Arquivo

Pescadores ilegais invadem o norte do Sri Lanka

Os pescadores de Sri Lanka são duramente afetados pela incursão de grandes barcos indianos. Foto: Amantha Perera/IPS

 

Jaffna, Sri Lanka, 7/3/2013 – O mar é o único âmbito que Arul Das, de 40 anos, domina. Só olhando as nuvens ou calculando a direção do vento, este pescador do norte do Sri Lanka sabe em quais condições terá que trabalhar. Até maio de 2009 a região em que pescava era a mais perigosa da região. Tinha que cuidar dos mortais confrontos entre a marinha de guerra do Sri Lanka e a unidade naval dos rebeldes Tigres para a Libertação da Pátria Tamil-Eelam.

Os Tigres, que então lutavam para criar um Estado independente para a minoria tamil no norte deste país da Ásia meridional, costumavam contrabandear armas pelo mar e realizar ataques suicidas contra a força naval do governo. Os rebeldes usavam botes civis, por isso Das e outros pescadores como ele tinham de ser particularmente cuidadosos para não serem confundidos e nem atacados pelas forças do governo. “Havia restrições à pesca sobre quando podíamos sair, sobre a capacidade dos motores que podíamos usar e sobre a distância que iríamos percorrer”, contou Das à IPS.

A guerra terminou em maio de 2009, quando os Tigres foram derrotados pelo governo. Das e milhares como ele pensaram que seus problemas tinham terminado. Contudo, quase quatro anos depois de encerrado o conflito e do fim das restrições, este pescador não pode aumentar suas capturas. Agora enfrenta uma nova ameaça: milhares de pescadores indianos que entram ilegalmente em águas cingalesas.

Todos os dias se pode ver os maiores e mais poderosos barcos indianos pescando ilegalmente no estreito de Palk, que marca a separação das jurisdições marítimas de Sri Lanka e Índia. Estes pesqueiros de arrasto usam redes maiores, algumas com vigas para conseguir melhor tração enquanto recolhem os produtos marinhos do leito do oceano.

Os pescadores cingaleses, com barcos menores, sabem bem que as tentativas de competir com os indianos podem lhes causar sérias perdas. “Cada vez que encontro casualmente com os pesqueiros de arrasto indianos, volto com danos superiores a US$ 1 mil”, destacou Das. Agora, simplesmente fica longe das áreas onde operam os barcos maiores. Mas essas são as águas mais ricas em peixes.

Maarten Bavinck, diretor do Centro para Pesquisa Marítima, com sede em Amsterdã, estuda o impacto das incursões indianas. O especialista disse à IPS que mais da metade dos estimados cinco mil pescadores de arrasto indianos, com base em portos do sul como Rameshwaran e Nagampathan, exploram os recursos das águas cingalesas.

Os estudos de Bavinck, em duas aldeias do norte do Sri Lanka, mostram que os pescadores locais foram duramente afetados: antes costumavam ir ao mar por 200 dias ou até um ano inteiro, e agora o fazem por apenas 60 a 80 dias. “As incursões dos barcos de arrasto são a principal razão da redução da pesca nestes dias”, afirmou. O impacto econômico desta redução é dramático: entre 20 mil e 28 mil famílias, cerca de cem mil pessoas no total, dependem da pesca no norte do Sri Lanka, segundo o governo.

Bavinck estima que a renda dos pescadores caiu até 20%. Em alguns casos, as perdas chegam a US$ 300 ao ano para pescadores cuja renda mensal varia de US$ 53 a US$ 60. “Como não podem alimentar suas famílias com o que ganham em 60 dias no mar, esses pescadores precisam de fontes de renda adicionais, por exemplo trabalhando como pedreiros”, afirmou.

A pesca ilegal aumenta apesar de as forças navais indianas e cingalesas patrulharem os 463 quilômetros de água que separam os dois países. Barcos pesqueiros indianos chegam inclusive às orientais cidades cingalesas de Trincomalee e Mulaittivu, a mais de 300 quilômetros da costa indiana. O diretor-geral do Departamento de Pesca e Recursos Aquáticos do Sri Lanka, Nimal Hettiarchchi, disse à IPS que as autoridades dos dois países buscam soluções para o problema.

“Não cremos que um controle maior seja a resposta. Temos que encontrar uma solução viável para apoiar os pescadores dos dois lados”, disse Heittiarchchi, acrescentando que continuam as discussões em nível ministerial e no de uma comissão conjunta sobre a pesca criada em 2011. Bavinck afirmou que a solução passa por um compromisso mútuo. “É preciso reduzir a frota de barcos de arrasto da Índia, para que correspondam à capacidade das águas desse país. Este é um processo complexo”, disse Heittiarchchi. Para Bavinck, “a frota de barcos indianos não tem outro lugar para ir, a não ser as águas de Sri Lanka”.

No momento prevalece a paz. Pescadores cingaleses disseram à IPS que procuram não provocar os indianos. “Nos recomendaram deixar que pesquem e voltarmos. Inclusive a marinha parece estar fazendo isso”, disse Douglas Paul, dono de barcos no porto de Pont Pedro. Envolverde/IPS