África, a lavoura de conservação permite a produtores da Tanzânia, como Mcharo, obter melhores colheitas.

No dia 22 de abril, o ministro de Agricultura, Segurança Alimentar e Cooperativas, Christopher Chiza, exortou os pequenos produtores do país a praticarem a lavoura de conservação, sistema também conhecido como “semeadura direta”, que procura causar a mínima perturbação no solo onde se planta. Essa prática se apresenta como uma possível resposta à grave escassez de alimentos que sofrem 47 distritos desta nação da África ofiental. As regiões tanzanianas mais afetadas são Kilimanjaro, Lindi, Tanga, Mtwara, Iringa, Kagera, Mwanza e Singida.

Mcharo, da aldeia de Kibaigwa, disse à IPS: “Nas cinco temporadas em que usei este sistema confirmei que é melhor aplicar a lavoura de conservação. Meus colegas na cooperativa da aldeia e eu conseguimos maiores lucros para cada meio hectare do que quando cultivávamos uma porção maior de terra. Mcharo integra, junto com outros 30 produtores de sua aldeia, a cooperativa Umoja (“unidade”, em swahili), todos envolvidos na agricultura de conservação.

Estes são alguns dos vários produtos do país beneficiados por um projeto de agricultura de conservação apoiado desde 1998 pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO). O projeto, administrado pelo Ministério de Agricultura, Segurança Alimentar e Cooperativas, beneficia cerca de quatro mil pequenos agricultores nas regiões centrais e do norte de Morogoro, Kilosa, Mbeya, Arusha, Babati e Manyara.

Segundo um relatório de 2007, redigido por Richard Shetto e Marietha Owenya em conjunto com a FAO e outros sócios, intitulado A Agricultura de Conservação como Praticada na Tanzânia: Três Casos de Estudo, a produção agrícola é a base econômica do país. Responde por “cerca da metade tanto do produto interno bruto quanto das exportações. Aproximadamente 80% dos 34,5 milhões de habitantes do país, especialmente os que vivem nas áreas rurais e periurbanas, dependem da agricultura para sua subsistência”, acrescenta o documento.

A agricultura de conservação é uma prática de produção eficiente que implica uma mínima, ou nenhuma, perturbação do solo, que é mantido coberto o tempo todo, seja com a própria plantação ou com uma camada de resíduos de colheitas anteriores. Além disso, aplica-se um sistema de rotação de cultivos e se reduz, ou evita-se completamente, o uso de pesticidas, enquanto opta-se por outros métodos de proteção orgânicos.

Além disso, é dada ênfase a ferramentas simples e de baixo custo, como semeadoras e arados movidos por bois. O modelo Fitarelli de plantio direto a tração animal, uma invenção brasileira, se torna cada vez mais popular na agricultura de conservação.

Na última temporada de cultivos, Mcharo utilizou em sua terra, de 1,2 hectare, um arado que provoca mínima alteração no solo. Sem empregar fertilizantes, suas colheitas aumentaram de 20 quilos de milho em cada meio hectare, há dois anos, para 50 quilos em cada meio hectare, em novembro de 2012. Ele também intercalou cultivos de amendoim com o de milho.

“Antes podia chegar a gastar mais de US$ 125 na preparação do meu pequeno terreno e com a compra de fertilizantes e sementes, mas colhia apenas 15 quilos de milho em cada meio hectare e ganhava US$ 106 com eles”, contou Mcharo. “Além de reduzir os custos de produção, vi que esta tecnologia me poupa tempo e é menos exigente”, destacou.

A prática também melhorou sua qualidade de vida. Mcharo ganhou US$ 250 em sua última colheita, quase três vezes o obtido no ano anterior. Com uma família de nove pessoas, contou que pôde colocar um novo telhado em sua casa, comprou uma fresadora e acrescentou mais 1,2 hectare à sua propriedade, onde começará a cultivar arroz na próxima temporada.

O engenheiro agrícola Mark Lyimo, do Ministério de Agricultura, dirigiu a fase inicial do projeto de plantio de conservação. Ele disse à IPS que essa prática demonstrou ser útil para combater a degradação do solo. “Foi necessária devido à erosão do solo e à perda de fertilidade, que ameaçavam vastas superfícies das terras agrícolas na África e, como consequência, a existência das fazendas e das famílias rurais”, acrescentou.

“A tecnologia se concentra principalmente na produção sustentável por meio de um sistema intenso de plantação, pelo qual se intercalam duas vezes ao ano dois tipos de cultivos, um legume e um cereal”, detalhou Lyimo. O Ministério informou que, em geral, legumes, feijões e amendoim são intercalados em muitas plantações do norte e do centro do país. O engenheiro afirmou que deveriam ser redobrados os esforços para demonstrar que o plantio de conservação efetivamente funciona, e dessa forma mudar a mentalidade dos produtores, que por anos araram suas terras.

Joseph Ndunguru, do Instituto Mikocheni de Pesquisa Agrícola, da Tanzânia, destacou que os solos úmidos que são conservados com essa prática geram melhores colheitas ao longo de todo ano. “O agricultor descobrirá que esta tecnologia, além de reduzir seus custos de produção, lhe poupará tempo e exigirá menos”, acrescentou. Damian Gabagambi, da Universidade da Agricultura de Sokoine, disse à IPS que a prática também é boa para os pequenos agricultores porque reduz a vulnerabilidade dos solos diante da secas. Envolverde/IPS