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Migração sazonal afeta planejamento familiar na Etiópia

Mulheres e crianças se protegem do causticante Sol na Região Somaliana da Etiópia. Foto: Miriam Gathigah/IPS
Mulheres e crianças se protegem do causticante Sol na Região Somaliana da Etiópia. Foto: Miriam Gathigah/IPS

 

Dollo Ado, Etiópia, 22/1/2014 – Yohamin Kesete, de 32 anos, e seus seis filhos vivem nesta comunidade pastoril da Região Somaliana da Etiópia, açoitada pela seca. Mas nem sempre ficam aqui. Kesete explicou que quando a temperatura aumenta, ou as chuvas ficam mais intensas, sua família é obrigada a abandonar a área e ir em busca de água ou pastagens.

“Temos que sobreviver, por isso vamos para outras regiões. Esta é uma área difícil. Houve vezes em que tivemos que nos mudar quando eu estava grávida, porque ficou muito seco e não tínhamos nada para comer. Não podíamos ficar em Dollo Ado só para o parto acontecer em um hospital. Morreríamos de fome”, contou Kesete à IPS.

Sua aldeia fica a 980 quilômetros da capital, Adis Abeba, e é difícil para o governo e as organizações não governamentais dar-lhes serviços de planejamento familiar devido à vida nômade da comunidade. “Só posso alimentar os filhos que já tenho, e tenho medo de parir mais seis antes de completar 40 anos”, disse Kesete.

O planejamento familiar é reconhecido e implantado como parte essencial do desenvolvimento, sobretudo por sua importância na redução da mortalidade materna e na melhoria da saúde das mulheres grávidas. Mas o Estudo Demográfico e de Saúde da Etiópia indica que a demanda não satisfeita de anticoncepcionais nesta nação do Chifre da África chega a 25,3%.

Atualmente, morrem 676 mulheres etíopes para cada cem mil nascidos vivos, um leve aumento em relação a 2005, quando eram de 673 para cada cem mil. “A migração sazonal das comunidades pastoris continua frustrando os esforços para assegurar que tenham acesso não apenas ao planejamento familiar, mas também que tenham mais opções”, explicou à IPS Feven Alazar, funcionária do Ministério da Saúde.

“Entre as comunidades pastoris as mortes maternas são muito mais altas. Não só a prevalência de contraceptivos é baixa, como as mulheres dão à luz em suas casas, o que geralmente acarreta complicações”, acrescentou a funcionária, lembrando que, “quando são levadas para centros de saúde, já é muito tarde para salvar o bebê ou a mãe”.

Segundo Alazar, quando os pastores se movem de uma área para outra em busca de água, funcionários da saúde dos planos de extensão do governo, que fornecem serviços de planejamento familiar casa por casa, também o fazem. “Como a comunidade, os agentes de saúde abandonam as áreas áridas quando estão muito secas. Precisam sobreviver”, acrescentou. Assim, um significativo número de mulheres nas áreas áridas e semiáridas ainda não goza de pleno acesso a anticoncepcionais.

Embora o centro e o sudoeste da Etiópia tenham maior taxa de prevalência de anticoncepcionais (em Adis Abeba chega a 56,3%), a situação é preocupante no leste e sul. “Há muitos refugiados somalianos em Dollo Ado, que tem população aproximada de 500 mil habitantes. No acampamento de Kobe há cerca de 127 mil pessoas, e no de Bokolmanyo, 130 mil”, afirmou Mekuria Altaseb, da não governamental Associação de Orientação Familiar da Etiópia.

“Aqui a prevalência de anticoncepcionais é inferior a 8%. O planejamento familiar é fundamental para reduzir as mortes maternas”, ressaltou Altaseb à IPS. Ela reconhece que o governo trabalha para reassentar as comunidades pastoris em lugares com condições ambientais mais favoráveis, mas afirmou que “não se faz o suficiente para proteger os pastores da mudança climática”.

“Embora Dollo Ado seja muito seca, há dois grandes rios. O Dawa, na fronteira com o Quênia, e o Ganale, que cruza Dollo Ado. É preciso implantar inovações para ajudar os pastores a terem acesso fácil à água e que não a usem apenas para o gado, mas também para a agricultura, para não terem que estar se trasladando constantemente”, acrescentou Altaseb. Entretanto, destacou que o país aumentou a prevalência nacional de anticoncepcionais de apenas 15% em 2005 para 29% em 2011, em um esforço para reduzir a mortalidade materna para 267 para cada cem mil até 2015.

Porém, estatísticas de organizações e agências da ONU como Fundo de População das Nações Unidas mostram que a Etiópia, junto com outros seis países africanos, incluindo Nigéria e República Democrática do Congo, ainda respondem pela metade de todas as mortes maternas do mundo. “Sem acesso ao planejamento familiar, as mulheres nas comunidades pastoris continuarão dando à luz até que seus ventres sequem”, afirmou Alazar. Envolverde/IPS