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Muita gente na Índia prefere o suicídio

Voluntários em uma atividade para conscientizar sobre o problema social no qual se converteram os suicídios na Índia. Foto: Sujoy Dhar/IPS
Voluntários em uma atividade para conscientizar sobre o problema social no qual se converteram os suicídios na Índia. Foto: Sujoy Dhar/IPS

 

Thiruvananthapuram, Índia, 4/11/2013 – O suicídio de Sarath, 29 anos, que se enforcou no escritório da empresa de segurança onde trabalhava, em Kattakada, sul da Índia, foi uma lembrança do que as estatísticas mostram há tempos: cada vez mais homens jovens se suicidam nesse país por problemas socioeconômicos. Sarath há tempos estava deprimido, supostamente pelas dívidas de um empréstimo bancário que não podia pagar, segundo pessoas próximas a ele.

Em 2012, suicidaram-se 135.445 pessoas neste país, 79.773 homens e 40.715 mulheres, segundo estatísticas divulgadas no começo deste ano pelo Escritório Nacional de Registros Criminosos, que funciona vinculado ao Ministério de Assuntos Internos da Índia. O Estado de Bengala Ocidental não separou os números por sexo.

Esse órgão atribui a maioria dos suicídios masculinos a causas socioeconômicas, enquanto, por outro lado, as mulheres decidem se matar na maioria das vezes por sofrimentos emocionais. As mulheres representam 48,65% da população indiana segundo o censo de 2011.

Os suicídios de agricultores foram durante muito tempo o segredo mais guardado dessa nação principalmente agrícola. A seca, a carestia dos insumos e as dívidas fizeram com que 13.754 produtores rurais se suicidassem em 2012, segundo o Escritório Nacional de Registros Criminosos.

“Os homens ainda são o principal arrimo econômico das famílias. Qualquer obstrução ou crise pode levá-los a tomar a medida extrema de pôr fim às suas vidas”, afirmou à IPS a pesquisadora independente Sreeleja Nair, especialista em desenvolvimento social e radicada em Thiruvananthapuram, capital do Estado de Kerala. “É provável que os homens interajam mais diretamente com as entidades públicas e sociais que garantem a coesão social”, acrescentou.

As mulheres são mais propensas do que os homens e pensar duas vezes, ressaltou à IPS o psicoterapeuta-chefe do Centro de Guia e Orientação Psicológica de St Joseph, Jose Puthenveed, na cidade de Kollam, 72 quilômetros ao norte de Thiruvananthapuram. Puthenveed baseia sua experiência no centro não governamental que trabalha na prevenção de suicídios nessa cidade.

Porém, Nair resiste a levar muito longe a divisão entre motivos socioeconômicos e emocionais para explicar os suicídios masculinos e femininos. Segundo ela, cada vez mais mulheres participam de atividades econômicas e se envolvem diretamente com a comunidade. “Além disso, as chamadas causas pessoais ou emocionais podem ter origem em contextos sociais ou econômicos”, apontou.

Uma grande quantidade dos que cometem suicídio tem entre 15 e 29 anos. Os jovens representaram 34,6% das vítimas no ano passado. “Os assuntos amorosos, o fracasso nos exames, os abusos sexuais, as zombarias, as humilhações e os conflitos familiares são alguns dos motivos que afetam os jovens mais sensíveis, empurrando-os para o suicídio”, disse à IPS o psicólogo clínico Jayapradeep, que tem consultório em Kochi.

A. R. Suseel, conferencista no departamento de orientação psicológica do Seminário Teológico Unido de Kerala, acredita que o “motivo real é a incapacidade de uma pessoa para superar os problemas, desafios ou crises que se apresentam”. E, “atualmente, as pessoas não compartilham seus problemas com familiares ou amigos”, disse Suseel, que também investiga a prevenção de suicídios na Universidade Serampore de Bengala Ocidental. “A falta de apoio social, emocional e psicológico agrava o estado de ânimo das pessoas mentalmente frágeis”, acrescentou.

Os problemas familiares contribuem de modo significativo para o suicídio. Estatísticas do Escritório Nacional de Registros Criminosos mostram que 25,6% dos suicídios em 2012 foram por esse motivo. Além disso, 71,6% dos homens que se suicidaram no ano passado eram casados. A porcentagem de mulheres casadas foi de 67,9%

“Atualmente as pessoas são mais egocêntricas. Convertem assuntos menores em grandes problemas, o que leva a uma crise mental. Os choques de ego só pioram as coisas”, disse à IPS a monja Celine, que trabalha no Centro de Guia e Orientação de St Joseph, em Kollam.

O sacerdote Abraham Scaria, diretor do Centro de Guia e Orientação Psicológica do Hospital Marthoma, em Thiruvananthapurma, aponta como fator as mudanças na estrutura familiar tradicional, das famílias estendidas às nucleares. “A interação social com outros parentes diminui quando as pessoas optam por famílias nucleares”, disse à IPS. Assim, cria-se uma sensação de isolamento e um estado de indefesa mental acrescentou, ressaltando que “nessa etapa as pessoas pensam que se suicidar é melhor do que viver”.

Implantar estratégias preventivas na comunidade e identificar indivíduos vulneráveis pode ser mais efetivo do que as estratégias globais para deter os suicídios, afirmam Rajeev Radhakrishnan, da norte-americana Universidade de Yale, e Chittaranjan Andarade, do Instituto Nacional de Saúde Mental e Neurociências, da Índia, no estudo Suicídio: Uma Perspectiva Indiana, publicado no Indian Journal of Psychiatry, em 2012.

Suseel acreedita que é necessário um centro de manejo de crises em todas as aldeias de Kerala. No ano passado, esse Estado teve a terceira maior proporção de suicídios, 24,3% para cada cem mil habitantes, depois de Sikkim, no norte, e Tamil Nadu, no sul. Envolverde/IPS