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Bancarrota bancária da Islândia caiu sobre as mulheres

Mulheres se concentram em Reykjavik para comemorar uma vitória de seus direitos. Foto: Lowana Veal/IPS
Mulheres se concentram em Reykjavik para comemorar uma vitória de seus direitos. Foto: Lowana Veal/IPS

 

Reykjavik, Islândia, 20/11/2013 – O colapso econômico vivido pela Islândia em 2008 difere de outros países porque afetou mais a saúde física e mental das mulheres do que dos homens, de acordo com novos estudos. As desempregadas, as estudantes e as que participam do mercado de trabalho apresentaram níveis particularmente elevados de estresse no ano posterior à crise, junto às mulheres próximas da idade de se aposentarem, segundo pesquisa concluída este ano entre pessoas que foram ouvidas antes e depois da bancarrota financeira.

“A maior parte das investigações sobre pessoas que experimentaram reveses econômicos se orientaram aos homens, e os que estudaram ambos os sexos descobriram que os homens são mais afetados do que as mulheres. Nossos resultados sobre os efeitos do colapso econômico são pouco comuns, por exemplo, o de que o efeito sobre a saúde mental parece ocorrer principalmente entre as mulheres”, disse à IPS Unnur Anna Valdimarsdottir, do Centro de Ciências da Saúde Pública (CPHS) da Universidade da Islândia.

“As mulheres foram mais afetadas pelo colapso econômico e a posterior recessão na Islândia do que se informou ou se viu em outros países”, afirmou Chris McClure, estudante de doutorado no CPHS. “A maior parte das pesquisas até agora indica que os homens são mais prejudicados. O ocorrido na Islândia é singular e pode ser um indício de vários fatores, como a pesada carga psicológica das irlandesas, por terem que manter a casa, o emprego, suas relações e famílias”, acrescentou.

McClure pontuou que escassos informes de imprensa destacaram as consequências negativas da crise na Islândia. A maior parte se concentrou na resiliência e no poder de recuperação de sua população. “Declarações como essas, em épocas de austeridade, podem provocar efeitos negativos na população”, ressaltou. Os grupos vulneráveis são mais propensos ao estresse, segundo os autores do estudo. Por exemplo, é possível que as mulheres maiores de 60 anos tenham experimentado maior insegurança no trabalho ou quanto à perspectiva do desaparecimento de suas pensões ou economias de toda a vida, bem como a incerteza de encontrar trabalho se fossem demitidas.

No caso das trabalhadoras sem especialização, a causa maior do estresse pode estar no fato de ter uma ocupação facilmente descartável ou sem a capacitação necessária para conseguir outro emprego. Antes, as pesquisas sobre a relação entre desemprego e consequências psicológicas se concentravam nos homens, mas, em geral, nessas sociedades estudadas era comum que os homens fossem o sustento de suas famílias.

Este não é o caso da Islândia. Com uma das taxas de emprego mais altas da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), que tem entre seus 34 membros todos os países ricos, as mulheres islandesas representam aproximadamente 80% da força de trabalho, quase igual aos homens, que chegam a 85%. As perdas econômicas e trabalhistas nas semanas do colapso financeiro foram uma grande ameaça para a segurança das famílias, o que pode ter afetado de maneira diferente as mulheres e os homens. Os autores consideram que essa é uma das razões dessa diferença.

Contudo, não só as enfermidades derivadas do estresse afetam mais as mulheres do que os homens nesse país. Na semana em que os bancos afundaram, a quantidade de mulheres que visitou o departamento de emergência cardíaca do hospital da universidade nacional, o Landspitali, aumentou 40%, enquanto o número de mulheres diagnosticadas com doenças cardíacas cresceu 80%.

Valdimarsdottir é uma das pessoas que estudou essa situação. “Os acontecimentos estressantes afetam mais as doenças cardíacas das mulheres do que as dos homens, e é possível que diferentes fatores estressantes sejam específicos de um gênero”, pontuou. “Por exemplo, existe uma enfermidade derivada do estresse chamada cardiomiopatia neurogênica (síndrome do coração partido) que praticamente só se encontra nas mulheres, mas não é fatal e, em geral, dura apenas alguns dias”, explicou. A cientista e suas colegas no CPHS também se interessam em estudar tendências nos nascimentos, as tentativas de suicídio e os resultados sanitários de longo prazo nos dois gêneros, que poderiam estar relacionados com a crise financeira.

Os únicos homens nos quais se encontrou maior grau de estresse estavam casados ou pertenciam ao grupo de renda média. As mulheres deste grupo também experimentaram um aumento do estresse, embora não tanto quanto as jovens. Nos dois casos, isto pode ser causado em grande parte pela forte alta das cotas das hipotecas que ocorreu imediatamente depois do fechamento dos bancos.

McClure acrescentou que as mulheres fumam mais que os homens na Islândia. “Nossas conclusões indicam um forte vínculo entre parar de fumar e os níveis de estresse. E mais: achamos que era muito menos provável que as mulheres deixassem de fumar depois do colapso, em comparação com os homens, o que está vinculado aos graus de estresse”, afirmou.

Os dados do Diretório de Saúde revelam que a quantidade de abortos aumentou desde a crise bancária. Hildur Bjork Sigbjornsdottir, que compilou esses números, disse à IPS que é impossível determinar as razões, já que a decisão de interromper uma gravidez costuma obedecer a mais de um motivo. “Em geral, é uma combinação de vários fatores sociais”, acrescentou. Envolverde/IPS