Sociedade

Alimentação saudável melhora o aprendizado

Projeto Merenda com o Chef, realizado em Salvador, reformula as refeições servidas aos estudantes e já mostra resultados

Uma alimentação balanceada pode ajudar a otimizar o desempenho e o aprendizado dos alunos. É isso o que está mostrando o projeto Merenda com o Chef, uma das ações do Bairro-Escola Rio Vermelho, de Salvador, que reúne chefs de cozinha do bairro e merendeiras da rede pública de ensino para pensar e implementar formas de tornar o lanche servido aos estudantes mais saudável.

A primeira escola a receber o projeto foi o Colégio Estadual Alfredo Magalhães, que tem cerca de 400 alunos do 6o ao 9o ano em período integral, além de outros 400 no período noturno. As merendeiras da escola passaram a receber, desde o início de 2013, dicas do chef Ramon Simões, dono do restaurante Armazém do Reino, que semanalmente visita a escola.

Foto: udra11 / Fotolia.com
Foto: udra11 / Fotolia.com

 

“O Ramon estabeleceu com elas [as merendeiras] uma parceria na qual elas aprendem com ele mas também usam o que sabem. É essa troca que abre caminho para uma alimentação mais saudável para os meninos”, conta Orlando Souza Goes, vice-diretor do colégio.

O objetivo não é transformar inteiramente o modo de preparo das refeições, mas usar os conhecimentos das merendeiras e os ingredientes disponíveis na escola para preparar uma dieta mais balanceada e saudável para os alunos. Mudanças pequenas como a redução do uso de sal e açúcar, por exemplo, trazem benefícios visíveis no desempenho dos alunos.

“Os meninos passaram a ficar menos agitados e mais concentrados nas aulas da tarde”, conta o vice-diretor, ao lembrar que antes das mudanças no cardápio, durante o período da tarde, pós almoço, era difícil manter o foco dos estudantes. “Com uma refeição balanceada e de fácil digestão, a disposição deles para continuar estudando é bem maior. Os próprios professores têm percebido eles mais dispostos”.

O chef Ramon conta que, primeiro, fez um tipo de auditoria, para conhecer os ingredientes que a escola tinha a sua disposição. “Selecionei alguns itens e separei outros que eram desnecessários, como creme de leite, óleo de soja, enlatados em geral e salgadinhos”, explica.

Foto: Divulgação
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Sobre a receptividade das merendeiras o chef diz que a relação é ótima, mas que não as chama assim. “Existem títulos que simbolizam estigmas, por isso as chamo de OA, orientadoras alimentares, pois é isso que elas são”. Ele lembra que no começo elas acharam estranho, mas que depois de algumas conversas se iniciou uma boa relação, pois tinham o mesmo objetivo: levar uma alimentação mais gostosa e saudável para os alunos.

“Não podemos destruir parte do outro e transformar o outro na gente. Temos que agregar o valor do outro. Foi isso que eu fiz. Quero fazer a comida de cada uma delas, ajudar a melhorar cada receita, dar uns toques”, argumenta Ramon.

E as OAs já incorporaram muitos desses aprendizados. Raimunda Amorim de Jesus, por exemplo, conta que a escola sempre teve soja, mas que os meninos não gostavam de comer porque o cheiro era muito forte e esquisito. “A gente não sabia como cozinhar para ficar gostoso. O professor [como as merendeiras chamam Ramon] nos ensinou a lavá-la para tirar o cheiro forte e a fazer coisas diferentes com ela. Hoje os meninos comem e acham uma delícia”, conta a cozinheira que trabalha há 18 anos na escola.

A colega de Raimunda, Sonia Maria Fontes Simas, conta que os ensinamentos do chef vão além das receitas. “Aprendemos que na cozinha o mais importante é a harmonia e a calma. Ele é paciente, cuida de cada alimento. O que aprendi aqui me fez mudar algumas coisas em minha casa também, serve para a nossa vida, nosso dia a dia, nossos filhos”.

Além da preocupação com a saúde, Ramon também se preocupou em conscientiza-las sobre a importância da reciclagem, as ensinou a separar o lixo e os resíduos orgânicos. “A educação da reciclagem começa na cozinha”, diz o chef.

Próximos passos

Os planos para o projeto envolvem outros dois pontos importantes para que ele possa ser mais efetivo e possível de ser replicado em outras escolas: o cultivo de uma horta e a produção de um livro de receitas.

Fazer uma horta na escola possibilita que as OAs tenham a sua disposição ingredientes naturais e frescos para preparar as merendas, independente de licitações e fornecedores atrelados às secretarias de educação.

Além disso, Ramon enxerga na horta um jeito interessante de entrar nas escolas e iniciar a discussão sobre a importância de uma alimentação mais saudável e balanceada. “Existe todo um trabalho curricular agregado, que envolve todo mundo, alunos, professores e funcionários”.

Visando levar a iniciativa para outras instituições de ensino, Ramon está elaborando um guia, que vai ter uma ficha técnica dessa dieta nutricional balanceada. “Estou criando junto com as OAs uma Dieta da Merenda com o Chef, para mostrar para as secretarias que é possível fazer refeições saudáveis com os ingredientes disponíveis e a horta”, explica.

“É importante fazer um trabalho que possa dar seguimento, desenvolver e replicar. Estamos propondo uma reflexão e podemos transformar isso em uma iniciativa nacional”, vislumbra o chef.

* Publicado originalmente no site O Porvir.