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Forças difíceis de armar

Washington, Estados Unidos, 2/9/2011 – Os esforços dos Estados Unidos para criar forças de segurança afegãs capazes de frear o ressurgimento do movimento islâmico Talibã enfrentam vários desafios, desde econômicos até a falta de vontade dos pastunes no sul em integrar um exército nacional. O subcomandante-geral para apoio regional na Missão de Treinamento da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), Guy “Tom” Consentino, fez esta semana uma avaliação dos progressos e desafios no Afeganistão em matéria de segurança.

“Quando dizemos que os afegãos vão fornecer segurança, não me refiro ao fim da guerra dia 31 de dezembro de 2014”, quando as tropas lideradas pelos Estados Unidos cederão a responsabilidade de defender o país, afirmou Cosentino durante um debate no centro de estudos não governamental Atlantic Council, em Washington. “O exército e a polícia afegãos darão segurança ao seu próprio povo, mas haverá ataques ocasionais”, acrescentou.

O apoio popular nos Estados Unidos à guerra uma década depois dos ataques do 11 de setembro de 2001 em Nova York e Washington diminuiu, enquanto aumentam os custos financeiros e humanos do conflito. Ainda que os Estados Unidos comecem a retirar os 33 mil soldados enviados ao Afeganistão desde que Barack Obama assumiu o poder em 2009, o número de baixas continua aumentando.

Agosto, foi o mês mais mortal da guerra para as tropas norte-americanas, com 66 mortos. Neste ano, as baixas nas forças de Washington chegam a 300, e a 1.750 desde que começou a guerra em 2001. As esperanças dos Estados Unidos em reduzir seu pessoal militar para dez mil ou 20 mil (de um contingente atual de cem mil soldados) dependem em grande parte de poder criar forças afegãs efetivas. Após um intrincado começo, a Missão de Treinamento da Otan, inaugurada há quase dois anos, agora trabalha para formar mais de 300 mil policiais e soldados locais. Cosentino disse que a qualidade das forças está melhorando, mas reconheceu que a missão ainda tem vários desafios pela frente.

Um deles é a postura dos pastunes do sul – a maior fonte de recrutas do Talibã – que agora constituem cerca de um terço do exército e da polícia, mas têm pouca representação nos altos postos de comando. Embora se saiba que 40% dos oficiais do exército sejam pastunes, Cosentino afirmou desconhecer a porcentagem dos que são originários do sul. O tajiks, grupo étnico do norte que constitui apenas 25% da população afegã, estão representados em 39% dos postos de oficiais do exército. Os pastunes são 44% da população afegã.

Somente 14% dos afegãos entre 18 e 40 anos (o principal setor de recrutamento) sabem ler e escrever, e a situação é “pior no sul”, disse Cosentino. Por isto, o treinamento básico tanto para o exército quanto para a polícia inclui aulas de leitura. E mantê-los nas fileiras “ainda é um desafio”, disse Cosentino. A taxa de baixas no exército foi de 32% em 2010. A deserção se deve, em parte, por falta de lei obrigando os uniformizados a permanecerem nas corporações uma vez que nelas ingressam, ao contrário do que ocorre nos Estados Unidos e em outros países.

Para compensar a reticência dos pastunes do sul em integrar as forças nacionais, a Otan promove o recrutamento de policiais locais em uma espécie de réplica dos “Filhos do Iraque”, milícia formada por sunitas que não desejavam integrar o exército iraquiano, dominado pelos membros do ramo xiita do Islã.

Matthew Hoh, ex-comandante de uma companhia de fuzileiros navais e agora diretor do Grupo de Estudo sobre o Afeganistão, disse à IPS que Washington não pode superar a hostilidade local contra sua intenção de criar um exército nacional. Para ele, há um ressurgimento do Talibã, refletido no crescente número de explosivos improvisados colocados em objetivos das forças norte-americanas e afegãs, bem com na resistência do grupo em participar de negociações para uma solução pacífica do conflito.

Em uma mensagem por ocasião do final do mês sagrado muçulmano do Ramadã, o líder do Talibã, mulá Omar, que se acredita esteja no Paquistão, afirmou: “O inimigo sofreu mais baixas na alma e em equipamento este ano do que no anterior”. Omar se referia à morte de 30 soldados norte-americanos, incluindo integrantes de grupos de elite da marinha, no acidente com um helicóptero no dia 6 de agosto e no assassinato em 12 de julho de destacados oficiais afegãos, entre eles Ahmad Wali Karzai, chefe da província de Kandahar, e meio-irmão do presidente Hamid Karzai. Omar não mencionou a morte do líder da Al Qaeda e aliado do Talibã, Osama bin Laden, no dia 1º de maio, no Paquistão. Envolverde/IPS