Arquivo

O perigo está no Ártico

A visualização de dados do satélite Aqua mostra a máxima extensão de gelo para o período 2008-2009. Foto: NASA Goddard's Scientific Visualization Studio

Uxbridege, Canadá, 19/9/2011 – A rapidez com que o planeta perde gelo no Polo Norte continua surpreendendo os especialistas. O derretimento é um dos principais motores do sistema climático da Terra, além de modificar os fenômenos meteorológicos de forma imprevisível. Cientistas alemães encontraram outra pista contundente que confirma o aquecimento global, causador da mudança climática: o gelo do Ártico diminuiu para um mínimo histórico. O fenômeno também acelera a mudança climática, além da atividade humana com cada barril de petróleo, tonelada de carvão ou cada metro cúbico de gás queimados.

O derretimento do gelo do Ártico superou o último mínimo registrado em 2007, informaram pesquisadores da alemã Universidade de Bremen no dia 8. Outros centros de pesquisa, com diferentes ferramentas de análises e satélites, indicaram que ainda não foi superada a extraordinária redução de gelo registrada naquele ano e que 2011 ocupa o segundo lugar.

“Cremos que ficará bem abaixo da marca, mas, pouco importa”, disse Mark Serreze, diretor do Centro Nacional de Dados sobre Gelo e Neve, com sede na cidade norte-americana de Boulder, no Estado do Colorado. “O extraordinário deste ano é que não houve episódios climáticos raros como os que criaram as condições perfeitas para o degelo de 2007”, disse Serreze à IPS. Este verão boreal foi normal, mas o gelo desapareceu em um volume semelhante ao de 2007. “Isto nos diz que a camada de gelo é muito fina para manter-se em condições normais”, explicou.

A Passagem do Noroeste e a Rota do Mar do Norte, ao redor do Ártico, estão abertas novamente, como acontece todos os anos desde 2007. Um navio-tanque atravessou o oceano em tempo recorde de oito dias, desde Houston, nos Estados Unidos até Map Ta Phut, na Tailândia. A perda de gelo neste verão duplicou a de 30 ou 40 anos atrás.

Uma criança nascida no início da era do satélite, quando a humanidade pôde olhar pela primeira vez a imensidade congelada, hoje com 32 anos, teria visto que mais de três milhões de quilômetros quadrados de gelo, a superfície da Índia, desapareceram entre o verão do ano de seu nascimento e o verão atual. É quase certo que não haverá gelo no Ártico no verão quando uma criança nascida em 1979 completar 50 anos.

É uma mudança rápida em escala planetária, com consequências de longo alcance, um fenômeno que os cientistas apenas começam a compreender. Uma das consequências é a aceleração da mudança climática enquanto o Ártico passa do branco para o azul escuro, e o oceano absorve tremendas quantidades de calor durante as 24 horas do dia na temporada de verão.

A previsão é que essa situação acrescente uma quantidade extra de aproximadamente 0,3 watts por metro quadrado de energia calórica às terras emergidas e à superfície da água do planeta, calculou Stephen Hudson do Instituto Polar Norueguês. É uma quantidade de energia suficiente para acender uma luz LED noturna a cada metro quadrado, nos 510 milhões de metros quadrados de terras emergidas. Neste contexto, a temperatura global aumentará 0,25 graus, disse à IPS o especialista Johan Abrajam, da Universidade de St. Thomas, em Minnesota, nos Estados Unidos.

A enorme quantidade de calor se concentrará primeiro no Ártico, onde as temperaturas já são, em média, entre três e cinco graus acima das registradas há 30 ou 40 anos. O calor adicional ameaça acender o pavio da maior “bomba de carbono” do mundo, a vasta região de 13 milhões de quilômetros quadrados com permafrost que inclui Alasca, Canadá, Sibéria e parte do norte da Europa.

O permafrost contém, pelo menos, o dobro de carbono do existente hoje na atmosfera. Ainda que libere uma pequena porcentagem desta quantidade, as consequências meteorológicas serão catastróficas, afirmou o especialista Vladimir Romanovsky, da Universidade do Alasca, em Fairbanks. O permafrost diminui de espessura há duas décadas e o grau de degelo acelera com o aumento da temperatura, disse à IPS.

A situação terá profundas consequências para as populações humanas do planeta. Em 2050, haverá 200 milhões de refugiados, a maioria procedente de zonas costeiras baixas, devido a fenômenos climáticos como elevação do nível do mar, segundo dados do Global Governance Project (Projeto de Governança Global). A tragédia climática se agrava enquanto Estados Unidos e a maioria dos países industrializados se deixam levar pela relativa exagerada ameaça terrorista e gastam bilhões de dólares em defesa e nas guerras do Afeganistão e Iraque.

Os Estados Unidos podem gerar energia necessária para atender 100% de seu consumo elétrico com sua produção eólica, solar, geotérmica e produzida pelas ondas do mar por muito menos do que gastou em defesa e em guerras nos últimos dez anos, disse Richard Heinberg, especialista do Post Carbon Institute, com sede na Califórnia. Porém, a economia norte-americana está em tão mau estado que já não pode assumir o custo nem continuar queimando fósseis, disse Heinberg à IPS. “Seremos obrigados a utilizar muito menos energia, mais cedo ou mais tarde”, acrescentou. Envolverde/IPS