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A volta do caranguejo azul

O caranguejo azul (Calinestes sapidus) que esteve à beira de extinção, prospera agora no leste dos Estados Unidos. Foto: Christopher Pala/IPS

Crisfield, Estados Unidos, 30/4/2012 – As autoridades dos Estados norte-americanos de Maryland e Virginia resgataram o caranguejo azul da baía de Chesapeake, que estava à beira da extinção, triplicando sua população em cinco anos. Isto foi obtido empregando métodos que poderiam competir com países emergentes que exportam carne de caranguejo na Ásia e América Central, segundo vários cientistas. “Trata-se de um dos programas de restauração de reservas pesqueiras de maior sucesso da história”, disse Douglas Demenech, secretário de Recursos Naturais da Virginia.

Richard Robins, presidente da comissão que regula a pesca de caranguejos nesse Estado, informou que “há muitas coisas que se pode fazer para reduzir as capturas em uma pesquisa, mas esta foi a primeira vez que usamos todas de uma vez”. O resultado: a coleta de caranguejos do tamanho de uma mão em 2010 foi a segunda maior realizada em Chesapeake em 60 anos. O nome científico desta variedade, Calinestes sapidus, significa nadadores bonitos e saborosos. Os números de 2011 foram muito semelhantes.

Em Crisfield, localidade de Maryland que se autodefine como a capital mundial do caranguejo, o pescador Dan Dize, de 33 anos, agora captura mais destes animais por nasa (pesca que utiliza uma cesta de boca estreita). Ele se preocupava que o preço do combustível consumisse seus ganhos, admitiu. Depois de um dia na baía, descarregou 3.500 caranguejos vivos que estavam em 26 cestas de madeira e logo seriam enviados a mercados de Washington e Nova York.

A baía de Chesapeake é a maior dos Estados Unidos e abriga uma das maiores reservas de caranguejos do mundo. Na segunda metade do Século 20 havia cerca de 400 milhões destes animais, e a colheita anual média era de 250 milhões. Contudo, em 1997 a população caiu para 130 milhões de caranguejos, e apesar dos esforços para reduzir as capturas a cada ano se continuava pescando cem milhões deles. “Não se pode capturar 80% de nada, ano após ano, e esperar que dure”, explicou o britânico Thomas Miller, ecologista especialista em pesca que dirige o Laboratório Biológico Chesapeake, da Universidade de Maryland.

Embora a população destes animais nunca tenha acabado completamente, a menor disponibilidade do recurso em Cehsapeak fez com que as empresas locais que o vendiam no atacado aumentassem as importações da Indonésia, Tailândia, Filipinas e América Central. Assim, compraram carne de alta qualidade extraída manualmente de caranguejos defumados, pasteurizados e transportados em condições de refrigeração.

“A importações de caranguejos e de sua carne em Baltimore passaram de US$ 10,5 milhões em 1995 para US$ 119 milhões em 2011”, disse Douglas Lipton, economista da Universidade de Maryland especialista em temas de pesca. “Agora, ouvimos que enquanto as pescas asiáticas geram boa renda às suas comunidades, os caranguejos são extraídos mais rapidamente do que se reproduzem, assim, se não se agir logo, em breve poderão experimentar as reduções que vimos em Chesapeake”, destacou.

Em muitas comunidades do mundo, às vezes os líderes conseguem convencer os pescadores locais a receberem menos se uma população pesqueira em particular diminuiu visivelmente. Porém, na maioria dos países em desenvolvimento, geralmente faltam os equipamentos de amostragem e o conhecimento que os cientistas ocidentais usam para determinar como uma determinada população lida com a pesca excessiva. Isto torna menos precisos os tipos de restrições que levaram ao resgate do caranguejo de Chesapeake.

“Os países que importam mariscos, como os Estados Unidos, têm que exportar seus conhecimentos em matéria de pesca sustentável”, afirmou Daniel Pauly, da Universidade de Columbia Britânica.  Miller, da Universidade de Maryland, afirmou que “fazer as pessoas pescar menos em qualquer parte é muito difícil”, acrescentando que, “habitualmente, se reacomoda as cadeiras na coberta do Titanic, e quando este começa a afundar se impõe uma moratória à pesca, o que é muito perturbador para as comunidades”.

Em Chesapeake, a solução chegou depois que Robins, dono de uma empresa de embalagem de mariscos, foi nomeado integrante da Comissão de Recursos Marinhos da Virginia, em 2004. Se deu conta de que os esforços pouco sistemáticos para reduzir as capturas não estavam funcionando e convocou uma comissão seleta para determinar o motivo.

Miller foi o principal cientista do painel, cujo informe concluiu o que ele chama de “solução do jardim de infância”, tão fácil que poderia ter sido apresentada por uma criança de cinco anos: “Se não há bebês suficientes, deixem de matar as mães”. E acrescentou: “Precisávamos salvar pelo menos metade da quantidade de fêmeas prenhas que estavam sendo capturadas, cerca de 30 milhões de exemplares”, destacou.

Foram implantadas várias medidas, a mais efetiva delas foi a redução da coleta de outono de fêmeas que emigram para a entrada da baía nos dois Estados. Na Virgínia, foi suspensa a dragagem de inverno em áreas onde hibernavam, enterradas, fêmeas prenhes, e também foi criado um santuário para a temporada de desova, explicou Robins, que ajudou a coordenar as medidas.

Os pescadores locais não ficaram contentes, mas o estudo feito na primavera de 2009 mostrava que as novas restrições fizeram aumentar em 70º% a população de fêmeas de caranguejos, enquanto a de machos praticamente não havia mudado. Em 2010, a pesquisa anual concluiu que as fêmeas tinham aumentando 200% em relação a 2008. Uma pesquisa divulgada no final de abril mostrou que este ano há em Chesapeake o triplo de caranguejos que havia em 2007. “A demanda aumentou e agora os preços experimentam uma alta histórica”, além de se coletar três vezes mais do que na década de 1980, afirmou Robins. Envolverde/IPS