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Conhecimento indígena para salvar florestas

A comunidade de Olonana Ole Pulei é uma tribo da etnia maasai do Quênia. Foto: Isaiah Esipisu/IPS

Durban, África do Sul, 12/12/2011 – Para a comunidade laibon, uma tribo da etnia maasai do Quênia, a floresta Loita, de 33 mil hectares, é um santuário. “Nossos deuses vivem aqui. Colhemos ervas deste lugar. O usamos para criar abelhas. Portanto, faz parte de nosso meio de vida”, disse Olonana Ole Pulei sobre essa floresta localizada na província queniana do Vale do Rift. Pulei esteve em Durban representando sua comunidade na 17ª Conferência das Partes (COP 17) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática.

Segundo Nigel Crawhall, do Comitê Coordenador dos Povos Indígenas da África, (Ipacc), diferentes comunidades africanas possuem incríveis conhecimentos indígenas que usam na conservação das florestas e da biodiversidade em geral, e isto deveria ser reconhecido nas negociações climáticas. Crawhall deu com exemplo as comunidades de pigmeus bambuti e batwa, no leste da República Democrática do Congo, que conservam as florestas utilizando métodos tradicionais. Os dois grupos dependem da biodiversidade animal das florestas equatoriais para sobrevier.

“Em geral sabem identificar árvores que podem ser cortadas para criar uma abertura única na abóboda florestal, o que permite entrar a luz nos fechados bosques do Congo. A luz atrai pássaros e insetos que eles podem caçar”, disse Crawahll à IPS. Isto ajuda a conservar a biodiversidade, em particular as florestas, porque este método só pode funcionar se a abóboda florestal estiver intacta.

No Quênia, a cultura maasai proíbe os membros da comunidade de cortar árvores, seja para obter lenha ou para outro fim. Também é proibido interferir com as raízes principais ou eliminar toda casca de uma árvore para extrair substâncias herbáceas. Suas crenças indicam que só podem usar os galhos como lenha, e as raízes fibrosas como ervas. Se a casca de uma árvore tem valor medicinal, somente se pode aproveitar pequenos pedaços, cortando em forma de V. Depois, este corte é selado com terra úmida. Esta prática é transmitida de geração em geração na comunidade maasai.

Entre os laibons, são os conhecimentos indígenas que ajudam a conservar a floresta Loita. Os membros dessa comunidade consideram que cortar uma árvore é atentar contra os deuses e contra sua cultura. Embora todos os africanos sejam nativos de seu continente, Crawahll diz que os grupos que conservam a definição de indígenas são aqueles que vivem da caça e da coleta, enquanto outros praticam a pecuária pastoril ou a agricultura em terra seca.

Apesar de não haver uma definição padrão sobre estas populações, a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas (2007) reconhece que comunidades particulares, devido a circunstâncias históricas e ambientais, estão fora do sistema estatal e ficam pouco representadas em matéria de governança. “Os bosquímanos da África austral, ou a comunidade ogiek do Quênia, que vivem nas florestas, são exemplos típicos de grupos categorizados como indígenas”, afirmou Crawhall.

A África tem mais de 40 povos que sobrevivem totalmente da caça e da coleta, acrescentou Crawhall. O Ipacc trabalha estreitamente com 155 comunidades de 22 países africanos que se reconhecem como originárias devido às suas circunstâncias históricas e ambientais. Desta forma, representantes destas comunidades uniram-se ao resto do mundo em Durban para fazer ouvir suas vozes, a fim de que sua contribuição à conservação florestal seja reconhecida como parte dos esforços de mitigação e adaptação à mudança climática.

“Acreditamos que os conhecimentos ecológicos tradicionais africanos são a base de políticas nacionais de adaptação adequadas e efetivas”, disse Crawhall. Por intermédio da secretaria da Ipacc, as 155 organizações comunitárias existentes na África redigiram um rascunho com sua posição para a plataforma de negociação. Cobraram que os negociadores representem todas as partes africanas: organizações indígenas, autoridades e sistemas de valores tradicionais.

Exigem a formação de uma entidade regional legalmente vinculante no contexto da Organização das Nações Unidas (ONU) para manejar assuntos de conservação que são difíceis de tratar no âmbito nacional. “Uma das brechas dominantes na maioria dos países membros do IPACC é que não há direitos reconhecidos sobre a posse da terra para as comunidades que vivem nas florestas ou delas dependem”, explicou Crawhall.

Entretanto, vários países liderados pelo Quênia começaram a responder às necessidades de suas comunidades locais incluindo-as em suas estratégias de adaptação à mudança climática. O Quênia está em processo de redigir um projeto de lei de adaptação à mudança climática. E as comunidades indígenas colocarão sua perspectiva nesse texto porque, segundo a Constituição, devem ser consultadas na elaboração de iniciativas legislativas.

“Atravessamos todo o país em busca de opiniões sobre este projeto. Nossa visão é participar e liderar no desenvolvimento e na implementação de políticas sensíveis à mudança climática, bem como de projetos e atividades dentro e fora de nossas fronteiras”, disse John Kioli, presidente do Grupo de Trabalho do Quênia sobre Mudança Climática, presente em Durban. Envolverde/IPS

* Este artigo é parte de uma série apoiada pela Aliança Clima e Desenvolvimento (CDKN).