Estados Unidos e a crise

Acabam de ser publicadas as estimativas corrigidas do crescimento real do PIB dos Estados Unidos (medido a preços constantes de 2005) e que dão uma visão mais realista do que aconteceu à economia americana nos últimos quatro anos (2º trim. 2011/2º trim. 2008).

Ela apenas retornou ao nível em que se encontrava no 2º trimestre de 2007! Há quatro anos, o PIB está estagnado. Como a população cresceu, isto significa que o PIB per capita diminuiu. Considerando que, em condições normais de pressão e temperatura, o PIB real norte-americano cresce à taxa de 2% ao ano, a flutuação dos últimos quatro anos representa qualquer coisa entre 10% e 15% de um PIB anual (mais ou menos um PIB anual do Brasil) que potencialmente deixou de ser produzido pela disfuncionalidade do sistema financeiro.

As consequências sobre o endividamento interno foram importantes. De um lado, pela redução da receita e, de outro, pelo aumento das despesas com o desemprego. Paralelamente, aumentou a desigualdade na distribuição de renda, o que acentuou o mal-estar da sociedade com relação ao presidente Obama.

É cada vez mais evidente que as políticas monetária e fiscal foram incapazes de cooptar a confiança do setor privado, de forma que seus efeitos sobre a recuperação do consumo e ampliação dos investimentos têm sido pífios. Basta dizer que as empresas não financeiras têm em caixa qualquer coisa como US$ 1,5 trilhão a US$ 2 trilhões aplicados em papéis do Tesouro norte-americano. Por que não investem? Porque continuam a desconfiar do presidente Obama e não têm certeza de que encontrarão demanda no futuro.

Enquanto isso, o crescimento do consumo é inibido por um desemprego total ou parcial de mais de 25 milhões de pessoas, que continuam assustadas com o comportamento do mercado de trabalho, especialmente na construção civil.
Deveria ser claro que o problema só poderá ser resolvido com um aumento da demanda privada que até agora não tem respondido aos imensos estímulos monetários e fiscais.

A resposta não é “mais do mesmo”, mas entender por que não funcionou. Em nossa opinião, porque: 1º) o comportamento de Obama foi hostil com o setor real da economia no início de sua administração; 2º) ele foi submisso e leniente em relação ao setor financeiro, que precisava mesmo ser preservado, mas não os seus agentes mais conspícuos; e 3º) gastou o enorme patrimônio político do “we can” com programas necessários, mas discutíveis, em lugar de utilizá-lo cooptando e dando confiança ao setor privado para reduzir o desemprego. O problema dos Estados Unidos não é econômico: é a falta de confiança da sociedade na ação do Executivo e do Legislativo.

* Delfim Netto é economista, formado pela Universidade de São Paulo, professor de Economia, e foi ministro de Estado e deputado federal.

** Publicado originalmente no site EcoD.