Internacional

Redes sociais são pesadelo para Mugabe

O presidente do Zimbábue, Robert Mugabe. Foto: Al Jazeera/cc by 2.0
O presidente do Zimbábue, Robert Mugabe. Foto: Al Jazeera/cc by 2.0

Roma, Itália, 31/10/2016 – Em um vídeo divulgado pelo WhatsApp, um homem do Zimbábue se dirige ao presidente do país, Robert Mugabe, e diz que 90% dos zimbabuenses estão sem trabalho e não contribuem para a economia porque o governo não lhes proporciona emprego.

“Você agride as crianças que expressam sua sincera decepção em razão de seu governo ruim. Estamos cansados disso”, diz o homem, de idade média, em relação ao que considera corrupção de alto nível, injustiça e brutalidade policial, e deterioração da prestação dos serviços sociais. “Você usa óculos, mas não pode ver. Quantos óculos são necessários para ver que está destruindo o país?”, perguntou a Mugabe, que está no poder desde 1987.

Em um país que supostamente suprime os meios de comunicação tradicionais, os zimbabuenses encontraram outra forma de expressar suas frustrações com o governo. As plataformas das mídias sociais, bem como os serviços de mensagens como WhatsApp, ganharam popularidade como vias para criticar e se dirigir a Mugabe, que não é de fácil acesso para o cidadão comum.

O uso das redes sociais aumentou especialmente depois que o pastor evangélico Evan Mawarire publicou um vídeo, em abril, onde aparece com a bandeira nacional em volta do pescoço criticando a estratégia econômica do governo. O vídeo levou à campanha #ThisFlag (EstaBandeira), da qual participaram milhares de zimbabuenses e que atraiu a atenção internacional e de milhões de pessoas para a situação do país, para desgosto de Mugabe.

Agora que têm a internet para se comunicarem, os habitantes do Zimbábue têm o poder de falar de maneira relativamente segura contra o governo e, ao mesmo tempo, a propaganda estatal começa a perder sua eficácia. A degradação da situação econômica provocou numerosos protestos contra o presidente e seu governo. Dependendo da fonte, as estimativas sobre a taxa de desemprego no país variam de 4% a 95%, embora muitas não estejam apoiadas por dados confiáveis.

Entretanto, devido ao precário estado da economia, é certo que a taxa de pessoas sem emprego aumentou. O crescimento econômico caiu de 3,8%, em 2014, para 1,5%, aproximadamente, em 2015. O elevado gasto público, a renda nacional menor do que o esperado e as baixas cifras de exportação elevaram a dívida e afetaram o desenvolvimento urbano, como moradia e transporte, além dos serviços sociais.

Em julho, milhares de cidadãos se reuniram para protestar contra esses problemas. Desde então, a insatisfação se estendeu por todo o país. O governo foi acusado de bloquear as redes sociais, como Facebook e WathsApp, para evitar que as pessoas se reúnam para protestar.

Embora o Zimbábue seja constitucionalmente uma república, está sob controle de Mugabe e de sua União Nacional Africana do Zimbábue – Frente Patriótica (Zanu-PF) desde a independência do país, em 1980. As últimas eleições presidenciais e parlamentares aconteceram sem violência, mas o processo não foi justo nem verossímil.

Segundo a Human Rights Watch, o governo de Mugabe é acusado de violar sistematicamente os direitos humanos. Práticas como sequestros, prisões, torturas e assédio são cotidianas, bem como restrições à liberdade de expressão, entre outras, denunciou a organização.

O regime de Mugabe deteve centenas de ativistas da sociedade civil e opositores políticos por realizarem reuniões ou participarem de manifestações pacíficas. Jornais e revistas considerados críticos do governo são reprimidos e seus jornalistas silenciados. A lei de Acesso à Informação e Proteção da Privacidade castiga com até dois anos de prisão o exercício do jornalismo sem credenciamento.

O Daily News, único jornal independente do Zimbábue com uma visão crítica do governo, teve que fechar em 2001, depois que uma bomba explodiu em sua gráfica, e não recebeu licença oficial para publicação de conteúdos. Ao reconhecer a ameaça que as mídias sociais supõem para seu governo, Mugabe aplica leis que limitam a livre circulação da informação e submetem a comunicação privada à vigilância estatal.

Ao mesmo tempo, adverte seus cidadãos para o abuso das mídias sociais, com ameaça de todos os cartões SIM no Zimbábue serem registrados com o nome do usuário, e que os infratores seriam facilmente identificados. Será presa qualquer pessoa que gerencie, possua ou divulgue conteúdos que Mugabe considera abusivos, ameaçadores ou ofensivos, dirigidos a gerar distúrbios ou incitar a violência.

Por outro lado, Mugabe pediu à juventude do Zanu-PF que promova o partido pelos meios de comunicação social, para que retratem um “Zimbábue que seja democrático, trabalhador e pacífico”. Envolverde/IPS