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Belo Monte: os problemas de um projeto político

Trecho do Rio Xingu (foto), onde está sendo construída a usina de Belo Monte. Foto: NYT

Os problemas envolvendo a usina de Belo Monte, que está sendo construída no Rio Xingu, pouco acima da principal reserva indígena do Brasil, já rodaram o mundo, mas ainda não despertaram a atenção de Brasília.

Os últimos anos foram marcados por um debate entre ambientalistas e técnicos, gente que defende pontos de vista específicos e, muitas vezes, inconciliáveis.

O projeto passou por ajustes para minimizar seus impactos sobre a região, o lago diminuiu, uma inovadora e também polêmica tecnologia de geração, a “fio d’água”, foi adotada e empresas e fundos estatais foram chamados par financiar o projeto cujo custo está estimado em R$ 25 bilhões (valor solicitado pelo consórcio que toca a obra), mas pode chegar a R$ 35 bilhões no final, devido às compensações que estão sendo pedidas pela prefeitura de Altamira, o município mais atingido. Tudo isso para gerar quatro mil megawatts (médios) de energia, segundo técnicos, em uma estimativa otimista.

Belo Monte será construída. A usina já é parte da paisagem política do Brasil, assim como dezenas de outros empreendimentos que estão em obras ou em pranchetas para a Amazônia. Os impactos ambientais sem dúvida serão imensos, mas podem ser o menor dos danos desse iceberg. Ainda no campo político, a Comissão Interamericana dos Diretos Humanos (CIDH), organismo ligado à Organização dos Estados Americanos (OEA), chegou a pedir ao governo brasileiro a suspensão da obra em 2011. O governo ignorou a notificação e seguiu em frente com seus planos. Agora, as questões pendentes de Belo Monte chegam a um campo mais conhecido do governo, a militância sindical, que começa a impor condições para que os trabalhadores sigam em frente com a obra, com greves já realizadas e ameaças constantes de paralisação. Os motivos: “melhores condições de trabalho”.

A própria prefeitura de Altamira já solicitou a paralização da obra por conta dos impactos na cidade, que não tem infraestrutura para atender cem mil pessoas a mais que vão utilizar os serviços públicos municipais de educação, saúde e outros. Segundo o IBGE, a cidade tem hoje cerca de 85 mil habitantes. As experiências de ocupação de área despreparadas, sem infraestrutura e sem serviços básicos no Brasil são muitas e, em sua maioria, desastrosas. O melhor exemplo disso é o entorno de Brasília, o que hoje chamamos de “cidades satélites”, mas que na verdade foram formadas por aglomerados de trabalhadores levados ao planalto central para construir a capital federal e depois foram abandonados à própria sorte. Não há nada que indique que será diferente na construção de Belo Monte e de outras grandes obras de infraestrutura na Amazônia.

Outra frente de problemas emerge novamente dentro do próprio governo. Um parecer do Ibama mostra que o consórcio responsável pela obra não cumpriu muitas das condicionantes com as quais havia se comprometido para obter a licença de instalação da usina. O relatório apresentado pelo Ibama analisa a trabalho realizado até o período de julho a dezembro de 2011 e aponta que, até a data da sua publicação, apenas uma das 20 condicionantes havia sido atendida – quatro condicionantes não foram cumpridas, quatro possuem pendências e 11 ainda estão em atendimento.

Programa de Capacitação de Mão de Obra

Os dados apresentados no relatório não refletem a projeção apresentada anteriormente e não foi apresentado o histograma de empregados efetivamente contratados no período ou justificativa para não ter sido atingida a projeção.

Programa de Saúde e Segurança

Não foi prevista efetiva solução de responsabilidade do empreendedor para o atendimento regular de saúde dos trabalhadores contratados.

Programa de Educação Ambiental para os Trabalhadores

Não foi apresentado relatório específico para o Programa e nenhuma das ações do cronograma apresentado no PBA previstas até o 4º trimestre de 2011 foi iniciada.

Projeto de Recomposição da Infraestrutura de Saneamento

A empresa responsável pela execução do Projeto ainda não foi contratada e a execução do cronograma encontra-se significativamente atrasada.

Projeto de Reassentamento Urbano

O cadastro socioeconômico foi previsto para estar concluído até o fim do 3º trimestre de 2011, mas ainda está em andamento.

Projeto de Saneamento

Segundo o cronograma, a implantação dos sistemas de abastecimento de água, esgotamento sanitário e do aterro sanitário deveria ter sido iniciada ainda no segundo trimestre de 2011, mas ainda não foi implantado em Altamira.

Confira a íntegra do Parecer Técnico: http://www.xinguvivo.org.br/wp-content/uploads/2012/02/Parecer-Tecnico-sobre-andamento-do-PBA.pdf

Dal Marcondes é diretor da agência de notícias Envolverde.

** Publicado originalmente no site Carta Capital.