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Como barquinhos de papel na tempestade

Uma vendedora oferece seus produtos em um mercado de Dominica. Foto: Desmond Brown/IPS
Uma vendedora oferece seus produtos em um mercado de Dominica. Foto: Desmond Brown/IPS

 

Castries, Santa Lúcia, 10/10/2013 – Malcolm Wallace sempre soube qual seria seu destino. Aos 19 anos construiu sua própria estufa na propriedade de seu pai, em Dominica, e ali plantou alface, pimentão, tomate e pepino. “Era uma atividade muito lucrativa e realmente ganhei dinheiro”, contou Wallace, hoje cientista do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento Agrícola do Caribe, com sede em Trinidad e Tobago. “A motivação era financeira. As pessoas fazem coisas e veem que realmente conseguem dinheiro, e são capazes de manter sua família e se divertir um pouco. Que jovem não quer isso?”, disse à IPS.

Os governos caribenhos tentam atrair os jovens para a agricultura há tempos. A Organização de Estados do Caribe (OECS) declarou os setores agrícola e turístico como “pilares do desenvolvimento da região”. Antiga e Barbuda, Dominica, Granada, Montserrat, São Cristóvão e Neves, Santa Lúcia e São Vicente e Granadinas são os nove membros ativos da OECS. Anguila e as britânicas Ilhas Virgens são países associados.

A OECS dá ênfase nesses setores para criar uma base econômica sólida, melhorar a qualidade de vida da população, gerar emprego e reduzir a pobreza, explicou Samuel Carrette, secretário permanente do Ministério de Meio Ambiente e Recursos Naturais de Dominica. No entanto, é lamentável que, tanto a agricultura quanto o turismo, estejam seriamente ameaçados pela mudança climática, ressaltou. “Há muitas estufas afetadas, arrasadas por furacões ou ventos fortes. Também temos plantações inundadas e o acesso às estradas bloqueado ou inexistente”, detalhou à IPS.

Quanto ao turismo, “a variabilidade meteorológica nos apresenta um desafio muito sério para programar atividades”, acrescentou Carrette. Em 2011, Dominica experimentou as piores inundações de sua história, após quase um ano de seca, entre 2009 e 2010, que afetou muito o setor agrícola. Em 2008, o furacão Omar destruiu a indústria pesqueira da ilha. “O governo teve que conseguir fundos para reconstruir esse setor e entregar aos pescadores equipamentos de pesca que necessitavam”, pontuou.

Os países do bloco têm recursos naturais, físicos e financeiros muito limitados e economias e mercados pequenos. Ignatius Jean, representante do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), na Jamaica, e ex-ministro da Agricultura de Santa Lúcia, afirmou à IPS que “a segurança alimentar é a segurança nacional”. Parte do mandato do IICA é apoiar os Estados membros no manejo dos recursos naturais e na adaptação à mudança climática. Também se trabalha para tornar visíveis os vínculos entre agricultura e turismo.

A situação atual exige “um enfoque multidisciplinar” para avaliar os impactos da mudança climática e traçar estratégias de mitigação e adaptação, observou Jean. “Não podemos escapar de nosso território. Temos que aprender a viver nele. É disso que trata a adaptação”, destacou. O IICA executa programas para que as estratégias de desenvolvimento agrícola de Jamaica, São Vicente e Granadinas, Dominica e República Dominicana sejam à prova de clima.

Keith Nicholls, especialista do Centro de Mudança Climática da Comunidade do Caribe, acredita que o aquecimento global prejudicará os nichos do mercado turístico da região. Por exemplo, o aumento das ondas afeta a prática do mergulho, em particular nos arrecifes coralinos, disse à IPS. “Definitivamente, se os corais sofrem, a perda de biodiversidade representa uma redução das vantagens competitivas do turismo”, argumentou.

A severidade cada vez maior das tempestades e dos furacões também afugentará os visitantes, opinou Nicholls. Os turistas não viajam para uma região considerada insegura, sobretudo considerando o quanto são vulneráveis às ondas os centros hoteleiros nas praias. “Os turistas vêm aqui em busca de sol e mar. Essas propriedades perdem seu atrativo pela erosão da costa”, ressaltou.

“A seca extrema determina que não tenhamos água, e a indústria turística depende em grande parte dos recursos hídricos. Se os turistas não têm água em seus países, vão buscá-la em outra parte”, ponderou Nicholls, que não se preocupa apenas com a falta de água, mas também com sua abundância. “Se chove na temporada seca e o tempo todo, tampouco os viajantes desejarão ir a semelhante lugar”, acrescentou.

Carrette disse que seu país, Dominica, sofre com um clima “muito errático”. O país “fica exatamente na roda dos furacões, exposto às condições desfavoráveis dos sistemas de ventos tropicais”, explicou. A maioria das Ilhas de Barlavento está abandonando sua dependência da indústria bananeira e tentando diversificar suas economias, mas as condições meteorológicas são obstáculos maiores para conseguirem isso, afirmou.

“Como pequenos Estados insulares em desenvolvimento, com cada passo que damos à frente, provavelmente damos muitos para trás, porque o tempo todo temos que reconstruir estradas e muros de contenção do mar, refazer estradas secundárias para a agricultura e reprogramar atividades turísticas”, enfatizou Carrette. “Devemos entender que o dinheiro para a reabilitação e restauração do sustento humano não está disponível aqui, em nosso próprio orçamento, e não temos reservas suficientes para utilizar”, alertou.

Então, é preciso pedir emprestado. Randolph Cato, diretor de assuntos econômicos da secretaria da OECS, estima que o custo total da mudança climática para a indústria turística do bloco pode chegar a US$ 12 bilhões nos próximos 40 anos. “Devemos fazer algo a respeito. Nos adaptarmos à mudança climática custará menos do que pagar seus danos potenciais”, ressaltou. Envolverde/IPS