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Parlamento turco aprova uso da força contra a Síria

Doha, Catar, 5/10/2012 – O parlamento da Turquia aprovou ontem a realização de operações militares contra a Síria, se o governo considerar necessário, após o ataque contra um povoado turco da fronteira. A autorização legislativa, válida por um ano, foi aprovada por 320 dos 550 parlamentares, informou a agência de notícias Anatolia. Besir Atalay, um dos vice-primeiros-ministros da Turquia, explicou que a autorização não significa uma declaração de guerra, mas que pretende ser um elemento de dissuasão.

A decisão do parlamento coincide com o reinício da ofensiva, ontem, contra posições militares sírias, em represália pelo morteiro procedente desse país que no dia 3 caiu na localidade turca de Akcakale, matando cinco pessoas da mesma família, uma mulher e quatro crianças. “A parte síria reconheceu o que fez e pediu desculpas”, informou Atalay.

A imprensa estatal turca disse que prosseguiam os ataques por parte das unidades de artilharia localizadas em Akcakale. Vários soldados sírios morreram na ofensiva noturna da Turquia contra uma base perto da fronteiriça cidade de Tal al-Abyad, segundo um grupo de ativista sírio com sede na Grã-Bretanha.

“A Turquia não tem nenhum interesse em travar guerra com a Síria. Mas é capaz de proteger suas fronteiras e adotará represálias quando for necessário”, escreveu Ibrahim Kalin, assessor do primeiro-ministro, Recep Tayyip Erdogan, em seu Twitter. A represália turca, que já dura três dias, deveria ser considerada como uma “advertência” pelas autoridades de Damasco. “As iniciativas políticas e diplomáticas continuarão”, acrescentou.

O parlamento já previa votar ontem a ampliação de sua autorização para cinco anos para operações militares no exterior, originalmente concebida para atacar bases curdas do norte do Iraque. O pedido assinado por Erdogan e enviado ao parlamento argumentava que, apesar das reiteradas advertências e iniciativas diplomáticas, o exército sírio havia lançado uma ação agressiva contra o território turco, o que apresentava “riscos adicionais”.

A petição prosseguia dizendo que “esta situação chegou ao ponto de criar uma grave ameaça e um grave perigo para nossa segurança nacional. Neste momento, é preciso tomar as medidas necessárias para agir imediatamente e com rapidez contra riscos e ameaças maiores”. A Turquia considerou que o ataque com morteiro foi a “gota d’água” na escalada de tensões fronteiriças motivadas pelo conflito interno sírio, que já dura 18 meses. Fontes da segurança turca disseram que o morteiro partiu de um lugar perto de Tal al-Abyad e que a Turquia aumenta seus efetivos na fronteira.

“Nossas forças armadas na região responderam de imediato a este abominável ataque, segundo as normas de intervenção. Apontou-se com artilharia contra objetivos sírios identificados por radar”, diz um comunicado do escritório de Erdogan divulgado no dia 3. “A Turquia nunca deixará de responder a este tipo de provocação do regime sírio contra nossa segurança nacional”, acrescenta.

A Síria informou que estava investigando a origem do morteiro e pediu moderação. O ministro da Informação, Omran Zoabi, expressou suas condolências ao povo turco e disse que seu país respeita a soberania das nações vizinhas. Após o contra-ataque, outro vice-primeiro-ministro turco, Bulent Arinc, disse que seu país não “está cego pela raiva”. “Definitivamente, está prevista uma resposta a este ataque no direito internacional. Não estamos cegos pela raiva, mas protegeremos nossos direitos até o fim diante de um ataque contra nosso território como este, que matou nossa gente”, declarou Arinc.

O correspondente da Al Jazeera na localidade fronteiriça de Antakya, Andrew Simmons, disse que a referência de Arinc a “certas responsabilidades” contidas nos artigos da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) poderia implicar que a Turquia responda sem prévia consulta aos órgãos internacionais. A Otan apoiou a Turquia, membro dessa aliança e pediu urgência à Síria para pôr fim às suas “flagrantes violações do direito internacional”.

A Síria deve perguntar se de fato “quer envolver a Turquia no conflito e se deseja que este seja o começo de uma maior e crescente escalada da violência regional”, apontou Anita McNaught, correspondente da Al Jazeera em Akcakale. A Otan convocou uma reunião urgente em Bruxelas no dia 3 à noite para discutir o assunto. É a segunda vez nos 63 anos de história da Otan que seus membros recorrem ao Artigo 4 da carta da aliança, que prevê a realização de consultas quando um dos Estados-membros sente que a integridade de seu território, sua independência política ou sua segurança estão ameaçadas.

A Turquia também pediu ao Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) que tome as “medidas necessárias” para deter a “agressão” síria. Em carta enviada ao Conselho de Segurança, de 15 membros, o embaixador turco, Ertugrul Apakan, qualificou a agressão síria de “violação da paz e da segurança internacionais”.

Diplomatas da ONU afirmaram que integrantes do Conselho esperavam poder aprovar uma declaração não vinculante condenando o ataque “nos termos mais enérgicos” e reclamar o fim das violações à soberania do território turco. Os membros do Conselho de Segurança esperavam divulgá-la no dia 3, mas a Rússia, aliada incondicional da Síria, pediu mais tempo, segundo diplomatas ouvidos pela Al Jazeera. Rússia e China já vetaram três resoluções das Nações Unidas condenando o regime do presidente Bashar Al-Assad. Envolverde/IPS

* Publicado sob acordo com a Al Jazeera.