Internacional

Seca afeta agricultura na África do Sul

Na África do Sul, cultivos de pimentão e tomate na horta da escola Risenga, secam sob o sol abrasador, em Giyani, na província de Limpopo. Foto: Desmond Latham/IPS
Na África do Sul, cultivos de pimentão e tomate na horta da escola Risenga, secam sob o sol abrasador, em Giyani, na província de Limpopo. Foto: Desmond Latham/IPS

Por Desmond Latham, da IPS – 

Cidade do Cabo, África do Sul, 3/8/2016 – Quase uma década de seca na África do Sul gerou uma crise que impactou as pequenas cidades e forçou a importação de alimentos pela primeira vez em 20 anos, além de prejudicar seriamente o programa de redistribuição de terras do governo. A consequência imediata dessa situação foi sentida no custo dos alimentos em um contexto de crise econômica.

Porém, mais disfarçada se desenvolveu uma crise social porque os agricultores reduziram seu trabalho e a nova classe de produtores comerciais negros sofreu o impacto da seca. Outro efeito subjacente nas pequenas cidades, especialmente do norte do país, é o fechamento de comércios, o crescente desemprego e a instabilidade social.

Segundo alguns agricultores negros, as altas temperaturas e o clima seco dos últimos anos levaram muitos à bancarrota e obrigaram outros a abandonar as terras que haviam adquirido dentro do programa de redistribuição de terras do governo. Alguns conseguiram empréstimos para financiar, o que implica a agricultura comercial, que exige maior capital, mas outros não tiveram tanta sorte. Mesmo os grandes produtores comerciais já não podem enfrentar suas dívidas.

“É terrível, terrível, terrível”, ressaltou Thomas PitsoSekhoto, especialista em desenvolvimento da Associação Africana de Agricultores. “Agora será pior devido ao inverno, não há comida, nem mesmo plantamos na temporada passada. É uma cruel jogada do destino, que nos prejudicou muito. Para os que compraram suas terras como os agricultores negros, para os que receberam bônus, será duro. É um grave retrocesso para os produtores negros na África do Sul, Não haverá futuro se as coisas seguirem assim”, lamentou.

Divan van der Westhuizen, da Análise de Sistemas de Cultivo da organização Bureau for FoodandAgriculturalPolicy (BFAP), disse que os agricultores já sofriam dificuldades com o aumento dos custos e a baixa produção. “A depreciação do rand (moeda nacional) tem uma forte correlação com o preço dos fertilizantes e dos derivados de petróleo. Há um aumento anual de 11% nos fertilizantes e de 10% no combustível”, afirmou.

“Do ponto de vista da seca é duro. Na província Noroeste há quatro ou cinco anos ocorre um clima seco, e agora a produção caiu e os custos dispararam. Mesmo se chover agora, no tocante ao fluxo de efeito, não bastará para cobrir a escassez”, acrescentou van der Westhuizen.

O apoio ao setor foi limitado, segundo especialistas. A maior organização agrícola da África do Sul, a AgriSA, declarou que recebeu uma enxurrada de pedidos de assistência econômica em razão da seca. Mais de três mil novos agricultores, na maioria negros, e quase 12 mil produtores comerciais receberam assistência.

“Cada vez mais produtores comerciais de sucesso e com grande produção não conseguem que o dinheiro os alcance”, afirmou o diretor-geral da AgriSA, Omri van Zyl. “Pedimos assistência ao governo, porque esses agricultores têm um papel crucial na produção de alimentos em grande escala. Em especial, são os de Cabo do Norte, Estado Livre e Noroeste, Cabo Oriental e Cabo Ocidental que sofrem a severa crise e os que estão desesperados por ajuda econômica”, acrescentou.

O governo destinou milhões de dólares a um programa de alívio da seca no começo deste ano. Mas a assistência acabou em fevereiro. Agora, Sekhoto lamentou que seu terreno está à beira de um ciclo terminal. “Não há nada. Serei honesto. Se não puder ajudar a si mesmo, não pode ajudar seu vizinho. A única renda que tive foi quando vendi o gado. Os bancos baixaram as cortinas. Os produtores comerciais brancos tentaram ajudar, mas também tiveram que reduzir e diminuir seu pessoal”, acrescentou.

Os comércios nos povoados da província Noroeste e em partes de Estado Livre fecham, com estimativas de que 20% dos pequenos comerciantes baixaram suas portas no primeiro trimestre deste ano.Mas não é só o campo que está em crise, também a população das cidades sul-africanas sofreu o impacto da seca.

Algumas cidades, como Vryheid, em KwaZulu Natal, usam tanques de água porque a represa secou. Os preços dos alimentos dispararam, afirmou o economista Corne Louw, da Grain S.A. “Normalmente somos produtores com excedente e exportadores de milho, mas a seca nos forçou a importar 3,7 milhões de toneladas no último ano”, pontuou.“Os registros mostram que o período mais seco desde 1904 foi o de 2015-2016. Se comparado o preço do milho branco com o de um ano atrás, se verá que registrou alta de 35%”, acrescentou.

Em Limpopo, um projeto de horta comunitária das organizações Oxfam e Earthlife
África teve graves contratempos pela seca permanente. Essa foi uma das províncias mais afetadas pela secura do clima, dificultando enormemente as possibilidades dos pequenos agricultores cultivarem e colherem.

“Atualmente tiramos água dos poços, mas não basta para toda a escola e a horta”, contou Tracy Motshabi, um horticultor da escola primária Risenga, em Giyani, também em Limpopo. “A seca faz com que nossos esforços na horta não sejam notados por causa da escassez de água, que não é suficiente para regar”, lamentou Nosipho Memeza, integrante do Grupo de Trabalho Comunitário no Centro pré-escolar Founders Educare Preschool, em Makhaza na província de Cabo Ocidental.

No final de julho houve intensas chuvas na maior parte da África do Sul, mas chegaram muito tarde para salvar muitos dos pequenos agricultores afetados por anos de um clima seco. As coisas poderiam mudar e haver certo alívio. Os meteorologistas da Weather SA prognosticam que a temperatura chuvosa deste ano, que começará em dezembro, será mais úmida do que o habitual. Mas, efetivamente, pode ser que seja muito tarde para milhares dos pequenos produtores do país. Envolverde/IPS