Internacional

ONU saúda novo parlamento da Birmânia

Guardas fronteiriços de Bangladesh negam a entrada a refugiados rohingyas da Birmânia, em novembro de 2013. Foto: AnurupTitu/IPS
Guardas fronteiriços de Bangladesh negam a entrada a refugiados rohingyas da Birmânia, em novembro de 2013. Foto: AnurupTitu/IPS

Por ThalifDeen, da IPS – 

Nações Unidas, 5/2/2016 – Quando o birmanês U Thant foi eleito secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em 1961, também se converteu no primeiro asiático a ocupar o cargo, o terceiro na história do fórum mundial, seguindo Trygve Lie, da Noruega, e Dag Hammarskjold, da Suécia. Sua designação foi um acontecimento histórico para a Ásia, especialmente porque depois esperaria longos 45 anos para que outro asiático ocupasse o cargo, até que o atual secretário-geral, o sul-coreano Ban Ki-moon, foi eleito em janeiro de 2007.

Outro acontecimento histórico ocorreu na Birmânia, em novembro de 2015, quando foram organizadas eleições nacionais, as primeiras após décadas de ditadura, consideradas pela ONU como “um êxito significativo da transição democrática”.A líder democrática birmanesa e prêmio Nobel da Paz, Aung San Suu Kyi, que cumpriu 15 anos de prisão domiciliar, foi eleita legisladora à frente da opositora Liga Nacional para a Democracia (LND), que obteve a maioria parlamentar.

Nodia 2, o parlamento se reuniu na capital,Naypyidaw, pela primeira vez depois de décadas, e pelo menos 110 legisladores da LND, dos 390 parlamentares, são ex-presos políticos.Mas Aung San não pode ocupar a Presidência, porque a Constituição proíbe que um cidadão ou cidadã com descendência ou cônjuge estrangeiro ocupe a chefia de governo.Seus filhos, nascidos na Grã-Bretanha, são considerados estrangeiros; seu pai, já falecido, Michael Aris, era um acadêmico britânico.

Entretanto, a reabertura do parlamento “é um passo extremamente importante para o restabelecimento da democracia no país”,destacou o porta-voz da ONU,StephaneDujarric. Por sua vez, PalithaKohona, ex-representante permanente do Sri Lanka na ONU, pontuou à IPS que é preciso aplaudir a transição gradual para a democracia na Birmânia. “Há tempos esse país não goza de uma democracia como a da Grã-Bretanha (nem como a da Índia). Levará um tempo para consolidar uma transição que tenha êxito”, opinou.

“Sabemos por experiências recentes que uma democracia tipo ocidental não pode ser imposta em um país sem trajetória democrática. Vale recordar que a integridade territorial será uma prioridade para a Birmânia que deverá atender as tensões étnicas na medida em que absorve com lentidão a nova experiência política”, apontou Kohona.Em 2007, foi criado o Grupo de Amigos do Secretário-Geral para a Birmânia, um fórum consultor de 14 países para colaborar com seus esforços no sentido de promover uma mudança dessa nação no sudeste asiático.

O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, se reuniu com Aung San Suu Kyi na Birmânia (Myanmar), em novembro de 2014. Foto RichBajornas/ONU
O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, se reuniu com Aung San Suu Kyi na Birmânia (Myanmar), em novembro de 2014. Foto RichBajornas/ONU

Durante anos Ban aplaudiu a libertação de presos políticos, como a própria Aung San. Em 2010, se mostrou preocupado pela decisão do regime militar de dissolver dezpartidos políticos, incluída a LND, antes das eleições de novembro daquele ano.

Agora, os Estados Unidos, que impuseram duras sanções econômicas e militares contra o regime pelo tratamento dado aos presos políticos e pelas violações de direitos humanos, começaram a aliviar as restrições. Desde 2012 Washington contribuiu com US$ 500 milhões para o processo de reforma política nesse país, com iniciativas como a implantação do Acordo Nacional de Cessar-Fogo e os esforços para aumentar a participação da sociedade civil e das mulheres nos processos de paz.

Em uma entrevista coletiva realizada em Naypyitaw, em dezembro, o secretário de Estado adjunto dos Estados Unidos, Antony J. Blinken, declarou que seu país aplaudia as declarações positivas do presidente birmanês TheinSein e da cúpula militar por felicitar a LND e se comprometer a respeitar o resultado eleitoral. Também é animador que Aung San tenha se reunido com o presidente e o comandante-chefe das forças armadas, Min Aung Hlaing, para conversar sobre a transição democrática.

“Sabemos que são muitos os desafios pela frente. É necessário fomentar um crescimento econômico de base ampla e sustentado. O processo de reconciliação nacional deve continuar”, ressaltouBlinken. Os presos políticos que restam devem ser libertados, bem como é necessário contar com garantias para a proteção dos direitos humanos, sem importar questões étnicas ou religiosas, acrescentou.

As reformas devem seguir até que haja um governo civil eleito nas urnas e realmente soberano e todas as instituições nacionais respondam ao povo. “Os Estados Unidos trabalharão estreitamente com o novo governo, ajudando-o a conseguir esses objetivos, e continuarão promovendo investimentos responsáveis de nossas companhias na Birmânia, que acreditamos fortalecem as novas empresas locais e constroem capital humano, em lugar de apenas extrair recursos”, acrescentou o secretário.

Blinkenobservou que “falamos sobre o processo de paz e o diálogo político entre governo e os diferentes grupos étnicos. Os Estados Unidos farão tudo o que os atores desse esforço histórico considerarem necessário para contribuir para seu êxito. Mas pedimos que acabem com urgência as operações militares e que os civis necessitados tenham acesso irrestrito à assistência humanitária”.

Washington se preocupa especialmente pela discriminação e violência sofrida pelas minorias étnicas e religiosas, como os rohingya, do Estado de Rakhine. Ban lamentou que um grande número de integrantes das minorias, especialmente da comunidade rohingya, não puderam votar nem se candidatar, segundo comunicado emitido pela secretaria geral da ONU, que também pediu urgência aos atores nacionais para que mantenham um ambiente de calma, respeito aos direitos humanos e proteção do Estado de direito.

“Resta muito trabalho no caminho para a democracia e para um futuro com eleições verdadeiramente inclusivas”, diz a declaração do secretário-geral. “Um futuro em que o desenvolvimento e a paz tenham raízes firmes na inclusão, no respeito e na tolerância, e sejam protegidos os direitos humanos, independente da origem étnica, raça, religião ou do gênero, e ninguém fique marginalizado, vulnerável ou seja discriminado”, enfatizou. Envolverde/IPS