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ONU pede ao Sri Lanka que detenha a violência contra minoria muçulmana

As mulheres muçulmanas foram as primeiras a voltar para casa depois dos violentos distúrbios que o sudoeste do Sri Lanka sofreu, no dia 15 de junho de 2014. Foto: Amantha Perera/IPS
As mulheres muçulmanas foram as primeiras a voltar para casa depois dos violentos distúrbios que o sudoeste do Sri Lanka sofreu, no dia 15 de junho de 2014. Foto: Amantha Perera/IPS

 

Nações Unidas, 7/7/2014 – O secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon, exortou o governo do Sri Lanka a “tomar as medidas necessárias” para evitar novos ataques contra a minoria muçulmana nesse país de maioria budista. “O secretário-geral está preocupado com os ataques registrados contra as comunidades muçulmanas no sul do Sri Lanka”, declarou à IPS o porta-voz da ONU, Stephane Dujarric, após pergunta sobre as denúncias de violência na região.

Violentos distúrbios ocorreram na cidade de Aluthgama no dia 15 de junho, com saldo de quatro mortos e cerca de 80 feridos, além da destruição de casas e comércios da minoria muçulmana, que é 10% dos 20 milhões de habitantes. As agressões aconteceram depois de uma manifestação antimuçulmana organizada pelo Bodu Bala Sena (Força de Poder Budista), um grupo ultranacionalista vinculada à família do presidente Mahinda Rajapaksa nesse país da Ásia meridional.

O porta-voz da ONU disse que Ban recordou a resolução que o Conselho de Direitos Humanos tomou em março, que exorta o governo do Sri Lanka a investigar as supostas agressões a membros de grupos religiosos minoritários e a tomar medidas que evitem esse tipo de ataque no futuro. “O secretário-geral pediu ao governo que tome as medidas necessárias para evitar qualquer deterioração da situação, que investigue imediatamente os incidentes e garanta a segurança de todos os cidadãos do Sri Lanka”, detalhou Dujarric.

A Associação de Muçulmanos do Sri Lanka na América do Norte (TASMinA) fez uma manifestação de protesto diante da sede da ONU em Nova York, no dia 25 de junho, pedindo a intervenção do secretário-geral. “Pedimos amavelmente sua intervenção e que solicite ao governo do Sri Lanka que impeça o ódio e a violência contra os muçulmanos e outras comunidades minoritárias no país, e que leve os autores dos recentes assassinatos e violência à justiça”, dizia uma carta da entidade dirigida a Ban.

Em comunicado divulgado no dia 2, três especialistas em direitos humanos da ONU pediram ao Sri Lanka “a adoção de medidas urgentes para cessar a promoção do ódio racial e religioso e a violência contra as comunidades muçulmana e cristã de grupos budistas com pontos de vista extremistas, e que os autores da violência sejam levados à justiça”.

“Nos últimos anos foram denunciados mais de 350 ataques violentos contra muçulmanos e mais de 150 ataques a cristãos no Sri Lanka. As duas comunidades são submetidas com frequência a expressões de ódio, discriminação, agressões e atos de violência”, acrescenta o comunicado.

Em entrevista à IPS, o embaixador do Sri Lanka na ONU, Palitha Kohona, disse que seu país “não pode permitir nenhum conflito inter-racial ou inter-religioso nesta etapa, principalmente em um momento em que se recupera de 27 anos de violência terrorista”, se referindo à guerra civil (1983-2009), que terminou com a derrota do grupo separatista Tigres para a Libertação da Pátria Tamil (LTTE).

A economia do Sri Lanka está se recuperando e “temos uma oportunidade maravilhosa para garantir uma vida melhor a todo nosso povo”, afirmou o embaixador. “Embora a intolerância inter-racial e inter-religiosa não seja exclusiva do Sri Lanka, o presidente Mahinda Rajapaksa condenou de modo inequívoco a violência recente no país”, destacou.

Kohona também prometeu que os responsáveis serão levados à justiça. “Também devemos nós mesmos abordar nossos problemas e buscar soluções de dentro e resistir à tentação de buscar intervenções externas para lidar com questões essencialmente nacionais”, destacou o embaixador.

David Griffiths, diretor para a região Ásia Pacífico da Anistia Internacional, disse à IPS que esta organização “está extremamente preocupada pelo recrudescimento da violência contra as minorias religiosas no Sri Lanka e com a impunidade com que esses ataques acontecem”. “Recebemos centenas de denúncias de ameaças e ataques contra cristãos e muçulmanos e seus lugares de culto nos últimos dois anos”, pontuou. Os responsáveis costumam ser grupos budistas radicais com supostos vínculos com funcionários do governo, e nenhum deles foi devidamente investigado, acrescentou.

“Há numerosas denúncias de que a polícia não interveio para proteger as minorias do Sri Lanka dos ataques. Todos esses incidentes devem ser investigados de maneira efetiva e os autores devem ir à justiça”, ressaltou o representante da Anistia. Griffiths também afirmou que as autoridades poderiam exercer uma influência considerável sobre os partidários desses grupos e devem trabalhar muito mais para resolver as tensões e deter a violência.

Um editorial do The New York Times, de 27 de junho, dizia que “extremistas budistas que semeiam o ódio no Sri Lanka desataram a pior onda de violência em anos contra os muçulmanos no país” asiático. A maioria dos 20 milhões de habitantesdo país, incluídos os 70% da maioria budista, rechaça o Bodu Balu Sena, grupo acusado pela violência, segundo o jornal norte-americano.

Segundo o editorial, “o Sri Lanka precisa ser saneado. As declarações de Rajapaksa na segunda-feira ordenando à policia tomar medidas contra qualquer pessoa ou grupo que incentive o ódio étnico ou religioso são bem-vindas. Mas o presidente não repudiou o Bodu Bala Sena nominalmente”.

Rita Izsk, relatora especial da ONU para assuntos das minorias, disse à IPS que está “extremamente preocupada com a situação no Sri Lanka e o que parece ser um padrão de ataques que surgiu nos últimos meses”. A relatora exortou o governo a atuar com decisão para que a violência dirigida contra as minorias religiosas cesse o mais rápido possível. “O Código Penal deve ser mudado para proibir e punir as expressões de ódio e a incitação ao mesmo”, acrescentou.

Izsk também afirmou que o governo deve enviar um forte sinal de que os responsáveis serão processados por suas ações e que não se permitirá agir com impunidade. “Embora sejam animadoras, as declarações do governo sobre adotar medidas para investigar os incidentes e que o presidente designará uma comissão de alto nível para investigar os recentes distúrbios, isso deverá ser feito rapidamente e com independência para ganhar a confiança das comunidades afetadas”, destacou.

O governo tem a “responsabilidade de proteger” todas as pessoas e deve cumpri-la na prática, concluiu Izsk. “Acreditamos que o budismo é pacífico e não violento. Respeitamos o budismo e amamos o Sri Lanka, nossa pátria”, disse Najaf Jamsheed, presidente da TASMinA, em sua carta a Ban Ki-moon. Os recentes ataques contra muçulmanos no Sri Lanka e suas propriedades por parte de elementos extremistas cingaleses liderados pelo Bodu Bala Sena são incidentes abomináveis de racismo, afirmou.

Na carta, a TASMinA agradece a Rajapaksa por assumir uma responsabilidade pessoal para garantir que as vítimas dos distúrbios antimuçulmanos sejam atendidas e indenizadas em suas perdas. Mas “exortamos energicamente o governo do Sri Lanka a desfazer a impressão de que apoia as atividades de organizações como o Bodu Bala Sena”, acrescentou. Envolverde/IPS