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Outras respostas ao HIV/aids em Cuba

Havana, Cuba, 14/6/2012 – Novas atitudes surgem entre a população de Cuba diante da epidemia de HIV, vírus causador da aids (síndrome de imunodeficiência adquirida), enquanto pessoas que vivem com a doença e soronegativas sensíveis à causa buscam outras vias para diminuir as infecções no país.

“As pessoas não se conscientizam da percepção de risco, mesmo sabendo da condição sorológica de seus parceiros sexuais. Se está tendo sexo sem proteção, não se importa em ser infectada”, comentou Jorge Brito Echeverría, um dos mais de 300 integrantes do Grupo de Prevenção à Aids (GPsida) de Cuba. Formada por promotoras e promotores voluntários de saúde, esta rede de soropositivos e soronegativos trabalha há quase 20 anos na divulgação de práticas seguras para deter o avanço do HIV (vírus da imunodeficiência humana) e pela qualidade de vida de seus portadores, em um apoio aos órgãos sanitários governamentais.

Os últimos dados disponíveis indicam que até 2010 foram registrados em Cuba aproximadamente 14 mil casos soropositivos. “Perdeu-se o medo do HIV/aids”, apontou Echeverría, que coordena o GPsida no município de Arroyo Naranjo, um dos 16 pontos da rede. Para ele, se deve “seguir trabalhando para elevar a percepção de risco. Ter HIV é difícil, mesmo que existam os medicamentos”, observou à IPS. A descoberta da terapia antirretroviral converteu esta enfermidade em doença crônica. Os que a cumprem, junto a múltiplas indicações médicas, como ter dieta saudável, podem viver longos anos.

As autoridades cubanas cobrem gratuitamente 97% do tratamento nas 16 províncias do país. “Uma das causas (da não proteção) está no seguinte pensamento: o que me interessa me contaminar, se há remédios que me manterão vivo por muitos anos”, continuou o ativista. Desde 2004, começou-se a detectar em nível internacional infecção do vírus pelo contato com pessoas soropositivas conhecidas. No caso de Cuba, são necessários estudos mais precisos para saber quanto e como se manifesta entre sua população as chamadas “infecções não evitadas”, que podem ser “intencionais” e “não intencionais”, segundo os especialistas Angela Gala e Yasel M. Santiesteban, do estatal Instituto de Medicina Tropical Pedro Kourí.

A primeira classificação define os casos “nos quais se demonstra o desejo manifesto de se contaminar”, enquanto a segunda descreve aqueles “nos quais não se consegue demonstrar o desejo de se infectar e há relação com uma pessoa conhecida vivendo com HIV”, afirmaram os cientistas durante o IX Evento Científico Nacional do GPsida. Anualmente, a rede realiza um encontro de seus integrantes para saber o que “se está fazendo no país, nas comunidades, nos centros de pesquisa e nas universidades”. Sua última edição aconteceu em Havana entre os dias 6 e 8 deste mês, no Centro de Atenção Integral a Pessoas com HIV/aids.

As opiniões de portadores da ilha sobre as formas de contágio, obtidas por meio de grupos de discussão, foram levados ao encontro pelos dois especialistas. Após sistematizarem as visões de participantes de Holguín, Santiago de Cuba, Samagüey e da capital, defenderam novos enfoques para analisar os riscos de infecção pelo vírus. “Pode estar nos fugindo a epidemia por determinados elementos que, se não tivermos em conta e não forem investigados, não venceremos a doença”, alertou Santiesteban sobre a pandemia que afetava 34 milhões de pessoas no planeta no final de 2011, segundo a Organização Mundial da Saúde.

Aplicada a uma mostra de aproximadamente três mil pacientes do sistema de atenção ambulatorial no país, a “Pesquisa de portadores de HIV/aids 2009. Uma ferramenta para a ação” indagou sobre diversas causas de infecção. Dos pesquisados, 3,9% marcou a opção por compartilhar com soropositivos. Também revelou que 0,5% dos entrevistados quis contrair a doença, que em sua maioria afeta homens que têm sexo com outros homens. Contudo, houve 15,8% que não percebeu que tinha possibilidade de se infectar e 13,2% que consideraram que “o destino lhe pregou uma peça”, diante da pergunta sobre o contágio, com opção para várias respostas.

O informe, divulgado em 2011 pelo estatal Escritório Nacional de Estatísticas e Informação, indica que o primeiro fator de risco foi “não ter usado camisinha nas relações sexuais”. Por isso, educar a população sobre sexo protegido e seguro continua sendo um dos objetivos cruciais do GPsida. Com pouco mais de 11 milhões de habitantes, Cuba apresenta uma prevalência da infecção de apenas 0,18% na faixa etária entre 15 e 49 anos. O Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/aids qualificou esse indicador de “excepcionalmente baixo”.

Esta realidade torna mais exigente o trabalho de prevenção e resulta mais difícil obter grandes progressos, dizem os especialistas. Carlos Aragonés, fundador em 1991 e coordenador nacional do GPsida, explicou à IPS que “é preciso trabalhar de maneira muito personalizada” para se conseguir baixar o número de novos casos anuais. “A primeira coisa que queremos é entender por que as pessoas continuam se infectando”, explicou Aragonés.

Por isso, a reunião anual da rede constitui “uma necessidade, mais do que uma vontade. Neste espaço podemos ver se nossas estratégias são as adequadas ou devem ser modificadas”, acrescentou Aragonés. Entre os principais desafios do projeto figura apoiar os pacientes com a adesão terapêutica, que consiste em adaptar-se a tomar a terapia antirretroviral. Com ela, “aumenta-se a expectativa de vida e se diminui a possibilidade real de transmissão por HIV. Por isso é tão importante”, enfatizou o ativista. Envolverde/IPS