Clima

Agropecuária pode reduzir emissões de gases de efeito estufa 

Foto: Shutterstock
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Adoção em escala de práticas de baixo carbono e aumento de crédito para quem as adota são algumas das estratégias no campo que podem contribuir com as metas brasileiras para o clima, sem perda de produtividade.

Por Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura – 

Oito propostas que permitem à agropecuária brasileira reduzir significativamente suas emissões de gases de efeito estufa foram listadas em documento recém-lançado pela Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura. Elaboradas com base em estudos e tecnologias já existentes, elas incluem a adoção de práticas como recuperação de pastagens degradadas, intensificação moderada da bovinocultura de corte e fim do desmatamento ilegal. “Além de oferecer contribuições para o Brasil cumprir os compromissos firmados no âmbito do Acordo de Paris, esse conjunto de medidas também permite manter e mesmo aumentar a competitividade e a produtividade do setor”, afirma Luiz Cornacchioni, diretor executivo da Abag (Associação Brasileira do Agronegócio).

No entanto, para que tenham êxito, tais ações precisam ser adotadas de maneira ampla, com políticas públicas de longo prazo. “As tecnologias para baixo carbono no campo já são uma realidade no país, mas precisam ganhar escala a fim de que tragam o resultado desejado”, lembra Marina Piatto, coordenadora da iniciativa de clima e agropecuária do Imaflora. Várias pesquisas embasam o documento e permitem estimar que o setor mitigue até 50% de suas emissões até 2030, se as práticas adequadas forem aplicadas de forma ampla, principalmente, nas áreas de pastagens degradadas.

A análise e a elaboração das propostas para a agropecuária foram feitas pelo Grupo de Trabalho ABC (Agricultura de Baixo Carbono) da Coalizão, formado por especialistas e técnicos de diversas organizações, centros de pesquisas e empresas. O documento aponta, ainda, os obstáculos para a adoção dessas práticas. “É necessário solucionar certos gargalos que dependem de iniciativas e ações multissetoriais, relacionadas a questões fundiárias, logísticas e de treinamento, entre outras. Seria fundamental também ampliar a escala de linhas de financiamento para as práticas sustentáveis”, completa Cornacchioni. Leia a seguir o documento na íntegra.

 

Contribuição da agropecuária para a redução de emissões de GEE no Brasil

Instalada em dezembro de 2014, a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura é uma iniciativa formada por associações setoriais, empresas, organizações da sociedade e indivíduos, interessados em contribuir para o avanço e a sinergia das agendas de proteção, conservação e uso sustentável das florestas, agricultura sustentável e mitigação e adaptação às mudanças climáticas, no Brasil e no mundo.

O ano de 2015 foi muito importante para a agenda nacional e internacional de mudança do clima, por conta das negociações da COP21, que resultaram no Acordo de Paris. Neste sentido, a Coalizão estabeleceu um diálogo entre diferentes atores, o Governo Federal e as principais organizações internacionais envolvidas com o tema, visando contribuir com as negociações multilaterais e a agenda econômica do país.

O movimento construiu, ao longo de seis meses, um documento coletivo contendo dezessete propostas para o compromisso de mudanças climáticas, em nível nacional e internacional. Neste escopo de trabalho, iniciativas para uma agricultura de baixas emissões de gases de efeito estufa (GEE) foram levantadas para dar escala à contribuição positiva desse setor para as metas de mitigação.

Como contribuição aos esforços globais de redução dos impactos da mudança do clima, a agropecuária brasileira tem o potencial de apresentar as propostas elencadas a seguir.

  1. Reduzir de forma contínua as emissões de GEE e/ou o balanço líquido de CO2eq, por meio da adoção em escala de práticas de baixas emissões e alto sequestro de carbono, como: recuperação de pastagens degradadas, intensificação moderada da bovinocultura de corte, ampliação de sistemas de integração lavoura-pecuária (iLP) e lavoura-pecuária-floresta (iLPF), adoção de sistemas de plantio direto (SPD), uso de cultivares que realizam a fixação biológica do nitrogênio (FBN), florestas plantadas e tratamento de dejetos animais.
  2. Incluir incentivos para a expansão agrícola e pecuária em áreas atualmente degradadas: aproveitar o potencial de expansão sobre estas áreas, evitando assim a perda de carbono do solo e a conversão de ecossistemas naturais. Essa aspiração deve orientar os planos plurianuais de investimento e ação, uma vez que representa o maior potencial de redução de emissões de GEE pelo setor[1]. Trata-se ainda de uma medida essencial para suprir, de forma sustentável, a demanda por produtos agropecuários.
  3. Aperfeiçoar o Plano ABC, de forma a garantir o cumprimento das metas atuais e sua expansão no período pós-2020: manter, implementar, monitorar e dar maior transparência ao Plano, incluindo a estratégia de capacitação de gestores estaduais e todas as atividades de apoio ao produtor previstas.
  4. Aumentar os recursos destinados ao Programa ABC dentro do Plano Agrícola e Pecuário.
  5. Eliminar das cadeias produtivas brasileiras produção oriunda de desmatamento ilegal ou de exploração ilegal.
  6. Destacar a contribuição da agropecuária brasileira em relação à manutenção da vegetação nativa conservada e a ser restaurada nas propriedades rurais por conta das exigências do Código Florestal e dos compromissos assumidos internacionalmente pelo Brasil. Uma vez que se encontra dentro das propriedades agrícolas e sob responsabilidade dos produtores rurais, o carbono retido ou sequestrado nas áreas de conservação deve ser valorizado como um esforço do setor agropecuário
  7. Incentivar a produção sustentável, a inovação e o desenvolvimento tecnológico no setor de agroenergia, considerando o potencial dessa fonte na substituição de combustíveis fósseis e na diversificação da matriz energética nacional.
  8. Reforçar a integração intersetorial para que os gargalos para implementação dessas propostas sejam contornados e todo o potencial de redução do setor agropecuário seja de fato atingido. Dentre os setores que necessitam de integração com as políticas agropecuárias, destacam-se: infraestrurura, logística, energia, regularização fundiária e ambiental e assistência técnica.

 

Uma série de estudos recentes demonstra o grande potencial da agropecuária brasileira em contribuir de forma significativa para a redução de emissões. No entanto, indefinições em relação ao ritmo lento de adoção das práticas de baixo carbono ao longo do tempo, não permitiram inserir neste documento um volume específico de redução de emissões de GEE pelo setor agropecuário para o novo período de compromisso no âmbito do Acordo de Paris. Além do potencial de mitigação já apresentado pelo Plano ABC, análises do Observatório do Clima e do Observatório ABC também demonstram que aagropecuária brasileira pode ser crucial na redução do aquecimento global. As propostas demonstram o seguinte potencial:

  • O Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas para a Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura (Plano ABC) indica que a adoção das tecnologias previstas até 2020 tem o potencial de mitigar de 133,9 a 162,9 MtCO2 eq.[2]
  • O Observatório do Clima[3] em parceria com o Imaflora[4] calcula que com a adoção de tecnologias de baixas emissões de carbono, a agropecuária brasileira tem o potencial de reduzir em 50% a emissão projetada para 2030 em relação ao ano de 2013, passando de 520 MtCO2eq (2013) para 280 MtCO2eq (2030). A proposta considera um aumento de 30% na produção agropecuária e prevê, dentre outras ações, a recuperação de pastagens e seu uso para expansão agrícola e criação de bovinos. Os cálculos também consideram o balanço de emissões e remoções de CO2 por solos agrícolas e de pastagens.
  • O Observatório ABC calcula que, de 2012 até 2023, o potencial de mitigação da agropecuáriabrasileira pode chegar a 1.8 bilhão tCO2 eq. Este número é 10 vezes maior do que a meta de redução de emissões estipulada pelo Plano ABC e considera apenas a adoção de três tecnologias (recuperação de pastagens, iLP e iLPF), porém de forma ampla, em 52 milhões de hectares de pastagens degradadas.[5]

As referências citadas reforçam o enorme potencial da agropecuária brasileira em reduzir emissões, se conciliado a políticas públicas multisetoriais e mecanismos que garantam a atratividade da adoção das tecnologias de baixo carbono disponíveis. É preciso, contudo, ressalvar que a realização de todo esse potencial depende da solução de entraves e gargalos que fogem ao controle do setor agropecuário, relacionados a questões fundiárias, logísticas, de treinamento, entre outras.

A Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura está comprometida com a promoção e proposição de políticas públicas, ações e mecanismos financeiro/econômicos para o estímulo à agricultura, pecuária e economia florestal que impulsionem o Brasil para liderança global da economia sustentável e de baixo carbono, gerando prosperidade para todos, com inclusão social, geração de emprego e renda. Colocamo-nos à disposição do Governo brasileiro para contribuir com esta agenda, assim como para esclarecer quaisquer pontos do presente documento.

[1]De acordo com o Observatório da Agricultura de Baixo Carbono (Observatório ABC), as pastagens degragadas emitem, em média, 4tCO2e ha-1 ano-1. (Carvalho et al., 2010; Salton, 2005; Alvez et al., 2006; Lima et al., 2001; Souza et al., 1997).Uma série de dados e estudos compilados por Bustamante et al. (2006) indicam que a recuperação e o manejo correto de pastagens degradadas no Cerrado resultariam em um acúmulo médio de 5,5 tCO2e ha-1 ano-1. Estes dados corroboram análilses realizadas pela Embrapa e reforçam o grande potencial de redução de emissões de GEE pela recuperação e uso inteligente das pastagens degradadas no Brasil.

2Plano ABC (2012): http://www.agricultura.gov.br/arq_editor/download.pdf

[3] Proposta do Observatório do Clima para a Contribuição Nacionalmente Determinada Pretendida do Brasil (Observatório do Clima, 2015): http://www.observatoriodoclima.eco.br/wp-content/uploads/2015/06/proposta-indc-oc.pdf

[4] Iniciativa de clima e agricultura do Imaflora: www.imaflora.org

[5] Invertendo o sinal de carbono da agropecuária brasileira (2015): http://mediadrawer.gvces.com.br/original/sumario-atualizado.pdf

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