Arquivo

Aumenta o número de adolescentes grávidas no Zimbábue

O Zimbábue experimenta um significativo aumento no número de adolescentes grávidas. Foto: Jeffrey Moyo/IPS
O Zimbábue experimenta um significativo aumento no número de adolescentes grávidas. Foto: Jeffrey Moyo/IPS

 

Bulawayo, Zimbábue, 18/3/2014 – Todos os dias, Pretty Nyathi*, de 17 anos, se levanta da cama, alimenta seu bebê, o coloca nas costas e sai rapidamente rumo ao mercado para comprar verduras, que depois revende nas ruas de Bulawayo, a segunda cidade mais importante do Zimbábue. Ela gostaria que sua vida fosse diferente. “Não há nada de belo em ser uma mãe adolescente. Desejaria poder voltar no tempo, quando estava na escola, e ser como qualquer outra menina”, disse à IPS.

Sua mãe morreu há cinco anos e ela teve que ir morar com sua avó, que tem um shebben (bar) em Tsholotsho, 116 quilômetros a nordeste de Bulawayo. Aos 14 anos foi violentada por um cliente. “Tentei pedir ajuda à minha avó, mas ela ameaçou me colocar na rua”, contou Nyathi. Logo, a avó obrigou a jovem a se prostituir com os clientes. “Perdi a conta dos homens com quem deitei sem proteção”, acrescentou. Em 2012, fugiu para Bulawayo, onde viveu nas ruas e sobreviveu também se prostituindo.

Dois meses depois ficou grávida, e em uma clínica recebeu o diagnóstico positivo de HIV (vírus causador da aids). Um pastor evangélico lhe ofereceu abrigo, e no Hospital Mpilo começou a receber tratamento antirretroviral. “Graças ao Senhor, meu bebê é HIV negativo”, comemorou Nyathi. Agora a jovem vive com um familiar e se esforça para seguir o tratamento. Este exige “uma dieta equilibrada, que pode me ajudar a viver mais e ao menos ver minha filha começando a escola”, afirmou.

Nyathi representa um dos cada vez mais numerosos casos de gravidez de adolescentes no Zimbábue. Em 2011, a taxa de fecundidade entre jovens de 15 a 19 anos era de 112 nascimentos em cada mil jovens, quando em 2006 era de 99/1000, segundo o Estudo Demográfico e de Saúde do Zimbábue (ZDHS). “Trata-se de uma alta significativa”, opinou à IPS Stewart Muchapera, analista de comunicações no Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) no Zimbábue.

As jovens de áreas rurais, como Nyathi, têm o dobro de probabilidades de engravidar na adolescência. A taxa de fecundidade na zona rural é de 144 nascimentos por mil jovens, contra 70/1000 em zonas urbanas. “A puberdade é um período de rápidas mudanças biológicas, e essa etapa de desenvolvimento deve ser bem enfrentada pelas jovens para superá-la de forma segura”, observou Muchapera.

Entre as muitas causas de gravidez na adolescência, o especialista mencionou a falta de informação clara sobre a puberdade, o que torna as jovens dependentes do que lhes dizem outras adolescentes mal informadas ou dos poucos dados que possam obter na internet. Muchapera disse também que algumas normas culturais ou religiosas, como o casamento infantil, as relações intergerações, a coerção sexual e o sexo transacional, contribuem com a gravidez em adolescentes.

O ZDHS diz que nove em cada dez zimbabuenses ativas sexualmente entre 15 e 19 anos vivem em alguma forma de matrimônio, e que duas em cada três jovens que tiveram relações sexuais antes dos 15 anos o fizeram contra sua vontade. O problema é agravado pela crise política e econômica da última década, que propagou a pobreza e deteriorou os serviços educacionais e de saúde. As adolescentes praticam sexo transacional como meio para obter comida, roupa, educação e segurança.

Simanga Nkomo, parteira em Bulawayo, contou à IPS que a cada ano ajuda mães cada vez mais jovens, algumas de 14 anos ou menos. “É preocupante, já que a maioria delas não está informada sobre saúde materna e arrisca suas vidas”, afirmou. O risco de mortalidade materna é o dobro para as jovens entre 15 e 19 anos do que para as mulheres com mais de 20, e cinco vezes mais alto para meninas entre 10 e 14 anos.

Sipho Ncube* é outra mãe adolescente de Bulawayo. Obteve boas notas no ano passado no curso secundário, mas teve que abandoná-lo quando engravidou e deu à luz um menino, agora com sete meses. “Comecei uma relação e uma coisa levou à outra, até que descobri que estava grávida. Tinha conhecimento sobre anticoncepcionais, mas por algum motivo não usei nenhum”, explicou à IPS.

Ncube e seu bebê são HIV negativos, mas poderia perfeitamente ser de outra forma: a soroprevalência nacional é de quase 15% entre pessoas na faixa dos 15 aos 49 anos. Cerca de 120 mil jovens desse país entre 15 e 19 anos contraíram o HIV em 2012, e 63 mil eram mulheres, segundo estimativas do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).

Os pais de Ncube, que trabalham na África do Sul, a visitam três vezes por ano e lhe enviam algum dinheiro. Ela cuida de seus irmãos, de 13 e sete anos, em uma casa alugada de dois quartos no subúrbio de Mpopoma, em Harare, capital do país. O pai da criança trabalha na cidade de Victoria Falls e ajuda financeiramente Ncube sempre que pode. “Lamento tudo, mas devo viver com as decisões erradas que tomei. Desejaria voltar ao colégio e poder cuidar do bebê”, ressaltou à IPS. Envolverde/IPS

* Os nomes são fictícios.